EDITORIAL
CORONAVÍRUS
Os melhores do mundo, os piores do mundo
Se uma das primeiras frases da Organização Mundial de
Saúde foi a famosa “testar, testar, testar”, porque é que se demorou tanto a
chegar ao que a ministra da Saúde finalmente anunciou ontem?
Ana Sá Lopes
11 de Fevereiro de
2021, 5:30
https://www.publico.pt/2021/02/11/politica/editorial/melhores-mundo-piores-mundo-1950201
Entre as várias
doenças colectivas de que o povo português padece uma é, seguramente, a
ciclotimia: ora somos os piores do mundo (“Só neste país”) ora os melhores do
mundo, como aconteceu na euforia da Expo-98 ou em alguns campeonatos de
futebol. A frase do virologista Pedro Simas desta semana é interessante sobre a
ciclotimia da covid-19: “Fomos dos melhores do mundo no primeiro confinamento,
os piores na origem da terceira vaga e vamos ser um dos países do mundo que
mais depressa conseguiram controlar a terceira vaga porque houve uma adesão
fantástica ao confinamento e o resultado está à vista”. Embora a ciclotimia
esteja profundamente enraizada na chamada “alma portuguesa”, talvez a ciência
mande ter alguma prudência a ler os resultados. O número de infecções diárias
está a baixar, mas continuamos com um número de mortes elevadíssimo. Como nesta
edição o presidente da Associação de Administradores Hospitalares diz, o risco
dos indicadores de saúde de Portugal baixarem drasticamente é imenso: “Vamos
regredir anos”.
A resposta
covid-19 fez reduzir a “resposta não covid”, e o aumento da mortalidade desde
Abril tem vindo a ser constante – e também está por estudar. O facto de o mês
de Janeiro ter tido o número mais elevado de mortes desde 1918 (em plena gripe
espanhola) é um dado que tem de obrigatoriamente pôr as autoridades de saúde em
estado de alerta. Há, no comportamento do vírus, uma quantidade de factores que
não podemos controlar – desde a sucessão de variantes mais complexas que têm
vindo a ser conhecidas até à falta de explicação científica para o facto de
atacar mais uns países do que outros, que tomaram exactamente as mesmas
medidas. Se é complexo controlar o vírus, menos complexo será tentar perceber o
que se passa no Serviço Nacional de Saúde e dar os meios necessários: Portugal
está abaixo da média da Europa em camas de cuidados intensivos. Depois, há
coisas que não deveriam ter custado mesmo nada: como foi possível que há três
meses António Costa tenha prometido exponenciar as equipas de rastreadores
nomeadamente com o recurso às Forças Armadas, e isso praticamente não tenha
saído do papel? E se uma das primeiras frases da Organização Mundial de Saúde
foi a famosa “testar, testar, testar”, porque é que se demorou tanto a chegar
ao que a ministra da Saúde finalmente anunciou ontem?
P.S. Boa notícia
é o desconfinamento dos livros anunciado ontem no decreto do Presidente da
República. A ideia de que se podia ir a um supermercado comprar tudo menos
livros era provavelmente uma das mais obnóxias medidas do confinamento.

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