quinta-feira, 26 de outubro de 2017

Vão apertar as restrições e a vigilância aos carros velhos a circular no centro de Lisboa


Vão apertar as restrições e a vigilância aos carros velhos a circular no centro de Lisboa
POR O CORVO • 26 OUTUBRO, 2017 •

Apesar de os resultados práticos da aplicação das Zonas de Emissões de Reduzidas (ZER) estarem muito aquém do desejado, já se pensa no aumento da exigência das mesmas. Os carros fabricados antes de 2000 poderão vir a ser proibidos de entrar no anel compreendido entre a Avenida de Ceuta e a Avenida Infante Dom Henrique. E na Avenida da Liberdade e na Baixa apenas deverão circular automóveis produzidos depois de janeiro de 2005. É o que defende o novo Plano de Melhoria da Qualidade do Ar da Região Lisboa e Vale do Tejo, a aplicar até 2020. E, para que o controlo passe a ser realmente eficaz, pede-se a criação de um sistema de vigilância electrónica. Tudo para controlar as emissões de dióxido de enxofre e outras partículas nocivas à saúde.

 Texto: Samuel Alemão

 Uma pequena revolução que teria de ser posta em marcha até 2020. Os automóveis novos comercializados a partir de janeiro de 2005 deverão ser os únicos autorizados a circular no eixo Avenida da Liberdade/Baixa (Zona 1) e os vendidos a partir de janeiro de 2000 apenas ser permitidos num anel delimitado pela Avenida de Ceuta, Eixo Norte-Sul, Avenida das Forças Armadas, Avenida EUA, Avenida Marechal António Spínola e Avenida Infante Dom Henrique (Zona 2), nos dias úteis entre as 7h e as 21h. Isto é o que defende Francisco Ferreira, professor da Universidade Nova de Lisboa e um dos autores da proposta do novo Plano de Melhoria da Qualidade do Ar da Região Lisboa e Vale do Tejo.

 O estudo, realizado com base em dados sobre a qualidade do ar entre 2011 e 2014, e que foi apresentado nesta quarta-feira (25 de outubro), já foi entregue à Secretaria de Estado do Ambiente, à qual cabe dar luz verde. Persistem, contudo, dúvidas sobre a entrada num novo nível de restrições à circulação, quando ainda são pouco claros os resultados da aplicação na capital das Zonas de Emissões Reduzidas (ZER). Por isso, há já quem fale na aplicação de um controlo mais efectivo dos automóveis que entram nas zonas centrais da cidade, recorrendo a dispositivos electrónicos. Consideram alguns, essa será a única forma de, efectivamente, fazer cumprir as limitações relativas à poluição atmosférica resultante do tráfego viário, impostas pela União Europeia.

Apesar das sucessivas fases das ZER anunciadas pela Câmara Municipal de Lisboa (CML), com a primeira a entrar em vigor em julho de 2011 e a terceira e última em janeiro de 2015, existe um quase consenso de que os resultados estarão longe de ser animadores. “Apesar de não existirem dados concretos, é sabido que, no que se refere às ZER, há uma percentagem muito grande de veículos que circulam aqui nesta área central e que já não o deviam fazer”, disse Fernando Ferreira, vice-presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional de Lisboa e Vale do Tejo (CCDRLVT), entidade que realizou o estudo – elaborado pelas suas técnicas Luísa Nogueira e Sandra Mesquita, em parceira com Francisco Ferreira.

 O vice-presidente da CCDR, entidade responsável pela transposição a nível regional de muitas das directivas comunitárias, vê tal permissividade como consequência de uma evidente dificuldade em policiar a aplicação das restrições. Uma situação que poderá ser revertida, defende, através da tecnologia. “Neste momento, não há qualquer pórtico a controlar as entradas”, constatou Fernando Ferreira no início da sessão, para depois, no final da mesma, e já depois apresentado o plano, voltar a insistir: “Não precisamos de inventar nada. Há muitos sistema lá fora, recorrendo a um controlo electrónico, aos quais podemos ir beber”. Ou seja, através de algo semelhante à Via Verde ou equivalente. Solução apoiada por Francisco Ferreira, que coordenou esta proposta de novo plano de melhoria da qualidade do ar.

 Tudo para que a saúde da população seja preservada em relação à sobrexposição ao Dióxido de Enxofre (NO2) e às muito nocivas partículas Pm10 – sendo esta, em grande medida, consequência directa dos motores a gasóleo. “A fiscalização é absolutamente crucial, senão temos regras não têm aplicação”, afirma o professor universitário e presidente da associação ambientalista Zero. “A fiscalização pode ter várias fases. Desejavelmente, deveria ter um sistema automático. Mas o caminho até lá não deve desculpar o não se fazer um aperto do controlo e da implementação de novos patamares”, afirma o especialista, para quem o apertar da malha às emissões poluentes resultantes do tráfego automóvel surge no topo da lista das medidas necessárias à melhoria da qualidade do ar na região de Lisboa, na qual a zona da Avenida da Liberdade continua ser uma zona crítica.

Só este ano, foi ali ultrapassado por 23 vezes o valor limite diário de emissões de dióxido de enxofre, quando as regras comunitárias impõem um tecto de 18 – em 2016, foram 14 as ocorrências registadas. Algo que só mudará, defende o professor universitário, quando acontecer um “reforço e a aplicação” das ZER, incluindo o “aumento do esforço de fiscalização”. Apesar de admitir a escassez de resultados do actual quadro de limitações à circulação de carros velhos no centro da capital, Francisco Ferreira coloca no topo das novas políticas e medidas do plano proposto para 2020 o “reforço da exigência das ZER”. “Estamos a permitir que veículos com 17 anos ainda circulem na zona mais crítica da ZER”, disse, referindo-se à possibilidade de os veículos construídos a partir de janeiro de 2000 (Euro 3) ainda andarem pela Avenida da Liberdade e pela Baixa.

 Por isso, o plano agora delineado preconiza a subida de um patamar em cada uma das zonas. Assim, propõe-se que na Zona 1 (Avenida da Liberdade e Baixa) se passe da norma Euro 3 para Euro 4, fazendo com que ali só possam circular veículos fabricados a partir de janeiro de 2005. Em simultâneo, avançar-se-ia na Zona 2 (delimitada pelo tal anel entre a Avenida de Ceuta e a Avenida Infante Dom Henrique) para os limites estabelecidos pela referida norma Euro 3, impedindo que ali circulassem carros da norma Euro 2 (construídos a partir de janeiro de 1996), como agora acontece. Algo que vai de acordo com o que disse, na abertura da sessão, o presidente da CCDRLVT, João Teixeira: “A sensibilidade e os parâmetros serão cada vez mais exigentes”.


 Além do reforço da exigência da ZER, a proposta do novo Plano de melhoria da qualidade do ar da região Lisboa e Vale do Tejo quer seja introduzidos “planos de mobilidade para empresas e pólos geradores de emprego” de forma a que essas entidades desincentivem a utilização do automóvel ou ainda a criação de “planos SOS”, a aplicar em momentos de maior emissão de poluentes, com a eventualidade de permitir apenas a entrada alternada em Lisboa de carros com matrícula par e ímpar. Uma solução já existentes em várias metrópoles europeias. Além disso, fala-se também na necessidade de “rever o enquadramento” das práticas de cargas e descargas ou ainda na criação de um código de boas práticas para mitigar os níveis de partículas em suspensão na atmosfera resultantes de obras ou demolições.

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