domingo, 19 de julho de 2015

Lula da Silva terá pedido a Passos Coelho para dar atenção aos interesse da Odebrecht / O Brasil à beira do abismo / Investigações judiciais lançam o caos na política do Brasil

Segundo O GLOBO :
( …) “A movimentação do ex-presidente a favor da Odebrecht em Portugal é relatada em dois telegramas. Em 25 de outubro de 2013, o embaixador brasileiro em Lisboa, Mario Vilalva, enviou comunicado abordando a visita de Lula a Portugal, ocorrida entre os dias 21 e 23 daquele ano. O diplomata deixa claro que a visita do ex-presidente se dava em razão de convite da Odebrecht, por conta dos 25 anos de presença da construtora brasileira em Portugal. Na descrição da agenda de Lula em Lisboa, o embaixador narrou que, no dia 22 de outubro, à tarde, o petista “encontrou-se com empresários brasileiros, dentre os quais o dr. Emílio Odebrecht (presidente do Conselho de Administração da Odebrecht e pai de Marcelo)”.

Menos de sete meses depois, em outro telegrama, Vilalva, em 2 de maio de 2014, faz uma análise sobre a privatização da Empresa Geral de Fomento (EGF), que encontrava resistência por parte de alguns municípios portugueses que, na avaliação do embaixador, havia gerado pouco resultado. Após descrever como estava o processo, o diplomata observa que as empresas brasileiras Odebrecht e Solvi, em parceria com o grupo português Visabeira, demonstraram interesse no negócio, o que gerou simpatia dos formadores de opinião em Portugal. O diplomata registra a ação direta de Lula em favor da Odebrecht.

Repercutiu positivamente na mídia recente declaração do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em entrevista à RTP no dia 27/04 último, no sentido de que o Brasil deve-se engajar mais ativamente na aquisição de estatais portuguesas. O ex-presidente também reforçou o interesse da Odebrecht pela EGF ao primeiro-ministro Pedro Passos Coelho, que reagiu positivamente ao pleito brasileiro”, informou o diplomata.

Lula, de fato, deu uma entrevista à televisão portuguesa, falando dos 40 anos da Revolução dos Cravos e abordando vários temas, inclusive defendendo maior participação de empresas brasileiras nas privatizações conduzidas em Portugal — mas sem citar nenhuma empresa especificamente. A gestão a favor da Odebrecht, pelo que se depreende do comunicado emitido pelo diplomata, foi feita em caráter privado ao primeiro-ministro português. Segundo site do Instituto Lula, o ex-presidente se encontrou com Passos Coelho no dia 24 de abril, e teriam falado apenas da situação econômica mundial e da Copa no Brasil.”

Na ocasião do telegrama, a empreiteira brasileira era uma das sete que tinham manifestado oficialmente interesse no negócio. Dois meses depois, porém, a Odebrecht acabou não formalizando proposta. A EGF acabou vendida por 149,9 milhões de euros para a Suma, consórcio formado por empresas portuguesas.

Lula da Silva terá pedido a Passos Coelho para dar atenção aos interesse da Odebrecht
19/7/2015, OBSERVADOR

O ex-Presidente do Brasil, Lula da Silva, terá pedido ao primeiro-ministro, Passos Coelho, para dar atenção aos interesses da Odebrecht na privatização da EGF, a sub-holding da Águas de Portugal.

O ex-Presidente do Brasil, Lula da Silva, terá pedido ao primeiro-ministro português, Passos Coelho, para dar atenção aos interesses da Odebrecht na privatização da EGF, a sub-holding da Águas de Portugal, noticia este domingo o jornal O Globo.

De acordo com telegramas diplomáticos trocados entre chefes de postos brasileiros no exterior e o Ministério das Relações Exteriores, entre 2011 e 2014, “as atividades do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em favor do grupo Odebrecht no exterior foram além da contratação para proferir palestras, contrariando o que o petista [do Partido dos Trabalhadores] e a construtora têm sustentado”.

A movimentação do ex-presidente brasileiro em Portugal é relatada em dois telegramas: a 25 de outubro de 2013, o embaixador brasileiro em Lisboa, Mario Vilalva, enviou um comunicado sobre a visita de Lula a Portugal, no qual o diplomata deixa claro que a visita do ex-presidente resultava do convite da Odebrecht, por ocasião dos 25 anos de presença da construtora brasileira em Portugal.

Menos de sete meses depois, em outro telegrama, numa análise sobre a privatização da Empresa Geral de Fomento (EGF), Vilalva notava que as empresas brasileiras Odebrecht e Solvi, em parceria com o grupo português Visabeira, demonstraram interesse no negócio, o que gerou simpatia dos formadores de opinião em Portugal, referindo “a ação direta de Lula em favor da Odebrecht”.

“O ex-presidente também reforçou o interesse da Odebrecht pela EGF ao primeiro-ministro Pedro Passos Coelho, que reagiu positivamente ao pleito brasileiro”, informou o diplomata, citado pelo O Globo, que refere que o contacto a favor da construtora foi feito em privado.

Segundo site do Instituto Lula, o ex-presidente se encontrou com Passos Coelho no dia 24 de abril, e teriam falado apenas da situação económica mundial e da Copa no Brasil.

Lula da Silva deu uma entrevista à televisão portuguesa, a propósito dos 40 anos da Revolução dos Cravos e abordando vários temas, defendendo uma maior participação de empresas brasileiras nas privatizações conduzidas em Portugal, sem citar nenhuma empresa.

Na ocasião do telegrama, a construtora brasileira era uma das sete que tinham manifestado oficialmente interesse na privatização da EGF, mas dois meses depois a Odebrecht acabou por não formalizar uma proposta.

Lula da Silva é investigado por alegadamente favorecer a construtora Odebrecht a obter contratos durante viagens para África e na América Latina, entre 2011 e 2014, quando já não era chefe de Governo.

O Globo afirma que, no âmbito das buscas que a PF efetuou à casa do empreiteiro, em 19 de junho, “durante a 14.ª etapa da Lava Jato”, foram apreendidos “documentos, correspondências e mídias”, sendo que “um HD que estava num cofre no quarto de Marcelo Odebrecht armazenava troca de mensagens sobre o jantar.

Em resposta ao jornal O Globo, o Instituto Lula rejeitou que “o ex-presidente não atuou em favor da Odebrecht, nem fez gestão a favor da empresa”, referindo que Lula da Silva se limitou a comentar “o interesse da empresa brasileira pela empresa portuguesa (…) que, aliás, era público há muito tempo”.


O Brasil à beira do abismo
André Azevedo Alves
18/7/2015/ OBSERVADOR

Os próximos passos do Brasil serão decisivos para determinar se o país consegue dar a volta à crise ou se mergulhará definitivamente numa espiral de degradação económica, política e social.

Com todas as atenções centradas na Grécia, o agravamento ao longo dos últimos meses da crise no maior país de língua portuguesa do mundo tende a merecer menos atenção do que deveria. Esta semana, ao contrário do que tem acontecido, a crise brasileira mereceu alguma atenção em Portugal graças à notícia de que Dilma Roussef terá aproveitado uma escala técnica no Aeroporto Francisco Sá Carneiro, no Porto, para reunir com o seu ministro da Justiça e com o presidente do Supremo Tribunal Federal, que se encontravam em Portugal para participar numa conferência em Coimbra.

O incidente, em pleno auge no Brasil do mega caso judicial “Lava Jato”, que envolve algumas das principais empresas de construção civil brasileiras, a gigante estatal Petrobras e várias figuras ligadas ao PT, suscitou polémica e acusações de promiscuidade. Mas mais relevante do que o episódio concreto ocorrido no Porto é a preocupante situação a que chegou o Brasil. Foi também recentemente noticiado que a Procuradoria da República em Brasília abriu um inquérito para investigar as ligações do ex-presidente Lula da Silva à construtora Odebrecht, incluindo suspeitas de tráfico de influências.

As ramificações políticas das graves suspeitas de corrupção ao mais alto nível intensificaram-se também com o anúncio de Eduardo Cunha, Presidente da Câmara dos Deputados e também ele alvo de suspeitas no caso “Lava Jato”, de que deixa de apoiar Dilma Roussef. O anúncio pode ter implicações sérias já que Cunha é membro do Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), principal suporte do PT na coligação governamental.

Para quem não acompanhe regularmente os acontecimentos no Brasil, a situação actual pode parecer surpreendente. Afinal, ainda em 2009 a revista The Economist destacava na sua capa o take-off brasileiro apontando o Brasil como exemplo para a América Latina e para o mundo. Mais recentemente, já em 2013, uma nova capa da revista assumia o erro perguntando “Has Brazil blown it?”. Como foi possível o Brasil passar em tão pouco tempo de super-potência emergente e exemplo promissor a uma tremenda desilusão? A ampla simpatia granjeada pelo PT nos meios jornalísticos e académicos internacionais será parte da explicação mas, na verdade, a raiz de muitos dos principais problemas é bem anterior aos acontecimentos dos últimos anos.

O grande responsável pelo desbloqueamento de parte do potencial brasileiro foi o notável sucesso do Plano Real nos anos 1990, concebido por economistas como Gustavo Franco. A estabilização monetária (com a consequente desindexação da economia), o equilíbrio orçamental, um programa relativamente significativo de privatizações e alguma abertura da economia foram suficientes – face ao extraordinário potencial do Brasil – para espoletar o que parecia ser um milagre económico sem retorno.

Os primeiros anos de governação PT beneficiaram destas medidas e aproveitaram a folga existente para expandir substancialmente o Estado. A chegada do PT ao poder não trouxe a revolução que muitos – dentro e fora do Brasil – temiam, mas iniciou um processo de expansão do aparelho de Estado (com o clientelismo associado) e de estagnação da economia do país, com destaque para um nível asfixiante de burocracia e fiscalidade.

O país que ainda recentemente era visto por muitos como um milagre económico chegou assim a uma situação de recessão – com o PIB a contrair mais de 1% – e com a inflação oficial em torno dos 10%.

Ao mesmo tempo, ao longo dos últimos anos, manifestações populares massivas vêm contestando a fraca qualidade dos serviços públicos, os elevados níveis de corrupção percepcionados e a subida do custo de vida, mas sem que até ao momento se vislumbre uma alternativa governativa viável.

É inegável que, além das manifestações anti-governamentais, há mais sinais de vitalidade da sociedade civil brasileira. Um vasto e variado leque de organizações voluntárias da sociedade civil – como o Instituto Millenium, o Instituto de Estudos Empresariais ou o Instituto Mises Brasil – desempenham um papel educacional importante e com notável impacto. É de destacar também o recente sucesso junto do público brasileiro de obras como “Pare de Acreditar no Governo”, de Bruno Garschagen, ou “Esquerda Caviar” (publicado em Portugal pela Alêtheia), de Rodrigo Constantino. Mas não é menos verdade que, não obstante todos estes sinais, a construção de um caminho alternativo para o Brasil não se afigura fácil.

Os próximos passos do Brasil serão decisivos para determinar se o país consegue dar a volta à crise ou se mergulhará definitivamente numa espiral de degradação económica, política e social. Dada a importância global do Brasil, o futuro do país terá também ramificações significativas na América do Sul e no resto do mundo. Também por isso seria importante prestar mais atenção ao que por lá se está a passar.


Professor do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa


Investigações judiciais lançam o caos na política do Brasil
RITA SIZA 18/07/2015 - PÚBLICO

Presidente da Câmara de Deputados é envolvido no escândalo da Petrobras e anuncia ruptura política com o Governo. Dificuldades anunciadas para a Presidente Dilma Rousseff, que vê a sua base de apoio cada vez mais diminuída.

Sem ter sido ainda acusado de nada, o ex-Presidente do Brasil Luis Inácio Lula da Silva está agora formalmente sob investigação do Ministério Público, suspeito do crime de tráfico de influências por causa da sua associação com a construtora Odebrecht, uma das empresas implicadas no esquema de corrupção que envolve a petrolífera estatal Petrobras – o Petrolão.

A justiça brasileira confirmou que foi aberta uma investigação formal para apurar se, depois de abandonar a presidência, em 2009, o homem forte do Partido dos Trabalhadores (PT) aproveitou as suas conexões políticas a nível internacional para, ilicitamente, beneficiar a Odebrecht, a maior empresa de construção do país e uma das maiores do mundo, com uma carteira de negócios que se estende até Portugal.

Em menos de uma semana, as investigações da justiça brasileira à teia de corrupção em torno da Petrobras atingiram dois antigos Presidentes da República – o agora senador Fernando Collor de Mello também foi implicado – e o actual presidente da Câmara de Deputados, Eduardo Cunha, que alegadamente terá reclamado uma “propina” (suborno) de cinco milhões de dólares para viabilizar um contrato de navios-sonda da Petrobras. O poderoso chefe de fila do PMDB no Congresso nem esperou pela sua agendada declaração televisiva ao país (nesta sexta-feira à noite, 0h25 de sábado, em Portugal) para anunciar o rompimento da aliança com o Governo.

“A apuração de irregularidades na Petrobras varreu nesta semana três instituições para o tapete da Lava Jato. De uma só vez, Senado, Câmara [de Deputados] e Tribunal de Contas da União foram atingidos por novas suspeitas e acusações. O Judiciário virou alvo de investigados. Ministério Público e Polícia Federal preparam-se contra retaliações. O Governo teme que a ira do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, paralise o país politicamente e abra caminho para um pedido de destituição [da Presidente]”, resumia o jornal Folha de São Paulo, condensando o desenvolvimento da intriga nesta semana.

As consequências políticas dos acontecimentos dos últimos dias, quer para a Presidente Dilma Rousseff quer para o próprio sistema brasileiro, são imprevisíveis. Pelo menos doze legisladores do Senado e 22 da Câmara de Deputados (além de 12 ex-congressistas e uma ex-governadora), pertencentes a cinco partidos, foram já apanhados na rede da investigação Lava Jato: Collor de Mello foi um dos últimos a ser implicado, num depoimento do empreiteiro Ricardo Pessoa, que informou ter pago 20 milhões de reais em luvas para que o senador influenciasse negócios com uma subsidiária da Petrobras, a BR Distribuidora.

As notícias dizem que “centenas de outros políticos” poderão ser os próximos alvos. Segundo um levantamento feito pelo Estado de São Paulo, 199 deputados estaduais, 178 deputados federais, 16 senadores e 17 governadores têm os financiadores das suas campanhas eleitorais presos. A operação Politeia (o nome é uma alusão à “cidade perfeita” descrita na República de Platão, onde a ética se sobrepõe à corrupção), um novo ramo da investigação Lava Jato, deixou o Congresso à beira de um ataque de nervos. O ambiente é de perplexidade, receio e suspeição generalizada.

O Governo esteve reunido esta semana para delinear uma estratégia de resposta ao adensar da crise política. “Preparem-se que o pior ainda vem aí”, avisou o ex-Presidente Lula da Silva, que também participou no encontro. Nos relatos da imprensa brasileira, Lula referia-se aos efeitos de choque da mais do que previsível revolta de Eduardo Cunha contra a Presidente: nos bastidores de Brasília, já se discutia abertamente a agenda de retaliação do deputado - que passara de aliado a inimigo de Dilma - no retorno dos trabalhos parlamentares, depois de uma pausa de duas semanas.

Mas no mesmo dia em que Cunha era efectivamente denunciado como corrupto pelo consultor Julio Camargo, também Lula se via na circunstância de defender a honra, perante o anúncio do inquérito da Procuradoria de Brasília ao seu envolvimento com a Odebrecht, que poderá ter financiado cerca de uma centena de deslocações suas ao estrangeiro. O ex-Presidente não falou, mas o Instituto Lula deu conta da “surpresa” com a iniciativa, ao mesmo tempo que reafirmou “a certeza da legalidade e lisura" de todas as actividades do antigo chefe de Estado – que incluíram também uma conferência realizada em Portugal em Setembro de 2011, sob o patrocínio de uma outra empresa brasileira implicada no Petrolão, a Camargo Corrêa.

De acordo com documentação obtida pela revista Época, as averiguações da Procuradoria têm a ver com “supostas vantagens económicas obtidas, directa ou indirectamente, da Odebrecht pelo ex-Presidente Luis Inácio Lula da Silva, entre os anos de 2011 e 2014, com pretexto de influir em actos praticados por agentes públicos estrangeiros, notadamente os governos da República Dominicana e Cuba, este último contendo obras custeadas, directa ou indirectamente, pelo BNDES” (o Banco Nacional de Desenvolvimento Económico e Social). Para a investigação, a procuradoria de Brasília solicitou o acesso às informações da Lava Jato, que é conduzida pelo juiz Sergio Moro, a partir do estado do Paraná.

O “campo minado” de Dilma
Enquanto isso, a sociedade civil mobilizava-se para um novo “panelaço” (nome dado à acção de protesto que consiste em bater em panelas) durante a declaração televisiva de Eduardo Cunha. A iniciativa é incomum mas não inédita: em 2011 e 2013, os anteriores líderes da Câmara dirigiram-se ao país, em mensagens natalícias. A “fala” de Cunha, que foi pré-gravada e produzida por um dos marqueteiros da campanha presidencial do social-democrata Aécio Neves, incidirá sobre as realizações do órgão legislativo desde o início do ano: em seis meses, a Câmara bateu o recorde de votações de projectos de lei e propostas de emendas constitucionais.

A Presidente Dilma Rousseff, que esperava aproveitar a pausa na actividade legislativa para recuperar um pouco de fôlego, depois de um primeiro semestre de Governo particularmente difícil (como atesta a taxa de aprovação do seu desempenho, que não chega aos 10%), vê, pelo contrário, a pressão, o confronto e o desgaste a aumentar. Até aqueles que não encontravam argumentos válidos ou legítimos para sustentar um pedido de impugnação da Presidente começam a manifestar dúvidas de que Dilma consiga chegar até ao fim do mandato – a sensação é de que tudo está em desagregação.

As opções para Dilma são cada vez mais limitadas, tal como a sua margem de manobra para escapar àquilo que o jornal El País descrevia como o “campo minado” em que se movimenta, com as denúncias explosivas do escândalo da Petrobras, as suspeitas de irregularidades nas contas públicas e os efeitos da crise económica. Além disso, a Presidente vive debaixo do “fogo cruzado” das ameaças de cisão no interior do seu Partido dos Trabalhadores e da rebelião aberta dos aliados no Congresso, que enfraquece a sua capacidade de defesa dos gritos de “impugnação! destituição! demissão!” com que a oposição reage a qualquer novo facto ou notícia.

O Palácio do Planalto já se estava a preparar para possíveis acções beligerantes no Congresso, como por exemplo a abertura de novas comissões parlamentares de inquérito de “potencial crítico”, com o objectivo de fragilizar a posição da Presidente. Mas, acossado, Cunha subiu a parada. “Essa lama, em que está envolvida a corrupção da Petrobras, cujos tesoureiros do PT estão presos, essa lama eu não vou aceitar estar junto dela”, declarou, para justificar o rompimento político com o Governo. O presidente da Câmara acusou o executivo de perseguição política – “o Governo sempre me viu como uma pedra no sapato” – mas garantiu que não deixaria de cumprir o seu papel constitucional e de dirigir os trabalhos legislativos. “Não há aqui nenhum gesto que possa dizer que acabou a governabilidade”, considerou.

Na agitação contra o Governo, Eduardo Cunha conta com a cumplicidade do seu correligionário de partido e presidente do Senado, Renan Calheiros, que também já viu o seu nome associado a irregularidades na Lava Jato. Os dois partilham a tese de que as denúncias são falsas e não passam de vendettas orquestradas pelo executivo, que estará a instrumentalizar a acção da Procuradoria-Geral da República. Além das denúncias de ter embolsado cinco milhões de dólares para influenciar o negócio de compra dos navios, que poderão dar origem a acusações por corrupção e lavagem de dinheiro, Cunha foi ainda incriminado pelo "doleiro" (termo que designa quem faz transferências de dinheiro para o estrangeiro sem as declaradar ao fisco) Alberto Youssef de tentativas de coacção e intimidação de testemunhas da Lava Jato.

“O que está ocorrendo no Congresso é um movimento articulado de sobrevivência dos presidentes das duas casas, de dezenas de deputados e senadores investigados e de centenas de outros que podem ser implicados na Lava Jato”, contextualiza o analista político do Estadão, José Roberto de Toledo. “Se a situação do Planalto já era duríssima, a operação Politeia tornou ainda mais frágeis as condições de governabilidade de Dilma Rousseff”, acrescenta o painel de comentadores da Folha: a capacidade de acção da bancada aliada ficou significativamente tolhida, comprometendo ainda mais a já conflituosa articulação política entre a presidência e o Congresso.

Apesar de falar na governabilidade, Eduardo Cunha defendeu a quebra de solidariedade institucional do PMDB – o maior partido no Congresso e exemplo maior do funcionamento “fisiológico” do sistema brasileiro – com o Governo. “Eu vou tentar que o meu partido vá para a oposição. E se o partido decidir que tem de sair, acho que tem que entregar os ministérios”, insistiu o deputado, que alguns jornalistas brasileiros já designam ironicamente por “líder do PSDB na Câmara” para assinalar a colagem dos sociais-democratas, maior partido de oposição, às derrotas políticas impostas por Cunha à presidência.

O vice-presidente Michel Temer (que é o presidente nacional do PMDB) veio depois pôr água na fervura, sublinhando que Cunha falava apenas em nome pessoal e não do partido, que se mantém firmemente na base aliada. Para Temer, o rebuliço provocado pelas denúncias da Lava Jato contra políticos do Congresso “atrapalha” o país e “abala a natural tranquilidade que sempre permeou a actividade do povo brasileiro”.

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