O combate às
alterações climáticas: um movimento imparável
A ciência
mostra-nos que se nada for feito enfrentamos, pelo menos, 3 graus Celsius de
aquecimento global até ao final do século. Eu não estarei cá, mas minhas netas,
sim.
António Guterres
4 de Outubro de
2019, 20:37
Na véspera da
Cimeira de Ação Climática da ONU, em setembro, milhões de jovens mobilizaram-se
em todo o mundo e disseram aos líderes globais: “Estão a dececionar-nos”.
Têm razão.
As emissões
globais de gases para a atmosfera estão a aumentar. As temperaturas estão a
subir. As consequências já são terríveis para os oceanos, as florestas, os
padrões climáticos, a biodiversidade, a produção de alimentos, a água, os
empregos e, em última instância, para a vida, e deverão continuar a piorar.
A ciência é
irrefutável, mas em muitos lugares, as pessoas não precisam de tabelas ou de
gráficos para se aperceberem da crise climática. Basta olhar pela janela.
O caos climático
está a acontecer em tempo real, da Califórnia às Caraíbas, de África ao Ártico
e em outros locais, e são os que menos contribuem para este problema quem mais
sofre.
Pude constatá-lo
com os meus próprios olhos em Moçambique, país devastado por ciclones, nas
Bahamas, território arrasado por um furacão e no Pacífico Sul com a subida do
nível das águas do mar.
Convoquei a
Cimeira de Ação Climática para que fosse o ponto de partida do caminho que
teremos de percorrer se queremos cumprir os prazos cruciais estabelecidos pelo
Acordo de Paris para as alterações climáticas até 2020. Muitos líderes, de
muitos países e setores, estiveram presentes.
Governos, jovens,
empresas, cidades, investidores e sociedade civil, uniram-se para adotar as
medidas que o mundo tanto necessita para que se consiga evitar uma catástrofe
climática.
Mais de setenta
países assumiram o compromisso de eliminar as emissões de carbono até 2050,
apesar dos principais emissores ainda não o terem feito. Mais de 100 cidades
assumiram igual compromisso, incluindo algumas das maiores metrópoles do mundo.
Pelo menos
setenta países anunciaram a intenção de implementar os seus planos nacionais
que resultam do Acordo de Paris até 2020.
O grupo dos
Pequenos Estados Insulares garantiu que irá alcançar a neutralidade de carbono
e mudar para 100% de energia renovável até 2030.
Do Paquistão à
Guatemala, da Colômbia à Nigéria, da Nova Zelândia aos Barbados, muitos países
prometeram plantar mais de 11 mil milhões de árvores.
Mais de 100
líderes do setor privado comprometeram-se a acelerar a transição das suas
empresas para a economia verde.
Um grupo
constituído por alguns dos maiores proprietários de ativos do mundo,
responsável por gerir mais de 2 biliões de dólares, prometeu mudar as suas
carteiras de ativos para investimentos neutros em carbono até 2050.
A esta iniciativa
soma-se um recente apelo de um grupo de gestores de ativos, que representa
quase metade do capital investido no mundo, cerca de 34 biliões de dólares,
para que os líderes mundiais aumentem os preços do carbono e eliminem
gradualmente os subsídios aos combustíveis fósseis e à energia do carvão em
todo o mundo.
O Clube
Internacional das Instituições Financeiras prometeu mobilizar 1 bilião de
dólares para financiar energia limpa até 2025, em 20 países menos
desenvolvidos.
Um terço do setor
bancário mundial comprometeu-se em alinhar práticas com as metas do Acordo de
Paris e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.
A Cimeira também
permitiu mostrar como as cidades e as indústrias globais, como o transporte
marítimo, podem alcançar grandes reduções nas emissões. Foram ainda destacadas
iniciativas para proteger as florestas e assegurar o abastecimento de água.
Todos estes
passos são importantes mas não são suficientes.
Desde o
início, esta Cimeira foi projetada para alertar o mundo e acelerar a ação a uma
escala mais ampla. Também serviu de palco mundial para ouvir verdades duras e
para iluminar o caminho tanto dos que estão na linha da frente, como daqueles
que não querem liderar esta ação. Os que negam ou os grandes emissores de gases
para a atmosfera não têm agora onde se esconder.
Continuarei a
incentivá-los para que façam mais e a impulsionar soluções económicas verdes em
todo o mundo.
O nosso planeta
precisa de ação a uma escala verdadeiramente global. No entanto, tal não pode
ser alcançado da noite para o dia e não pode acontecer sem o envolvimento total
daqueles que mais contribuíram para esta crise.
Se queremos
evitar o precipício climático, é necessário fazer muito mais para responder ao
apelo da ciência e reduzir as emissões de gases do efeito estufa em 45% até
2030, alcançar a neutralidade carbónica até 2050 e limitar o aumento da
temperatura a 1,5 graus até ao final do século. Só assim poderemos garantir um
futuro para o nosso mundo.
Muitos países
parecem continuar viciados no carvão apesar de existirem soluções ecológicas
mais baratas. Devemos ir mais longe na fixação do preço do carbono, garantindo
que não haverá novas fábricas de carvão até 2020 e deixando de desperdiçar o
dinheiro que os contribuintes ganham com suor e lágrimas no financiamento da
moribunda indústria dos combustíveis fósseis, que só aumenta o número de
furacões, propaga doenças tropicais e agrava conflitos.
Ao mesmo tempo,
os países desenvolvidos devem cumprir o seu compromisso de disponibilizar 100
mil milhões de dólares de fundos públicos e privados, todos os anos, até 2020,
para a mitigação e a adaptação nos países em desenvolvimento.
Com efeito, irei
certificar-me que os compromissos assumidos pelos países, pelo setor privado e
pelas autoridades locais, sejam cumpridos a partir da conferência climática da
ONU (COP25) que terá lugar em dezembro em Santiago, no Chile.
A ONU está unida
no apoio à realização destas iniciativas.
As alterações
climáticas são a questão que define o nosso tempo.
A ciência
mostra-nos que se nada for feito enfrentamos, pelo menos, 3 graus Celsius de
aquecimento global até ao final do século. Eu não estarei cá, mas minhas netas,
sim. Recuso-me a ser cúmplice na destruição do seu único lar.
Os jovens, as
Nações Unidas e um número crescente de líderes do setor empresarial, do setor
financeiro, do governo e da sociedade civil, em suma, muitos de nós, estão a
mobilizar-se e a tomar medidas. Contudo, necessitamos de muitos mais para
sermos bem-sucedidos no combate às alterações climáticas.
Temos um longo
caminho a percorrer mas o primeiro passo está dado.
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