LEGISLATIVAS 2024
19 março 2024 às 00h58
Ponto
de partida para os votos da emigração: “Não há maioria de esquerda”
O
politólogo Adelino Maltez, ao DN, garante que há dois dados sobre as eleições
que não podem ser ignorados: a esquerda não capitalizou o suficiente e “o Chega
foi quem mais venceu em termos de conquista eleitoral”. É com base neste
princípio que Marcelo vai decidir.
Vítor Moita Cordeiro
https://www.dn.pt/7916706733/ponto-de-partida-para-os-votos-da-emigracao-nao-ha-maioria-de-esquerda/
Esta quarta-feira, serão conhecidos os
resultados dos votos da Emigração, que vão acrescentar mais dados à equação
incompleta das eleições de dia 10 de março, com PS e Aliança Democrática (AD)
com uma diferença de dois mandatos. Mas os quatro deputados que serão eleitos
com a decisão dos emigrantes portugueses na Europa e fora do Velho Continente poderão não ser suficientes para trazer um
resultado inequívoco, e Marcelo Rebelo de Sousa terá de fazer uma escolha que
determinará a força política que formará o próximo Governo.
“A única leitura correta dos resultados
eleitorais é difusa: não há maioria de esquerda em Portugal e o Chega foi quem
mais venceu em termos de conquista eleitoral. São dados relevantes para uma
interpretação. Seria absurdo ignorá-los e nem um presidente de esquerda faria
isso”, considerou ao DN o professor catedrático de Ciência Política do
Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa
(ISCSP) José Adelino Maltez.
As mais recentes eleições legislativas em
Portugal traçaram um novo horizonte de governação, com a AD, a coligação
pré-eleitoral entre PSD, CDS e PPM, a eleger 79 deputados, se considerarmos que
aos 1 758 035 eleitores que votaram nesta coligação se juntaram os 52 992 que,
na Madeira, deram três mandatos ao PSD junto com o CDS.
Logo a seguir, ficou o PS, que, com 1 759 998
votos, elegeu 77 deputados. Perante este cenário, os quatro mandatos que faltam
atribuir pelos círculos da Europa e de Fora da Europa podem fazer a diferença.
Mas o dia 10 de março trouxe também uma
novidade ao equilíbrio político entre a esquerda e a direita: o Chega passou de
um grupo parlamentar com 12 deputados para um com 48 e angariou 1 108 797
votos.
“Todas as notícias sobre as eleições
portuguesas em jornais estrangeiros ressaltaram este ponto. Isto é uma leitura
que é obrigatória fazer dos resultados eleitorais. Não digo que o Presidente
tente um Governo entre o Chega e o PSD, porque ouviu as palavras sagradas do
PSD.
Não pode forçar. Mas isso não significa
construir um Governo de esquerda ou ajudar a construí-lo. Até porque o
Presidente é eleito pela direita e diz que é de direita”, continua Adelino
Maltez, aludindo a uma das promessas que o líder da AD, Luís Montenegro fez e
sublinhou várias vezes durante a campanha, caso não conseguisse uma maioria
absoluta, que foi o que aconteceu: “Desafiar todos os outros partidos a
respeitarem a vontade popular e a encontrarem instrumentos no Parlamento que
façam com que o Governo possa executar o seu programa, excluindo o Chega.” A
lançar achas a esta fogueira complexa, Montenegro ainda prometeu que só governa
se “ganhar as eleições”.
As probabilidades matemáticas existem, tanto à
esquerda como à direita, mas é necessário perceber o que vai a jogo neste
último dia antes de se apurar todos os votos para as legislativas. Ou a AD
vence e Montenegro avança com um Governo minoritário de direita, ignorando o
Chega, como terceira força política, ou, caso não consiga ser a força política
mais votada, quebra o que prometeu, ganha mesmo tendo perdido as eleições, e
ainda convida o Chega para uma solução governativa e com estabilidade, pelo menos
em termos de mandatos no hemiciclo. E ainda há oito deputados da Iniciativa
Liberal que poderiam juntar-se.
Por outro lado, o PS também pode ser o partido
mais votado, depois de apurados os votos dos emigrantes, mas, mesmo com mais
deputados do que qualquer outra força política, e mesmo que se virasse para o
Bloco de Esquerda, PCP, Livre e PAN e os convidasse para uma nova geringonça,
não conseguiria uma maioria de deputados dentro da Assembleia da República.
Assim, continua Adelino Maltez, “é um problema
de profecia e de luta interna dentro do PSD, porque há um grupo que advoga isso
[entendimentos com o Chega], há outro que não, e, portanto, Montenegro está a
preparar o seu Governo e está a tentar que aquilo resulte durante dois meses,
também não vai demorar muito tempo, são dois meses para mostrar o que vale”.
Este período apontado pelo politólogo é uma
referência às eleições europeias, que, defende, são “um teste às eleições
nacionais” e vão ter um efeito de “segunda volta” das legislativas, mas com a
surpresa de o Chega poder ter uma queda, por já ter cumprido o aquilo que
alguns eleitores terão escolhido ao votar no partido liderado por André
Ventura: “Dar uma confusão enorme na política portuguesa.”
No entanto, para o investigador do ISCSP, “em
termos políticos não há crise absolutamente nenhuma. 70% do programa do PSD é
70% do programa do PS. Portanto, há uma grande estabilidade com todos os
objetivos essenciais”, aconteça o que acontecer depois de conhecidos os mais de
300 mil votos que se esperam pelos círculos da emigração.
“A diplomacia não está em crise, a justiça não
está em crise, não estamos numa fase de vazio de poder, as empresas não estarão
em crise, querem é um ministro que não complica as coisas”, continua o
professor catedrático, acrescentando que “até temos um Orçamento do Estado
aprovado” e “nem temos um défice imprevisível e acelerado, não temos problemas
com o FMI [Fundo Monetário Internacional] e somos governados na maior parte das
coisas pela Europa”.
As
decisões lá de fora
Começaram ontem a ser contados no Centro de
Congressos de Lisboa os 299 322 votos
que, até ao final da semana passada chegaram a Portugal vindos dos dois
círculos da emigração (Europa e Fora da Europa). Ao contrário do que aconteceu
em 2022, nas últimas legislativas, este ano, estes votos, poderão fazer toda a
diferença a determinar qual é o partido vencedor.
Ao DN, o presidente da Associação de Autarcas
Portugueses em França (CIVICA), Paulo
Marques, explicou que se espera uma maior participação dos emigrantes nestas
eleições porque houve uma maior sensibilização por parte do Conselho das Comunidades, dos movimentos associativos, por
parte dos autarcas portugueses na Europa e pelo facto de haver muitos
“emigrantes jovens recentes”.
A juntar a todo o esforço para que, nesta
eleições, já tinham sido ultrapassados os 173 792 votos da emigração registados
em 2022, Paulo Marques acrescenta que tudo isto surge como resposta a “oito
anos de distância” criada em relação aos emigrantes.
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