sábado, 24 de abril de 2021

O meu partido é Lisboa (2)

 



OPINIÃO

O meu partido é Lisboa (2)

 

As únicas forças verdadeiramente e antecipadamente vencedoras das próximas eleições autárquicas são as forças da cidadania activa e participativa.

 

António Sérgio Rosa de Carvalho

22 de Abril de 2021, 17:20

https://www.publico.pt/2021/04/22/opiniao/noticia/partido-lisboa-2-1959644

 

O número 2 neste título refere o facto de ele ser utilizado pela segunda vez. Com efeito, ele foi utilizado anteriormente por mim numa análise crítica do percurso político de António Costa ( 1 ) ilustrado pelo título do seu livro Caminho Aberto. Tratava-se de um cargo como presidente da autarquia constituir apenas um ‘trampolim’ para “voos mais altos”, como, aliás, se veio a confirmar.

 

O que se pretende de um candidato à Câmara Municipal de Lisboa? Um genuíno interesse e apelo baseado num conhecimento profundo dos verdadeiros desafios da cidade adquirido por anos de observação, reflexão e participação. Tudo isto, traduzido numa grande capacidade de gestão consciente e cuidada junto a efectiva visão estratégica, equilibrada entre desenvolvimento e salvaguarda, também com adequada sensibilidade para as questões sociais e a urgência no campo da habitação.

 

Ora, Carlos Moedas ( 2 ) apresentou uma declaração de amor à cidade baseada ‘numa mão cheia de nada’ incapaz de nos convencer da sua maturidade de conhecimento dos verdadeiros desafios da cidade no presente e no futuro. Ficámos com a impressão de que ele constitui apenas o candidato de forças políticas moribundas, que assim e desesperadamente procuram um renascimento.

 

Fica-se nitidamente com a impressão de que, em essência, não se trata de uma ‘Fénix’, mas de uma inefectiva e mera jogada política definida pelo vazio de um falso mérito passado.

 

Ou não perceberam ainda os chamados ‘liberais’ devastados por anos e anos de materialismo feroz e ganancioso que Joe Biden revelou-se fortemente não apenas como o candidato anti-Trump, mas também, e cada vez mais, como o anti-Reagan? O seu novo “New Deal” é baseado na consciência de que a sensibilidade das classes trabalhadoras e populares ao populismo irracional surge das profundas desigualdades criadas pelo neoliberalismo.

 

Os ‘35 anos a bazucar’ (título de Miguel Sousa Tavares 3 ) ilustraram perfeitamente e dramaticamente as teias e ‘polvos’ desenvolvidos por toda uma geração a que podemos chamar a geração do ‘Compromisso Portugal’ com políticos, gestores, empresários, banqueiros que nos levaram agora às encruzilhadas sucessivas e inefectivas da justiça e ao impasse de uma classe política cada vez mais desprestigiada.

 

As únicas forças verdadeiramente e antecipadamente vencedoras das próximas eleições autárquicas são as forças da cidadania activa e participativa. No entanto, estas forças, constituídas por grupos heterogéneos e flutuantes de cidadãos, unidos apenas por temas, mas com diferentes, variadas e pluralistas motivações e convicções, mantêm-se exteriores às definições de campos políticos.

 

Não nos espantemos, portanto, que nós, como votantes, sejamos também ‘órfãos políticos’ sem candidatos que nos representem, capazes de nos libertarem do ‘limbo’ a que fomos condenados

 

Daí os partidos políticos tentarem ‘agarrar’ e conduzir este autêntico potencial com promessas aliciantes aos ‘independentes’.( 4 )  Disso, já tivemos com fartura com Sá Fernandes e Helena Roseta, que viabilizaram constantemente e sistematicamente a gestões de Costa e de Medina.

 

Com os tais 35 anos criámos legiões de órfãos. Toda uma juventude licenciada mas exilada, numa gigantesca diáspora.( 5 )

 

Não nos espantemos, portanto, que nós, como votantes, sejamos também ‘órfãos políticos’ sem candidatos que nos representem, capazes de nos libertarem do ‘limbo’ a que fomos condenados.

 

E isto numa Lisboa que até ao ciclo corona estava prisioneira de monoculturas destruidoras (turismo de massas, omnipresente alojamento local, crise da habitação, omnipotente imobiliário especulativo, monocultura exclusiva dos hotéis., etc..) e terá que enfrentar profundos, e até agora incertos, desafios futuros no período pós-corona.

 

Um é claro e sobrepõe-se a todos os outros: as alterações climáticas.

 

Sim, quando caoticamente a caixa de Pandora foi aberta, e tudo se escapou e diluiu num ápice, como neve derretida sobre o Sol, a única coisa que ficou foi a esperança.

 

A minha esperança vai para uma cidadania cada vez mais activa, maduramente crítica e verdadeiramente independente.

 

Como já afirmei anteriormente: a cidadania exerce-se. A cidadania não vai a votos! ( 6 )

 

Historiador de Arquitectura


( 1 ) https://www.publico.pt/2014/08/06/politica/opiniao/o-meu-partido-e-lisboa-1665458

 

( 2 ) https://www.publico.pt/2021/03/04/politica/noticia/carlos-moedas-decisao-vida-reflectiva-pensada-1953129

 

( 3 ) https://expresso.pt/opiniao/2021-03-05-35-anos-a-bazucar

 

( 4 ) https://www.publico.pt/2021/04/21/politica/noticia/ps-be-cds-alargam-direitos-independentes-psd-quer-saber-sao-filiados-partidos-1959538

 

 ( 5 ) https://www.publico.pt/2017/02/24/sociedade/noticia/emigracao-mantem-os-niveis-altos-da-crise-e-isso-e-devastador-para-o-pais-1763125

 

( 6 )  https://www.publico.pt/2009/07/19/jornal/uma-questao-de-promiscuidades-17324530


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