OPINIÃO
Califórnia. De paraíso a inferno
Em plena crise corona continuamos na nossa vida
quotidiana a não considerar o determinante problema do clima com a urgência que
merece.
António Sérgio
Rosa de Carvalho
27 de Agosto de
2020, 6:06
https://www.publico.pt/2020/08/27/opiniao/opiniao/california-paraiso-inferno-1929394
Em 1970 os The
Mamas & The Papas anunciavam o paraíso da Califórnia.(1) Paraíso garantido por clima ameno e referências culturais
“mediterrânicas” residuais da antiga colonização espanhola, características largamente
apreciadas pelas classes abastadas, estrelas de cinema e também os hippies de
São Francisco.
Na tarde de
domingo/16 de Agosto de 2020 o famoso Vale da Morte na Califórnia registou a
temperatura de 130 F, ou seja 55 graus C, talvez a mais alta temperatura jamais
registada no Planeta. Ora, este local é um dos mais inóspitos do planeta,
constituído por uma paisagem de ficção cientifica.
Precisamente, nos
filmes desastres/ficção científica a ruptura do sistema através das alterações
climáticas é sempre imaginada em mega eco-cataclismos, facilmente reconhecíveis
pela Humanidade. No entanto, em plena crise corona onde podemos experimentar um
“cheirinho “de distopia, na qual todas as nossas assumidas seguranças
desaparecem instantaneamente, continuamos na nossa vida quotidiana, apesar dos
sinais progressivamente visíveis e dos avisos permanentes da classe científica,
a não considerar o determinante problema do clima com a urgência que merece.
Na Califórnia, o
Verão, devido à conjugação de altas temperaturas, seca e tempestades tropicais
transformadas em trovoadas “secas”, fontes de ignição de milhares de focos de
incêndio em áreas mais e menos remotas, transformou-a num verdadeiro inferno.
Portanto, aqui temos um exemplo concreto e nitidamente visível, digno de um
“filme-desastre” anunciador de cataclismo/distópico/global, de que a Califórnia
se está a transformar num imenso “Vale da Morte”.
Façamos uma
comparação em números do fenómeno: No mesmo período do ano passado a Califórnia
registou 4,292 wildfires nos quais arderam 56.000 hectares. Este ano o número
subiu para 7002 ‘wildfires’ nos quais arderam 1 milhão e 400 mil hectares com a
destruição de 12.000 estruturas.(2) Ora num
discurso “normal” de predicados e atractivos turísticos, é comum comparar
Portugal à Califórnia. A 13 de Outubro de 2018, aqui no PÚBLICO (3) eu afirmava “que segundo as estimativas de
alterações do clima, a Península Ibérica vai transformar-se num imenso deserto
inabitável.”
Muitos poderão
considerar esta imagem alarmista, mas basta, por exemplo, consultar a
“estratégia” esboçada por Costa e Silva para a Floresta Nacional, para ficarmos
informados sobre o rigor, a “visão” e a efectividade da qualidade planeadora do
mesmo.
Num outro artigo
aqui no PÚBLICO (4) intitulado retoricamente “Coronavírus,
o dia seguinte” eu, referindo-me à pausa distópica provocada pelo vírus,
perguntava: “Vamos, finalmente, aprender alguma coisa, parar para reflectir,
durante esta pausa a que fomos obrigados por este ‘factor externo’,
microscópica mensagem emitida pelo macro organismo onde estamos inseridos?”.
A resposta a esta
pergunta fundamental, vamos obtê-la muito brevemente no determinante resultado
das eleições americanas. Determinante para todo o mundo, quando o actual
Presidente dos EUA, simplesmente, nega categoricamente que o problema do clima
existe. Segundo ele trata-se de mais uma teoria da conspiração.
Historiador
de Arquitectura
1 - https://www.youtube.com/watch?v=N-aK6JnyFmk
3- https://www.publico.pt/2018/10/13/opiniao/opiniao/apres-nous-le-deluge-1847403
4- https://www.publico.pt/2020/03/16/sociedade/opiniao/coronavirus-dia-seguinte-1908033
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