Obras no palacete de Aga Khan ainda
não começaram e já causam preocupação
As sondagens que têm sido feitas nos
jardins e no interior de um imóvel classificado levam Fórum Cidadania Lx a
pedir a intervenção dos deputados.
JOÃO PEDRO PINCHA 17 de Outubro de 2017, 8:00
A Câmara Municipal de Lisboa e a Direcção-Geral do Património
Cultural (DGPC) estão a apreciar um projecto de reabilitação do palacete
Henrique Mendonça, desenhado no início do século passado por Miguel Ventura
Terra, onde vai funcionar a sede mundial da comunidade ismailita. As obras
ainda não têm aprovação, mas estão já a gerar inquietação entre activistas de
defesa do património.
O Fórum Cidadania Lx suspeita que o projecto traga “obras
profundamente intrusivas” ao palacete, vencedor de um Prémio Valmor em 1909 e
classificado como “imóvel de interesse público” desde 1982. Numa carta enviada
na quinta-feira aos deputados da Comissão de Cultura da Assembleia da
República, os membros do fórum afirmam que está prevista a “colocação de
elevadores”, a “abertura de vãos” e “a construção de um parque de estacionamento
subterrâneo” por baixo do jardim enorme e verdejante do palacete.
Ismailitas, a elite muçulmana da diplomacia e dos negócios
que terá sede mundial em Lisboa
O fórum diz ainda, na mesma carta, que já foram feitos
“vários buracos no chão da cozinha e em pelo menos uma das salas do palacete”,
na sequência de “sondagens com vista a apurar-se da resistência estrutural do
edifício”. O projecto de reabilitação ainda não teve luz verde, mas, tendo em
conta estes trabalhos, “parece ter já aprovação garantida”, criticam os membros
do Cidadania Lx. Na carta pede-se, por isso, que os deputados intervenham,
pressionando a câmara e a DGPC.
A comunidade ismailita, liderada mundialmente pelo príncipe
Aga Khan, garante que não há razões para alarme. “Como habitual em projectos
desta natureza, realizaram-se sondagens no interior e exterior do palacete para
perceber melhor as características do solo e as técnicas de construção”,
esclarece um assessor de imprensa da organização. Essas sondagens visam também
“aperfeiçoar o projecto de reabilitação”, que está a cargo do arquitecto
Frederico Valsassina.
No início de Agosto, na sequência de um primeiro alerta do
fórum, técnicos da autarquia deslocaram-se ao palacete para averiguar se
estariam a ser feitas obras ilegais. A fiscalização não detectou sinais disso e
o vereador do Urbanismo, Manuel Salgado, remeteu ao fórum a garantia de que
apenas estavam a ser feitas “sondagens geológicas (recolha de amostras do
solo)”.
Foi o facto de as sondagens terem passado do jardim para o
interior do palacete fez disparar novamente o alarme do fórum, que considera
que aqueles trabalhos precisavam de autorização expressa da câmara e da DGPC,
uma vez que se trata de um imóvel classificado. O PÚBLICO perguntou à autarquia
em que fase está a apreciação do projecto, mas não obteve resposta até ao fecho
da edição.
O assessor de imprensa da comunidade ismailita confirma que
vai ser construído “um pequeno parque de estacionamento subterrâneo”, mas
“sempre em escrupuloso cumprimento da legislação” e “respeitando todas as
exigências técnicas”.
O palacete Henrique Mendonça foi construído na Rua Marquês
de Fronteira no início do século XX. O projecto original é do arquitecto Miguel
Ventura Terra, responsável por inúmeros edifícios em Lisboa, Porto e Viana do
Castelo, entre outros locais. O imóvel, concluído em 1909, foi nos últimos anos
ocupado por serviços da Faculdade de Economia da Universidade Nova de Lisboa,
que adaptaram alguns espaços a salas de aulas e de trabalho. Os jardins da
propriedade, também classificados, eram até há poucos anos de acesso livre e
tinham esculturas provenientes da colecção Gulbenkian.
O Estado vendeu o palacete à comunidade ismailita em Maio do
ano passado por 12 milhões de euros. A intenção do príncipe Aga Khan é instalar
ali a sede mundial da organização, que representa uma corrente discreta e
poderosa da religião muçulmana. Em Portugal, há cerca de oito mil fiéis e a
Fundação Aga Khan desenvolve inúmeros projectos sociais, culturais e
educativos.
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