segunda-feira, 30 de novembro de 2020

Novas provas mostram como Rendeiro e mais três ex-administradores desviaram 11,6 milhões de euros do BPP


 

JUSTIÇA

Novas provas mostram como Rendeiro e mais três ex-administradores desviaram 11,6 milhões de euros do BPP

 

Chegaram novas provas ao processo onde João Rendeiro está a ser julgado com mais cinco arguidos por fraude fiscal qualificada, abuso de confiança e branqueamento de capitais. Advogados de defesa contestam a legalidade das mesmas.

 

Sónia Trigueirão 30 de Novembro de 2020, 6:35

https://www.publico.pt/2020/11/30/sociedade/noticia/novas-provas-mostram-rendeiro-tres-exadministradores-desviaram-116-milhoes-euros-bpp-1940371

 

João Rendeiro e mais cinco arguidos estão a ser julgados por fraude fiscal qualificada, abuso de confiança e branqueamento de capitais.

 

O Banco Privado Português (BPP), actualmente em liquidação, alega que tem novas provas sobre como é que 11,6 milhões de euros do banco foram parar à esfera pessoal de João Rendeiro, Salvador Fezas Vital, António Guichard Alves e Fernando Lima, antigos administradores que estão a ser julgados, juntamente com mais outros dois arguidos, por fraude fiscal qualificada, abuso de confiança e branqueamento de capitais.

 

As novas provas, num total de 75 documentos, já chegaram ao processo e aguardam a decisão do colectivo de juízes que está a julgar o caso.

 

O Ministério Público (MP) diz que devem ser aceites porque não conferem uma alteração substancial dos factos, ou seja, não resultam em mais crimes para os arguidos nem num aumento das sanções a aplicar. Segundo o MP, apenas alteram a factualidade dos factos que lhes são imputados, isto é, dizem respeito à forma como os mesmos ocorreram. O MP quer ouvir mais testemunhas.

 

Para o MP há um facto, que está vertido na acusação: os quatro administradores obtiveram um ganho de cerca de 11,6 milhões de euros, que era do BPP, tendo-se apropriado desse valor indevidamente. A forma como o fizeram é que, mostrarão as novas provas, caso sejam aceites, terá sido diferente da que está descrita na acusação.

 

Os advogados dos arguidos, que elaboraram uma resposta conjunta ao requerimento do BPP que é assistente no processo, alegam ilegalidades na obtenção das provas e sustentam que o banco não tem legitimidade para fazer investigações privadas, com o julgamento já quase a chegar ao fim.

 

O que descobriu o BPP?

O BPP decidiu fazer uma análise ao sistema informático do banco e alega no seu requerimento que encontrou provas de que alguém mexeu no sistema e inseriu, em 2008, dados referentes a movimentos de 2002 e 2005.

 

Os elementos inseridos em 2008 reportam-se à participação da sociedade Telesis no negócio da compra de acções da Strand Ventures, em 19 de Agosto de 2002, e à respectiva revenda a outra empresa, a Timdington, em 30 de Dezembro de 2005.

 

Ou seja, quem inseriu os dados queria efectivamente que parecesse que o negócio teve a intervenção directa destas empresas.

 

Foi a partir desses dados, que o BPP vem agora dizer que são falsos, que o MP construiu uma parte da acusação.

 

Na acusação, o MP alega que a 20 de Dezembro de 2005 a Telesis veio a alienar as acções da Strand Ventures, por 14,1 milhões de euros, ao preço unitário de 426,05 euros, obtendo uma mais valia de 11,6 milhões de euros, sendo que o adquirente das acções foi a Timdington, sem que esta tivesse saldo para o efeito, na sua conta.

 

O que defende o MP é que o ganho da Telesis pelo valor de 11,6 milhões, foi conseguido exclusivamente com dinheiros do BPP Cayman.

 

Segundo a acusação, os arguidos parquearam dinheiros na Telesis, como se de um financiamento a um cliente se tratasse, para depois investirem em acções, como se o investimento fosse da Telesis, e venderam acções já valorizadas de volta ao BPP por via da Timdington, como se de uma operação entre clientes Telesis e Timdington se tratasse.

 

 

Portanto, para o MP, a Telesis foi usada como meio para que, em 2007, os arguidos se apropriassem indevidamente de 11,6 milhões de euros que eram do BPP.

 

Com base neste negócio, e para efeitos do crime de fraude fiscal qualificada, o MP imputa aos arguidos a obtenção de vantagem não declarada e que devia ter sido tributada à taxa de 42% (categoria A do IRS).

 

Diz ainda o MP que os arguidos, mediante acordo, decisão e execução, auferiram rendimentos que obtiveram com dinheiro do BPP, e que receberam via Telesis, pretendendo ocultá-los da administração fiscal.

 

Mais: os arguidos procederam à distribuição entre si dos 11,6 milhões de euros, sem que tivesse havido autorização por parte da comissão de vencimentos ou dos accionistas do BPP. E é assim que o MP sustenta o crime de abuso de confiança.

 

Mas as novas provas dão uma nova versão à forma como o dinheiro saiu do BPP. Os 11,6 milhões de euros saíram da Timdington, ou seja do banco, directamente para a esfera dos arguidos em Outubro de 2007.

 

Em 23 de Agosto de 2002 foi concedido um crédito por parte do BPP Cayman à Timdington, cerca de 14,9 milhões. Com esse valor, a Timdington adquiriu a 19 de Agosto de 2002, 194.501 acções da Strand Ventures. Em 3 de Setembro de 2007 é efectuada a venda final pela Timdington das acções detidas na Ashurst (ex-Strand Ventures), por 81 milhões de euros, passando a estar disponível na sua conta junto do BPP Cayman cerca de 77,4 milhões.

 

Entre 11 de Outubro e 21 de Outubro de 2007, são efectuadas oito transferências a partir dessa mesma conta da Timdington com destino a contas externas, em beneficio dos arguidos, cerca de 11,6 milhões.

 

Perante a nova descrição do que se passou, o MP vem assumir que, a confirmarem-se, as novas provas são susceptíveis de colocarem em causa a descrição dos factos constante da acusação relativamente à forma como os 11,6 milhões chegaram à posse dos arguidos ou seja, à sua origem.

 

Porém entende que não configuram uma alteração substancial dos factos e que se mantém a imputação de um crime fiscal, uma vez que no entender da acusação os valores obtidos com aquele negócio não foram declarados à autoridade tributária pelos arguidos.

 

Quanto ao crime de abuso de confiança, sai reforçado com as novas provas, entende o MP.

 

Os crimes em causa não são alterados porque, mesmo que se provassem as alterações no sistema informático, estes factos ocorreram em 2008, portanto já estão prescritos.

 

Resumindo, para o MP, as novas provas devem ser valoradas no processo.

 

Segundo o MP, entre 2003 e 2008, o valor dos rendimentos não declarados pelos arguidos, em sede de IRS, corresponde a quase 16,5 milhões de euros. Os arguidos são também acusados de se terem apropriado, de forma ilegítima, de fundos da titularidade do BPP, mais de 29 milhões de euros.

 

O MP pede ainda uma indemnização para o Estado de quase 10 milhões de euros.

 

Os advogados de João Rendeiro, Salvador Fezas Vital, António Guichard Alves e Fernando Lima alegam que, “encontrando-se o processo criminal já na fase de julgamento (...) em caso algum se admitem investigações paralelas privadas, feitas na sombra, com desconhecimento e à revelia dos demais sujeitos processuais”, sobretudo do tribunal.

 

De acordo com a resposta ao requerimento do BPP, a que o PÚBLICO, teve acesso, os advogados consideram que é ao MP, e não a uma entidade privada como é o assistente, que compete promover a investigação criminal.

 

Argumentam ainda que os documentos que o BPP agora apresenta encontram-se na sua posse e disponibilidade desde sempre, nomeadamente, durante os mais de 10 anos que o presente processo conta – recorde-se que este processo entronca noutro, aberto logo em 2008.

 

“Tendo os documentos à sua disposição durante os 8 anos (oito!) em que o inquérito correu, podia o assistente tê-los disponibilizado ao Ministério Público ou solicitado ao Ministério Público que os recolhesse e examinasse, por si ou através de peritos”, alegam, sublinhando que esta investigação promovida pelo BPP não foi independente. De resto, os advogados levantam a dúvida se outros documentos não podem ter ficado de fora desta investigação.

 

Além disso, consideram que o banco ao promover uma investigação privada violou o dever do sigilo bancário. Cabe a agora ao colectivo de juízes decidir se vai ou não aceitar as novas pro

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