sábado, 15 de novembro de 2014

Investigação aos vistos deixou ministro Miguel Macedo num labirinto político


Investigação aos vistos deixou ministro Miguel Macedo num labirinto político

Mesmo sem ter sido investigado, o ministro está no olho do furacão político desencadeado pela detenção de altos quadros suspeitos de crimes relacionados com os vistos gold

Há quem lembre, mesmo no Governo, que daqui a um ano, no caso de o PSD ir para a oposição, a sucessão de Passos Coelho estará em discussão. E que Miguel Macedo é um nome a ter em conta

São José Almeida e Nuno Ribeiro / 15-11-2014 / PÚBLICO

No PSD e no Governo, a palavra de ordem é discrição. Passar por esta tempestade com low-profile e procurar que as ondas de choque desta investigação sobre corrupção no âmbito do programa de Autorização de Residência para Investimento (ARI) não abale a estrutura do Governo é o objectivo. Igualmente no CDS, cujo líder, Paulo Portas, é o “pai” dos também chamados vistos gold, a indicação é a de máximo silêncio sobre o assunto.
Oficialmente, o PSD, através do líder parlamentar, Luís Montenegro (ver caixa), remeteu para o líder do CDS qualquer explicação: “Se a tutela desta área é do senhor viceprimeiro-ministro e se é ele que tem sido o porta-voz do Governo sobre ela, naturalmente ele dará as explicações em nome do Governo.”
Com o nome do ministro da Administração Interna, Miguel Macedo, no centro das notícias, a preocupação impera, mas também a perplexidade. De acordo com algumas das informações recolhidas pelo PÚBLICO, há no Governo e no PSD quem considere que esta investigação aos vistos gold poderá estar a ser politicamente dirigida contra Miguel Macedo.
A informação não confirmada de que Miguel Macedo teria posto o seu lugar à disposição do primeiro-ministro, Passos Coelho, veio adensar o ambiente no Governo. E se havia membros do executivo e responsáveis do partido que admitiam como certa esta hipótese, havia também quem duvidasse de tal informação. Um membro do Governo disse mesmo ao PÚBLICO que essa hipótese se lhe afigurava como “esdrúxula” e alertou para que uma notícia dessas servia na prática para enfraquecer a posição de Miguel Macedo dentro do Governo e dentro do PSD.
É um facto que Miguel Macedo é amigo pessoal do presidente do Instituto dos Registos e Notariado (IRN), António Figueiredo, detido anteontem, desde o tempo em que ambos frequentaram a faculdade, há três décadas. É um facto que Miguel Macedo foi sócio de Ana Luísa Figueiredo, filha de António Figueiredo, numa empresa de consultadoria a empresas e a autarquias que teve pouca actividade e de que Miguel Macedo se desvinculou quando entrou para o Governo. É um facto que Ana Luísa Figueiredo é sócia, com dois cidadãos portugueses e com dois cidadãos chineses, de uma outra empresa, a Golden Vista Europe, que está a ser investigada neste caso da Operação Labirinto.
Mas Miguel Macedo não foi investigado, pelo menos foi essa a posição oficial divulgada logo anteontem pela Procuradoria-Geral da República. Por isso, a ligação de Miguel Macedo a este caso dos vistos gold e as notícias de que estava a ser investigado são consideradas, por membros do Governo e por dirigentes do PSD, como um aproveitamento de factos dispersos para colar uma imagem de eventual conivência com actos
de corrupção ao actual ministro da Administração Interna.
Há mesmo quem lembre, no Governo e entre os sociais-democratas, que o executivo está em fim de mandato e que, daqui a um ano, no caso de o PS ganhar as eleições e o PSD ir para a oposição, a sucessão de Passos Coelho estará em discussão. E nesse processo Miguel Macedo é um nome a ter em conta.
Críticas a Palos
Quanto à posição de Miguel Macedo em relação à Operação Labirinto, há que destacar também o facto de que entre o ministro da Administração Interna e o director do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, Manuel Jarmela Palos, a relação é de tensão desde há uma década.
Em 2005, enquanto secretáriogeral do PSD, o actual ministro da Administração Interna exigiu a demissão do responsável do director do SEF, na sequência de uma entrevista de Palos ao PÚBLICO, em que este manifestou a sua discordância com o regime de quotas de entrada de imigrantes em Portugal. “Quem tem responsabilidades de cumprir a lei está a dizer que não se deve cumpri-la”, criticou Macedo, acrescentando: “A única solução é convidar o Governo a demiti-lo.”
Já como titular da pasta da Administração Interna, em 5 de Dezembro de 2012, Miguel Macedo reconduziu Manuel Palos à frente do SEF. Mas, na posse, o ministro afirmou: “Quero que esta tomada de posse assinale o momento de viragem de página do SEF.” E frisou: “Há aspectos que importa melhorar.” Concretizando com a necessidade de intensificar a acção inspectiva e melhorar o relacionamento dos cidadãos com o serviço.
Estas declarações foram lidas como um recado do ministro que reconduzia Palos para comprar a pacificação interna da coligação e sobretudo do seu ministério, onde a secretaria de Estado pertence ao CDS, primeiro com Lobo d’Ávila, agora com João Almeida. Além de que era manifesto o bom entendimento entre Macedo e Paulo Portas.


Anteontem, em declarações ao PÚBLICO, o actual líder parlamentar do CDS, Nuno Magalhães, que também foi secretário de Estado da Administração Interna, nos XV e XVI governos, afirmou: “Não é verdade que eu ou o CDS tenhamos feito qualquer pressão para indicar qualquer director no âmbito do MAI ou de qualquer outro ministério.” Uma negação que não desmente a boa relação entre Macedo e Portas, nem a crispação entre Macedo e Palos.

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