“A
morrer do seu sucesso”. Assim é vista Lisboa pelo ‘El País’
Tornou-se
“meca do turismo internacional” mas tudo tem um preço. No caso de Lisboa, é a
gentrificação e a “perda das suas essências”, escreve o jornal espanhol ‘El
País’.
Rute Barbedo
Escrito por Rute Barbedo sexta-feira 31 maio
2024
"O símbolo de Lisboa, romantismos à
parte, é o tuk-tuk." Assim começa o jornal El País uma reportagem sobre a
transformação da cidade sobretudo nos últimos dez anos, à boleia do crescimento
do turismo. Publicada a 29 de Maio, a peça recai sobre as perdas de
autenticidade, em troca da proliferação de cadeias de marcas internacionais e
de lojas descaracterizadas naquele que foi considerado o melhor destino urbano
europeu de viagem na edição deste ano dos World Travel Awards, os "óscares
do turismo".
O "melhor" contempla infinitas
variações e é, por isso, sempre relativo. Pode ser uma cidade onde há
"decorações florais de plástico" e tigres nos tejadilhos dos tuk-tuks
o melhor destino turístico? Talvez, se considerarmos que "Lisboa entrou
para o clube das cidades carismáticas que já só fazem os visitantes
felizes". A questão agudiza-se, no entanto, quando um lugar deixa também
de fazer felizes os próprios turistas, como arrisca uma moradora da zona do
Castelo, Tânia Correia, abordada pelo jornal espanhol. Se a gentrificação
atinge os locais, a "perda de essências" afecta também os visitantes.
A
"Lisboa cool" que perdeu 30% da população
"A Lisboa cool de roupas penduradas,
azulejos e fachadas coloridas" é também a que "perdeu perto de 30% da
população desde 2013", aponta o diário, arriscando projectar a cidade no
futuro: "Se o ritmo de expulsão dos locais não parar, dentro de alguns
anos os turistas só poderão ver-se uns aos outros quando subirem Alfama."
No passado recente, enumera o El País, perderam-se vizinhos, mercearias
tradicionais, associações de bairro e a vida colectiva.
Indo ao detalhe, a reportagem elenca casos
recentes de fechos, como a Livraria Ferin ou a Casa Senna, ou de casas
históricas que vivem sob a ameaça de ficar sem tecto, como a Academia dos
Amadores de Música. "Talvez sem a Academia não tivessem existido os
Madredeus, o grupo que triunfou em todo o mundo com a sua reivindicação da
música tradicional à margem do fado, já que tanto a vocalista Teresa Salgueiro
como o guitarrista Pedro Ayres Magalhães foram formados na escola." As
palavras de Pedro Martins Barata, presidente da Academia, ajudam a descrever a
transformação: "A ideia que havia do Chiado como centro da vida cultural
lisboeta já desapareceu. Exceptuando os teatros e museus, que não se podem
alterar, quase tudo são lojas de marcas internacionais ou de souvenirs. O
turismo dizimou tudo."
Nada de novo para os lisboetas, habituados a
lidar com perdas, mas dissonante, esta reportagem, de muitas outras peças que
têm sido publicadas sobre a cidade nos últimos anos, qualificando-a como o
destino mais cool ou apetecível da Europa.
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