quarta-feira, 28 de junho de 2023

Lei do Restauro por um fio. Decisão final nas mãos do plenário do Parlamento Europeu / Law of Restoration by a thread. Final decision in the hands of the plenary of the European Parliament

 


AMBIENTE

Lei do Restauro por um fio. Decisão final nas mãos do plenário do Parlamento Europeu

 

Comissão de Ambiente do Parlamento Europeu rejeita proposta negociada nos últimos meses sobre a Lei do Restauro da Natureza. Votação em plenário será última oportunidade de salvar lei de conservação.

 

Aline Flor

27 de Junho de 2023, 16:00

https://www.publico.pt/2023/06/27/azul/noticia/lei-restauro-fio-decisao-final-maos-plenaria-parlamento-europeu-2054768

 

A Lei do Restauro da Natureza prevê a reversão do declínio de insectos polinizadores, aumento de espaços verdes ou o restauro de habitats em más condições

 

“Tirem os vossos casacos, isto vai aquecer.” O tom leve de Pascal Canfin, presidente da comissão de Ambiente do Parlamento Europeu (PE), não foi suficiente para desanuviar a tensão na manhã desta terça-feira, na continuação da longa votação do relatório sobre a Lei do Restauro da Natureza, que tinha sido interrompida há duas semanas. O resultado: “44-44, rejeitado”, concluiu por fim o eurodeputado francês, usando a expressão tantas vezes ouvida ao longo da votação de centenas de emendas.

 

A Lei do Restauro fica, assim, encurralada nos labirintos políticos do Parlamento Europeu, entre a rejeição do Partido Popular Europeu (PPE, onde se insere o PSD e o CDS), aliado aos grupos de extrema-direita e a parte dos liberais do Renew Europe, e as famílias dos Socialistas e Democratas (S&D, que inclui o PS), Verdes, Esquerda (que integra PCP e BE) e a outra parte do Renew, que votaram a favor da lei, com o apoio de associações ambientalistas e cientistas de todo o mundo.

 

Não havendo maioria na votação desta terça-feira, ao invés de propor melhorias, a comissão do Ambiente vai propor, na sessão plenária, a rejeição da proposta de lei da Comissão Europeia para conservação da natureza, que tem entre os seus objectivos restaurar 20% das áreas de terra e de mar da União Europeia até 2030. Haverá uma última oportunidade de submeter novamente as emendas na votação final, de forma a não desperdiçar o trabalho de negociação dos últimos meses. Contudo, se o Parlamento Europeu como um todo confirmar a rejeição da proposta em plenário — a votação deve ser agendada já para o plenário de 10 a 13 de Julho —, a União Europeia ficará sem uma peça-chave na protecção da biodiversidade.

 

Entre os objectivos da proposta está o restauro de 80% dos habitats europeus em más condições, a reversão do declínio dos insectos polinizadores até 2030, o aumento em 5% dos espaços verdes urbanos até 2050 e a redução em 50% do uso de pesticidas químicos até 2030


Em conferência de imprensa após as votações, o relator da proposta do Parlamento Europeu, o socialista César Luena, recordou a importância desta “primeira lei de natureza e biodiversidade em 70 anos de construção europeia” e prometeu não baixar os braços até à plenária de Julho, onde se espera que seja agendada a votação final.

 

“Vamos acrescentar emendas e vamos negociar tudo com todos”, garantiu o eurodeputado espanhol, relembrando que no plenário ainda será possível apresentar emendas, incluindo os compromissos firmados nos últimos meses com os partidos mais à esquerda.

 

“Parto” Ecológico Europeu

A Lei do Restauro da Natureza foi apresentada pela Comissão Europeia em Junho de 2022 como um dos pilares do Pacto Ecológico Europeu, a cargo do vice-presidente executivo da CE,​ Frans Timmermans, traduzindo-se num conjunto de estratégias e leis que têm tido um longo “parto” desde 2019, quando foi anunciado. A legislação sobre restauração vem preencher uma lacuna nas provisões sobre a recuperação a longo-prazo de recursos naturais na UE, permitindo atingir os objectivos climáticos e da biodiversidade, não apenas da UE, mas os que foram assumidos na COP15 da Biodiversidade, em Novembro do ano passado.

 

Entre os objectivos da proposta está o restauro de 80% dos habitats europeus em más condições, a reversão do declínio dos insectos polinizadores até 2030, o aumento em 5% dos espaços verdes urbanos até 2050, a redução em 50% do uso de pesticidas químicos até 2030, banindo o seu uso em “áreas sensíveis” tais como as protegidas e as áreas verdes urbanas.

 

A proposta da Comissão tem estado em análise tanto pelo Conselho da União Europeia — que aprovou a sua proposta na semana passada — como pelo Parlamento Europeu. No PE, foi a comissão de Ambiente, Saúde Pública e Segurança Alimentar que ficou a cargo de formular as propostas de melhoria da lei (para serem mais tarde negociadas com o Conselho), com o relatório a cargo do eurodeputado socialista César Luena.

 

As más notícias começaram a chegar nas comissões que emitiram pareceres, nomeadamente a da Agricultura e a das Pescas, que rejeitaram a proposta de lei perante uma aliança entre o PPE e os partidos mais à direita do Parlamento Europeu. O PPE, aliás, retirou-se das negociações nos últimos meses, alegando que a proposta da Comissão irá pôr em risco a segurança alimentar europeia e prejudicar a economia agrícola em geral.

 

Por trás do boicote à Lei do Restauro estará o eurodeputado alemão Manfred Weber, presidente do PPE. Esta posição, contudo, tem sido vista como um dos primeiros indícios dos confrontos partidários que se prevêem até às eleições europeias de Junho de 2024.

 

A pergunta que muitos se fazem, em particular jovens, é: “Foram capazes de fazer tanto nos últimos anos, como é possível não conseguirem passar uma lei sobre biodiversidade?”

César Luena, eurodeputado

 

O presidente da comissão de Ambiente, Pascal Canfin (do grupo liberal centrista Renew), afirma ter havido “uma clara manipulação de votos” na votação da comissão de Ambiente, denunciando que “um número significativo de membros da comissão” — nomeadamente “um terço dos deputados do PPE” — foram substituídos por outros colegas, em particular “eurodeputados alemães da comissão de Agricultura”.

 

Do outro lado da barricada, a eurodeputada alemã Christine Schneider, relatora-sombra do projecto de Lei do Restauro pelo PPE, relembrou as objecções do grupo parlamentar democrata-cristão, como a ameaça à segurança alimentar ou o prejuízo para o sector agrícola, alegando que não houve uma “avaliação de impacto clara e em condições”. “Se a Comissão Europeia tivesse levado a sério as nossas preocupações, não estaríamos aqui hoje”, rematou.

 

Já Peter Liese, porta-voz do PPE na comissão de Ambiente, deixou claro o alvo do ataque do seu grupo parlamentar: “Timmermans está a avançar demasiado e a avançar mal”, afirmou, atacando várias vezes o vice-presidente da CE responsável pela pasta do Pacto Ecológico Europeu.

 

O relator socialista César Luena relembrou que, fora das movimentações em curso no Parlamento Europeu, a Lei do Restauro da Natureza continua o seu caminho, nomeadamente com a aprovação no Conselho da UE. “Dentro de poucos dias começa a presidência espanhola do Conselho da UE”, lembrou ainda, garantindo que a negociação bem-sucedida desta lei na fase de trílogo — que só acontecerá caso seja aprovada pelo Parlamento — será uma das bandeiras do governo espanhol.

 

Face ao resultado desta terça-feira, César Luena deixou, por fim, uma palavra de condenação à atitude apresentada pela direita ao tentar travar esta lei. “A pergunta que muitos se fazem, em particular jovens, é: ‘Foram capazes de fazer tanto nos últimos anos, como é possível não conseguirem passar uma lei sobre biodiversidade?’”


ENVIRONMENT

Law of Restoration by a thread. Final decision in the hands of the plenary of the European Parliament

 

The European Parliament's Environment Committee rejects a proposal negotiated in recent months on the Nature Restoration Act. A vote in plenary will be the last chance to save conservation law.

 

Aline Flower

27 June 2023, 16:00

https://www.publico.pt/2023/06/27/azul/noticia/lei-restauro-fio-decisao-final-maos-plenaria-parlamento-europeu-2054768

 

The Nature Restoration Act provides for reversing the decline of pollinating insects, increasing green spaces or restoring habitats in poor condition

 

"Take off your coats, this will heat up." The light tone of Pascal Canfin, chairman of the European Parliament's Environment Committee, was not enough to defuse tension on Tuesday morning, as the continuation of the long vote on the report on the Nature Restoration Act, which had been halted two weeks ago. The result: "44-44, rejected," the French MEP finally concluded, using the expression so often heard throughout the vote on hundreds of amendments.

 

The Restoration Law is thus trapped in the political labyrinths of the European Parliament, between the rejection of the European People's Party (EPP, which includes the PSD and the CDS), allied with the far-right groups and the part of the liberals of Renew Europe, and the families of the Socialists and Democrats (S&D, which includes the PS),  Greens, Left (which integrates PCP and BE) and the other part of Renew, who voted in favor of the law, with the support of environmental associations and scientists from around the world.

 

With no majority in Tuesday's vote, instead of proposing improvements, the Environment Committee will propose, in plenary, the rejection of the European Commission's draft law for nature conservation, which has among its objectives to restore 20% of the European Union's land and sea areas by 2030. There will be one last opportunity to resubmit the amendments in the final vote, so as not to waste the negotiating work of recent months. However, if the European Parliament as a whole confirms the rejection of the proposal in plenary — the vote should be scheduled for plenary from 10 to 13 July — the European Union will be without a key player in protecting biodiversity.

 

Among the objectives of the proposal are the restoration of 80% of European habitats in poor condition, the reversal of the decline of pollinating insects by 2030, the 5% increase of urban green spaces by 2050 and the 50% reduction in the use of chemical pesticides by 2030

In a press conference after the votes, the rapporteur for the European Parliament's proposal, the Socialist César Luena, recalled the importance of this "first law on nature and biodiversity in 70 years of European construction" and promised not to lower his arms until the July plenary, where the final vote is expected to be scheduled.

 

"We will add amendments and we will negotiate everything with everyone," said the Spanish MEP, recalling that in plenary it will still be possible to present amendments, including the commitments made in recent months with the most left-wing parties.

 

European ecological "childbirth"

The Nature Restoration Act was presented by the European Commission in June 2022 as one of the pillars of the European Green Deal, in charge of EC Executive Vice-President Frans Timmermans, translating into a set of strategies and laws that have had a long "birth" since 2019, when it was announced. The restoration legislation fills a gap in the provisions on the long-term recovery of natural resources in the EU, making it possible to achieve the climate and biodiversity objectives, not only of the EU, but those that were taken up at COP15 on Biodiversity in November last year.

 

Among the objectives of the proposal are the restoration of 80% of European habitats in poor condition, the reversal of the decline of pollinating insects by 2030, the 5% increase of urban green spaces by 2050, the 50% reduction of the use of chemical pesticides by 2030, banning their use in "sensitive areas" such as protected and urban green areas.

 

The Commission's proposal has been under consideration by both the Council of the European Union — which approved its proposal last week — and the European Parliament. In the EP, it was the Committee on the Environment, Public Health and Food Safety that was in charge of formulating the proposals for improving the law (to be negotiated later with the Council), with the report being carried out by the Socialist MEP César Luena.

 

The bad news began to arrive in the committees that issued opinions, namely Agriculture and Fisheries, which rejected the draft law in the face of an alliance between the EPP and the parties further to the right of the European Parliament. The Group of the European People's Party (Christian Democrats) and European Democrats, moreover, has withdrawn from the negotiations in recent months, claiming that the Commission's proposal will jeopardise European food security and harm the agricultural economy in general.

 

Behind the boycott of the Restoration Law will be German MEP Manfred Weber, president of the EPP. This position, however, has been seen as one of the first indications of the partisan clashes that are expected until the European elections in June 2024.

 

The question that many ask themselves, particularly young people, is: "They have been able to do so much in recent years, how is it possible not to be able to pass a law on biodiversity?"

César Luena, MEP

 

The chairman of the Environment Committee, Pascal Canfin (of the centrist liberal group Renew), claims that there has been "a clear manipulation of votes" in the Environment Committee's vote, denouncing that "a significant number of committee members" – namely "a third of the EPP MEPs" – have been replaced by other colleagues, in particular "German MEPs from the Agriculture Committee".

 

On the other side of the barricade, German MEP Christine Schneider, shadow rapporteur of the EPP's Restoration Bill, recalled the objections of the Christian Democratic parliamentary group, such as the threat to food security or the damage to the agricultural sector, claiming that there had been no "clear and conditional impact assessment". "If the European Commission had taken our concerns seriously, we would not be here today," he said.

 

Peter Liese, the EPP's spokesman on the Environment Committee, made clear the target of his parliamentary group's attack: "Timmermans is going too far and going badly," he said, repeatedly attacking the EC vice-president responsible for the European Green Deal.

 

The Socialist rapporteur César Luena recalled that, outside the ongoing movements in the European Parliament, the Law on the Restoration of Nature continues its path, namely with the approval in the Council of the EU. "In a few days the Spanish presidency of the Council of the EU begins," he said, assuring that the successful negotiation of this law in the trialogue phase – which will only happen if it is approved by Parliament – will be one of the flags of the Spanish government.

 

Faced with Tuesday's result, César Luena finally left a word of condemnation to the attitude presented by the right in trying to stop this law. "The question that many ask themselves, particularly young people, is: 'They have been able to do so much in recent years, how is it possible not to be able to pass a law on biodiversity?'"


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