Adão e Silva: De comentador de plantão ao mais comentado
do momento, quem é o comissário para os 50 anos do 25 de Abril?
POLÍTICA
09.06.2021 às
16h02
NUNO MIGUEL ROPIO
JORNALISTA
Passaram quase
duas semanas desde que Costa o anunciou como comissário para as comemorações
dos 50 anos do 25 de Abril, com a bênção de Belém. Mas só com a revelação da
dimensão da máquina, e acima de tudo do salário, que acompanha as funções
durante os próximos cinco anos, é que Pedro Adão e Silva passou a estar debaixo
de fogo - desde o líder da oposição às inevitáveis redes sociais. O comentador
já abdicou do salário como docente universitário para assumir tais funções
Pedro Adão e
Silva passou de um dos comentadores políticos mais ativos – fruto de quase uma
década em pleno nos media – para um dos assuntos mais escrutinados do momento,
após a nomeação para a presidência da comissão executiva da unidade de missão
que vai desenhar as comemorações dos 50 anos da Revolução dos Cravos. Um tweet
de Rui Pinto, denunciante do FutebolLeaks e do LuandaLeaks, ao replicar um
editorial do Porto Canal sobre o assunto, atirou o nome do docente do ISCTE –
Instituto Universitário de Lisboa para a ordem do dia.
O líder do PSD
foi taxativo, na senda de tal tweet e após de ter sido publicado em Diário da
República o formato e o custo da estrutura que Adão e Silva vai dirigir a
partir de agora e até 2026: “O Governo quer que todos paguemos ao dr. Pedro
Adão e Silva mais de 300 mil euros para organizar ou ajudar a organizar as
comemorações do 25 de Abril. Considero isto escandaloso”.
“Todos o
conhecemos como um comentador que aparece com a capa de independente, mas que
não faz outra coisa que não seja defender as posições do PS, e atacar e tentar
denegrir a oposição”, atirou Rui Rio, no Parlamento, na última terça-feira,
replicando no Twitter o mesmo vídeo do canal propriedade do Futebol Clube do
Porto. A que se seguiram outras tantas reações à direita, como do CDS, que
obrigaram António Costa a vir a terreiro defender a sua escolha, considerando
“insultuosa” a onda crítica de que Adão e Silva tem sido alvo. Aliás, até
Marcelo Rebelo de Sousa, que já havia escolhido o antigo chefe de Estado
Ramalho Eanes para presidir a um dos três órgãos da unidade de missão, sentiu
necessidade de frisar que o nome do docente, de 47 anos, passou com seu aval.
Em causa está o
facto de o cargo executivo que Pedro Adão e Silva ter como referência
remuneratória o salário dos cargos de direção superior de 1.º grau, e as
respetivas ajudas de custo. Contas feitas: uma remuneração bruta mensal de
3745,26 euros e ainda 780,36 euros como despesas de representação. A antiga
eurodeputada Ana Gomes, candidata nas últimas eleições presidenciais, já veio
questionar a acumulação de salários do comentador e a dimensão da máquina
criada pela estrutura de missão.
Porém, a VISÃO apurou
junto de fontes ligadas ao ISCTE que Pedro Adão e Silva decidiu suspender o
vínculo laboral com aquela universidade assim que aceitou o convite, ficando
sem um salário bruto alegadamente semelhante que aufere como professor auxiliar
– de acordo com o sistema remuneratório em vigor, o valor para este grau de
docência pode começar pouco acima dos 3 mil euros brutos e ir até aos 4 mil
euros [conferir aqui, na página 11, valores relativos a 2020]. “Comunicou ao
departamento que continuará a dar algumas aulas por vontade própria, sem
remuneração, e a orientar alguns alunos nas suas teses, para não haver uma
disrupção”, assegurou aquela mesma fonte.
Do PS de Ferro
Rodrigues às televisões, com uma prancha pelo meio
A escolha de
António Costa para liderar os festejos do 25 de Abril não provocaram surpresa
em quem conhece o comentador, que tem hoje uma presença transversal da
televisão à imprensa escrita, passando pelas rádios.
Para Paulo
Pedroso, antigo ministro do Trabalho e Segurança Social, com quem Adão e Silva
colaborou então como assessor, muito jovem, “é absurda a leitura que um
programa de comemorações desta dimensão não tivesse dignidade e fosse tratado
de qualquer forma, em cima da hora, sem qualquer coordenação”.
“Houve uma
interpretação muito perversa de um canal de televisão, que não trouxe nada de
novo, que é atentatória de um percurso de alguém, cuja militância ativa no PS
se ficou pela saída de Ferro Rodrigues da liderança do partido. E achar-se que
um processo com esta amplitude, que exige uma função com a mínima dignidade e
estrutura para que as coisas funcionem, não poder ter o formato que consta na
resolução do Conselho de Ministros é simplesmente abjeto”, defendeu, à VISÃO,
Pedroso, que partilhou parte do percurso com o comentador, desde o tempo em que
foi secretário de Estado, “em vários contextos no ISCTE e antes do doutoramento
[de Adão e Silva]”.
Filho da
conhecida advogada Vera Adão e Silva, que chegou a liderar a deontologia da
Ordem dos Advogados do distrito de Lisboa e foi agraciada com a Ordem do
Infante D. Henrique pelo trabalho realizado no âmbito da Amnistia Internacional
e do apoio aos reclusos políticos mundiais, e do artista plástico Luís Artur,
Pedro Adão e Silva nasceu no ano da Revolução. Pai de dois rapazes, começou por
militar no PS logo aos 18 anos, tendo chegado ao Secretariado Nacional (núcleo
duro do líder) de Ferro Rodrigues, em 2002.
O afastamento da
atividade política ativa deu-se com a saída de Ferro, na sequência do
descontentamento que o atual presidente da Assembleia da República mostrou com
a indigitação de Pedro Santana Lopes como primeiro-ministro, por parte do Chefe
de Estado Jorge Sampaio, quando Durão Barroso saiu do Governo rumo a Bruxelas.
Logo depois
começa a sua carreira de comentador, pela então RTPN – que sucedeu à NTV e
antecessora da RTP3 -, Rádio Clube Português e Diário Económico. Mas também
colaborava com a revista Surf Portugal, devido à paixão em domar as ondas, que
então elevava à letra literalmente, tendo em conta que mais tarde haveria de
publicar uma obra sobre essa prática – que contou com o prefácio do agora
cardeal português responsável pelo Arquivo Apostólico do Vaticano, Tolentino de
Mendonça.
É também dessa
altura a maior entrega à academia, na área da Sociologia, voltando a colaborar
com o PS de José Sócrates, para quem chegou a elaborar, entre muitos outros, a
moção que o então líder socialista haveria de levar ao congresso do partido, em
2009. São desses tempos, aliás, as imagens que o editorial do Porto Canal
recuperou esta semana.
Desde então,
desfilou-se do partido – sendo que os mais próximos, ouvidos pela VISÃO,
admitem que nunca tocou no assunto, ao ponto de não saberem quando terá
ocorrido exatamente – e tem desfilado por vários órgão de comunicação social
como cronista, tendo se tornado comentador residente no canal de notícias da
televisão pública. Porém, nunca renegou a sua família política, principalmente
durante o Governo PSD/CDS, de Passos Coelho.
Mais recentemente
correu ao lugar de vice-presidente do Benfica, na lista derrotada de Noronha
Lopes contra a de Luís Filipe Vieira, tendo continuado a desfiar críticas ao
presidente do Clube da Luz desde essa altura, principalmente no comentário
desportivo que também faz. Percurso nas águias que mereceu reparo no tal vídeo
do Porto Canal.
Contactado pela
VISÃO, o agora comissário executivo Pedro Adão e Silva (que terá uma máquina
composta por três adjuntos, três técnicos especialistas, um secretário pessoal
e ainda um motorista) não mostrou disponibilidade para comentar os comentários
de que, enquanto famoso comentador político e desportivo, tem sido alvo. Dias
depois de ter sido anunciado para o cargo, levantou um pouco o véu sobre como
pensa levar a cabo as comemorações do 25 de Abril, defendendo que é necessária
uma reinvenção “à forma como olhamos para as celebrações”.



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