domingo, 23 de novembro de 2014

Ó Ricardo Salgado, quanto do teu capital subtraíste a Portugal? / JOSÉ DIOGO QUINTELA.


Ó Ricardo Salgado, quanto do teu capital subtraíste a Portugal?
JOSÉ DIOGO QUINTELA / 24/11/2014 / PÚBLICO

Depois das primeiras audições na comissão de inquérito, estou convencido de que mais depressa o mar responde a Fernando Pessoa do que Ricardo Salgado se descose convenientemente sobre o dinheiro. Uma conversa entre o oceano Atlântico e um poeta morto, na Caparica, é mais provável que uma admissão do banqueiro aos deputados da nação, no Parlamento.

Se Ricardo Salgado andou anos a tourear o Banco de Portugal, não são três ou quatro horas à frente dos deputados que o vão fazer quebrar. Até porque, no tempo que demora uma audição, não se consegue exercer a persuasão moral. Como se ficou a saber pelo vice-governador Pedro Duarte Neves, foram precisos meses para persuadir o banqueiro a conceder que já não tinha condições para liderar o BES. Meses que foram aproveitados para perseverar nas mesmas moscambilhas que, justamente, tinham feito perceber que já não tinha condições para liderar o BES.

Atenção, não estou a insinuar que o processo de persuasão moral não funciona. O problema não está no mecanismo da persuasão moral em si, que é excelente. Nem, neste caso particular, na moralidade do persuadido, que já provou que se deixa persuadir. O problema está na capacidade do persuasor, que não foi capaz de empregar o tipo específico de persuasão moral que funciona comprovadamente com Ricardo Salgado. Refiro-me, como é notório, ao tipo de persuasão moral que leva o persuadido a contratar uma brigada de seguranças israelitas.

Ou consideram os senhores do BdP que os mercenários hebreus são para defender Ricardo Salgado de cidadãos portugueses que tenham perdido dinheiro no BES? Se consideram, padecem de um problema de dupla não regulação, já que não regulam bem o mercado, nem regulam bem da cabeça.

Notem, eu moro na mesma rua que Oliveira e Costa. Já assisti a diversas situações em que o ex-presidente do BPN atravessa a estrada. Em nenhuma delas houve um condutor que tenha acelerado ou, sequer, se tenha abstido de travar. Nem uma vez. E estou a contar com o ocasional atravessamento fora da passadeira. Aliás, é a mesma rua onde estão situadas a ESAF e a Rio Forte. Nunca nenhum burlado pelo BES veio aqui tirar desforço. Não houve montras partidas, pneus furados ou ameaças iradas. Nada.

(Agora que penso nisso, sinto que a minha rua é uma espécie de sala de espera do escritório do Proença de Carvalho. Só faltam os Irmãos Metralha no prédio em frente e Jack, o Estripador, no andar de baixo.)


Portanto, a segurança de Ricardo Salgado não é contra os seus pacatos compatriotas. É para salvaguardar face a clientes estrangeiros, possivelmente venezuelanos, angolanos ou russos. Esses sim, especializados no uso do tipo de persuasão moral a que Ricardo Salgado é mais sensível. Um tipo de persuasão moral que não se utiliza em Portugal e que levou Ricardo Salgado (durante todo o tempo que demorou a ser convencido pelo BdP que devia largar o BES) a transferir 800 milhões de euros do banco para offshores, para pagar certas dívidas do GES. Curiosamente, apenas as dos clientes mais persuasivos.    

Sem comentários: