sábado, 29 de agosto de 2020

A superioridade imoral do PCP

 


São José Almeida

OPINIÃO

A superioridade imoral do PCP

 

O PCP insiste e insiste e insiste em realizar os três dias de Festa do Avante! recorrendo a um absurdo discurso de vitimização.

 

29 de Agosto de 2020, 7:09

https://www.publico.pt/2020/08/29/politica/opiniao/superioridade-imoral-pcp-1929574

 

A “novela” começou em Maio e tem entretido muitas pessoas desde então, deixando perplexas outras tantas. O PCP tem ocupado o espaço noticioso não com reivindicações políticas de aumentos salariais ou de defesa de direitos dos trabalhadores, não com propostas e exigências de medidas para serem negociadas com o Governo e vertidas no Orçamento do Estado de 2021, nem mesmo com a apresentação de ideias que ajudem a combater a pandemia de covid-19, mas porque insiste e insiste e insiste em realizar a Festa do Avante!.

 

Contra tudo o que o bom senso indica, ao arrepio do que tem sido o comportamento de quase todos os partidos parlamentares, que praticamente suspenderam comícios, congressos, conferências, universidades de Verão, rentrées, o PCP insiste em viver num mundo à parte em que acha que pode fazer tudo. E tem feito. Aliás, um comportamento que tem sido também o do deputado único e líder do Chega.

 

Não sei se o PCP acha que o vírus SARS-CoV-2 é reaccionário e, portanto, não há risco de contaminar um verdadeiro comunista. Mas parece-me que o PCP não percebe a imagem que está a passar de si para o país, nem como se está a expor e a dar a ideia de que deixou de ser o partido institucional, responsável, sério e defensor do que entende ser o interesse público e nacional. Desde Maio, o PCP insiste e insiste e insiste em ser excepção, numa tentativa de afirmação que raia o disparate e que irá, muito provavelmente, causar-lhe sérios danos eleitorais. Esperemos que este não seja o último acto de liderança de Jerónimo de Sousa. E pior, ao insistir em manter os três dias de Festa do Avante!, no próximo fim-de-semana, o PCP está a pôr-se a jeito para vir a ser responsabilizado, na opinião pública, por eventuais aumentos de contaminados que se verifiquem em Setembro, mesmo que, por milagre, não haja um contaminado sequer dentro da Quinta da Atalaia.

 

É certo que há um precedente a que o PCP se agarrou com unhas e dentes e que responsabiliza o Presidente da República e o Governo. Trata-se da autorização, em estado de emergência, para a manifestação do 1.º de Maio da CGTP. É verdade que os direitos políticos não estavam suspensos, apenas o foi o direito à greve. Mas o bom senso aconselhava a que não tivesse sido autorizado. No entanto, realizou-se e foi uma demonstração de poder de rua que ficará na memória do país. Convém, porém, salientar que uma coisa é encher a Alameda Dom Afonso Henriques, em Lisboa, com distância de segurança, de sindicalistas treinados e experientes, outra é querer fazer as Festa do Avante!, achando que conseguem travar os contactos num evento de massas. Isto quando o PCP podia ter dado novo sinal de força, realizando o comício de encerramento da Festa do Avante! nos mesmos moldes que foi celebrado o 1.º de Maio e em que tem feito vários comícios.

 

E pior, o PCP insiste e insiste e insiste em realizar a Festa do Avante! recorrendo a um absurdo discurso de vitimização, chegando ao ponto de se achar no direito de insultar os outros. Vejamos. Primeiro, em Maio, o secretário-geral, Jerónimo de Sousa, começou por pedir: “Descansem as almas mais inquietas que isso não seria determinante para as nossas opções”, referindo-se à acusação de que mantinham a Festa do Avante! para garantir o financiamento partidário. Quando ela é, de facto, uma importantíssima fonte de receita para o PCP e permite a leitura de que, para este partido, a necessidade de arrecadar receita parece estar acima da preocupação em preservar a saúde pública.

 

Depois, o PCP atacou o líder do PSD, acusando-o de “má-fé e desonestidade”, porque Rui Rio lembrou o óbvio, os jogos de futebol continuam sem público. Isto para além de as discotecas continuarem sem poder funcionar normalmente e terem sido suspensos os festivais de Verão. E é bom não esquecer que a Festa do Avante! foi precursora deste tipo de eventos em Portugal e contém uma quantidade considerável de espectáculos.

 

Agora, o PCP vê-se a braços com uma providência cautelar, que classificou de “operação antidemocrática contra a liberdade, a cultura e os direitos dos trabalhadores e do povo”. E mantém, há semanas, negociações com a Direcção-Geral da Saúde. Começou por dizer que o evento levava cem mil pessoas por dia, depois anunciou que apontava para 33 mil, para, esta semana, continuar a insistir em que a assistência dos espectáculos possa ficar de pé, quando as regras da DGS apontam para que estejam sentadas. Levando mesmo Graça Freitas a reconhecer, na quarta-feira, que há uma real preocupação em evitar “aglomerados de pessoas”.

 

A soberba com que o PCP está a insistir e a insistir e a insistir na Festa do Avante! faz lembrar um livro inigualável na capacidade de autoconvencimento e megalomania, escrito por Álvaro Cunhal, A Superioridade Moral dos Comunistas. Só que pelos piores motivos, que provavelmente Álvaro Cunhal não subscreveria. A pandemia está a revelar a superioridade imoral do PCP.

 

P.S. – A Semana Política regressa a 3 de Outubro.

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