segunda-feira, 31 de agosto de 2020

"A Festa do Avante! é uma provocação que equivale à atitude de Trump e de Bolsonaro" // "O Governo usou a Festa do Avante! para efeitos políticos"

 


"A Festa do Avante! é uma provocação que equivale à atitude de Trump e de Bolsonaro"

 

Em entrevista publicada a 8 de agosto, Miguel Sousa Tavares criticava abertamente a edição em 2020 da Festa do Avante!. A poucos dias da realização do evento, o DN republica as suas afirmações, bem como o que fala abertamente do caso Ricardo Salgado e do tráfico de influências nos escritórios de advocacia.

 

João Céu e Silva

31 Agosto 2020 — 15:19

https://www.dn.pt/cultura/a-festa-do-avante-e-uma-provocacao-que-equivale-a-atitude-de-trump-e-de-bolsonaro-12505118.html?fbclid=IwAR17QIIq2WJWr7TOINScN6bhXXuqGTyVegcHZ9slU5SZLoXTjQ4lAqYqTbE

 

Para o jornalista, escritor e comentador, a Festa do Avante! é uma provocação que equivale à mesma atitude de Trump e de Bolsonaro ao se recusarem a usar máscaras, querendo significar que não se passa nada de estranho devido à covid-19 nos seus países e por isso diz: "Um só infetado que resulte desta festa é diretamente imputável à direção do PCP."

 

No que respeita ao grande caso na justiça mais recente, o da acusação a Ricardo Salgado, considera que a acusação do Ministério Público é forte e não só pela quantidade de crimes que apresenta: "É pela capacidade de os provar depois e aí parece-me que tem uma acusação sólida e fundamentada. Não sei se em tudo ou numa parte, mas alguma coisa se há de conseguir provar em tribunal." Diferente é o caso Sócrates, que se suporta em "deduções sem provas" e "é baseada numa testemunha comprada pelo Ministério Público". Acrescenta que a única coisa certa é que vivia à conta de um amigo: "Mas isso não é crime. Pode ser, eventualmente, uma situação pouco digna para um primeiro-ministro."

 

Quanto à situação política pós-quarentena, confessa que ainda não percebeu se o hipotético reativar da geringonça não é uma tentativa para António Costa "forçar uma resposta negativa dos partidos à esquerda e virar-se para o PSD". O mesmo pensa de Rui Rio "a fingir um entendimento com o Chega para se encostar ao PS".

 

Sobre a pandemia, garante que nunca acreditou que os portugueses "se fechassem em casa como aconteceu" e vê na missa que o Papa rezou sozinho na Praça de São Pedro a melhor imagem dos tempos da covid-19. Uma entrevista em que tanto existe o escritor como o comentador.

 

Surpreendeu ao mudar de editora e o primeiro livro a ser reeditado é Rio das Flores, num tempo em que os leitores pouco vão às livrarias. O que se passa com os portugueses?

A pandemia tirou 80% dos leitores das livrarias e a queda da venda de livros sentiu-se sobretudo aí. Era expectável que com mais gente em casa houvesse mais leitura e encomendas online, isso não aconteceu infelizmente e o que se passa é resultado da maldição das redes sociais, que levam as pessoas a achar que em termos de informação e de ficção, ou de tudo o que é cultura, são suficientes. Isso acontece também nas séries de TV, em que estamos a assistir a um fenómeno em que uma grande parte dos escritores trabalham para essas séries, assim como há cineastas que deixaram de fazer filmes e optam por séries diretamente. Ou seja, as pessoas têm cada vez menos capacidade de aderir a uma cultura que lhes exige algum esforço e ainda chegará a vez de os museus poderem ser apenas visitados virtualmente.

 

Não se sentiu tentado pelas redes sociais para evitar a solidão provocada pela covid?

Não, de todo, pelo contrário. Se alguma lucidez era preciso manter, para mim foi distanciar-me das redes sociais. Aliás, cada vez mais agradeço a minha capacidade de ter adivinhado há muitos anos o que iriam fazer deste admirável mundo novo. Criou-se um pesadelo e vou ficar longe dele eternamente.

 

Este seu romance é um relato histórico que se segue a Equador, com o fim da monarquia, a República, a ascensão de Salazar e a luta do brasileiro Luís Carlos Prestes. Se as lições da história são na maior parte das vezes ignoradas, será a literatura a boa forma de alertar o cidadão para o que não se deve repetir?

Acho que sim e o Rio das Flores apanha um período determinante do Estado Novo brasileiro e do português - que são politicamente distintos -, além da Guerra Civil Espanhola, da ascensão do nazismo na Alemanha e a ditadura no Brasil, que é muito desconhecida dos portugueses. Acho que a história é sempre uma lição, não por se repetir fatalmente, mas porque muitas das coisas que nos ensinou tendem a aparecer sob outra forma, afinal os seus genes da humanidade estão lá inscritos. Há lições boas e outras más, mas saber ao que certos acontecimentos conduziram no passado é uma arma para evitar repetições no futuro.

 

A dado momento refere no romance a sedução de Hitler pelo marxismo e o socialismo...

O Partido Nazi começou por se chamar Socialista, ou seja, havia uma atração do Hitler pelo socialismo pois as suas teorias eram muito fundadas na capacidade do autoritarismo e na muita disciplina e controlo das massas, daí achar que o socialismo era bom para o conseguir. Além disso, Hitler era na sua génese muito anticapitalista, embora depois se tenha apoiado numa dinastia capitalista fortíssima na Alemanha, os Krupp.

 

Vamos a caminho dos 50 anos do 25 de Abril a grande velocidade e a sociedade portuguesa confronta-se com casos de corrupção, talvez os maiores de sempre. A revolução serviu os propósitos ou ficou pelo caminho?

Essa pergunta exige muita cautela na resposta... Primeiro, não temos mais casos de corrupção do que outras democracias, por exemplo a francesa ou a espanhola. O que aconteceu agora com o rei de Espanha é inominável e se acontecesse com um Presidente português estaríamos de rastos. Segundo, já ninguém - a imprensa também - se dá ao trabalho de presumir a inocência daqueles que o Ministério Público apresenta na praça pública apenas como acusados, sem direito a contraditório, em muitos casos da justiça em Portugal. As pessoas já estão condenadas, nem se espera por ouvir a sua defesa. Neste aspeto iremos ter muitas surpresas quando certos processos forem a julgamento, pois há alguns que vão ser completamente desmantelados em tribunal. Terceiro, confunde-se muito na opinião pública, e deliberadamente, a corrupção com tráfico de influências.

 

"Acho que Rui Rio está a fazer o mesmo que o António Costa à esquerda, que é fingir o entendimento com o Chega para ganhar espaço de manobra e depois encostar-se ao PS. O Costa faz o mesmo para depois se encostar ao PSD."

 

Está mais generalizado?

O grande crime que existe a nível de contágio entre a política e a economia é o tráfico de influências, muito mais do que a corrupção. É um crime à solta na vida pública e que é muito difícil de combater até porque tem uma fachada legal e passa-se abundantemente nos escritórios de advocacia em Portugal.

 

Refere-se aos casos Sócrates e Ricardo Salgado?

Conheço mal o caso Ricardo Salgado, mas parece-me mais sólido e ancorado em termos de acusação. O caso Sócrates tem imensas falhas em termos de acusação, nomeadamente na relação que se faz entre ter sido corrompido pelo grupo BES. Eu li a acusação desse caso e, em grande parte, para não dizer na totalidade, é baseada em presunções e deduções que não assentam em factos. Além de que tudo o que se baseia em factos no caso Sócrates se deve a uma testemunha comprada, o Hélder Bataglia. A única acusação que se baseia num testemunho ou num facto é, verdadeiramente, um testemunho comprado, e nem sequer é de delação premiada, o que nem existe no direito penal português. A explicação é simples: Bataglia tinha um mandado de captura internacional da República Portuguesa e não podia sair de Angola; foi negociado com ele levantar o mandado em troca de ir dizer o que o Ministério Público queria. Portanto, em condições normais, o advogado desfaz aquela acusação no tribunal. No caso Sócrates vai ser muito difícil obter a sua condenação em tribunal, se bem que também seja difícil que os juízes devido à pressão de uma condenação que é feita na imprensa e na opinião pública se atrevam a não o condenar.

 

No caso Ricardo Salgado, a acusação do Ministério Público é forte: 65 crimes!

Não é o número de crimes que torna a acusação forte, antes a capacidade de os provar depois, e aí parece-me que têm uma acusação mais sólida e fundamentada. Feita em colaboração com as autoridades suíças, baseia-se numa grande quantidade de documentos e, de facto, há dinheiro que desapareceu. Isso é incontestável. Portanto, alguma coisa, não sei se tudo ou se uma parte, o Ministério Público há de conseguir provar em tribunal. Mas eu não a li a acusação, porque é direito financeiro e está além da minha paciência lê-la. Diferente é o caso Sócrates, que são deduções sem provas. A única coisa que sabemos por certo é que vivia à conta de um amigo, é confessado pelo próprio, mas isso não é crime. Pode ser, eventualmente, uma situação pouco digna para um primeiro-ministro. E toda a a tese do Ministério Público assenta em dois pressupostos: o dinheiro de Carlos Santos Silva era de facto de Sócrates e que todo esse dinheiro vinha de corrupção. Agora, como se diz em latim: quod erat demonstrandum; falta fazer a prova disso e essa não está nos autos

 

Voltando à pergunta inicial: a revolução serviu os seus propósito ou ficou pelo caminho?

Serviu se nos lembramos dos três "D": a descolonização foi tão tarde e era difícil ter corrido melhor; a democratização aconteceu sem dúvida alguma; o desenvolver também pois tivemos a ajuda inestimável da Europa e se fizermos as contas ao que cada cidadão português recebeu em dinheiros europeus é uma quantia brutal. Se, infelizmente, andámos para trás nos comparativos com a Europa daquela altura em relação ao que estávamos e somos ultrapassados de longe por esses países, a culpa é nossa. É uma culpa coletiva e não do ministro A ou B; de todos porque desperdiçámos ou usámos mal as ajudas. Eu sou um grande crítico da posição dos holandeses sobre Portugal, mas também os compreendo quando parte dos seus impostos são dados a quem não sabe usá-los.

 


"O Governo usou a Festa do Avante! para efeitos políticos"

 

Miguel Sousa Tavares acusa o Executivo socialista de "chamar o PCP às negociações sobre o Orçamento" do Estado para 2021. O comentador deixou ainda severas críticas aos comunistas, concluindo que a Festa do Avante! irá custar votos ao partido.

 

Notícias ao Minuto

31/08/20 23:51 HÁ 7 HORAS POR MAFALDA TELLO SILVA

POLÍTICA MIGUEL SOUSA TAVARES

https://www.noticiasaominuto.com/politica/1574271/o-governo-usou-a-festa-do-avante-para-efeitos-politicos?utm_medium=social&utm_source=facebook.com&utm_campaign=buffer&utm_content=geral&fbclid=IwAR09vvbDio0SED_qWrButvfRWmOmpQJHq48RX_KhbRCKCdA4mQqmhyiMTuc

 

 

No dia em que foram divulgadas as medidas sanitárias impostas pela Direção-Geral da Saúde (DGS) para a Festa Avante! e revelado o plano de contingência do PCP para o evento, Miguel Sousa Tavares defendeu que "transparece a ideia de que o Governo usou a Festa do Avante! para efeitos políticos", designadamente, para "chamar o PCP às negociações sobre o Orçamento" do Estado para 2021.

 

 

No seu espaço habitual de comentário no Jornal das 8, na TVI, o ex-jornalista começou por apontar que a DGS "esteve muitíssimo mal" e que passou a ideia de que só divulgou esta segunda-feira "excepcionalmente" o parecer sobre o evento comunista devido à pressão exercida por Marcelo Rebelo de Sousa.

 

"As regras aplicadas ao Avante! eram secretas e ninguém sabe porquê", atirou o comentador, reiterando que a autoridade de saúde "andou muito mal".

 

Mais, para Sousa Tavares, a realização do Avante! sob as orientações agora reveladas deixa "o próprio partido entalado". "Planearam para uma dimensão e afinal têm outra", argumentou, referindo-se à diminuição para cerca de metade da lotação prevista pelo PCP, que incialmente tinha apontado para 33 mil pessoas e que agora viu a entrada para o evento reduzida para cerca de 16.500 participantes.

 

Quanto à posição manifestada pelos comunistas, Sousa Tavares considerou que o partido demonstrou uma "absoluta falta de senso de previsão política": "Isto vai-se virar contra o partido (...) Vê-se pela própria população do Seixal", que já garantiu que irá fechar portas de vários estabelecimentos comerciais e de restauração durante o próximo fim de semana.

 

"Vai-lhe [PCP] custar votos, popularidade e prestígio", conjecturou.

 

A 44.ª edição da Festa do Avante!, que se realiza entre 4 e 6 de setembro, só vai ter lugares sentados nos diversos espetáculos, incluindo no maior e principal palco denominado 25 de Abril, segundo o Plano de Contingência esta segunda-feira divulgado pelo PCP.

 

A organização da Festa do Avante! "tem a responsabilidade" de aplicar várias medidas para reduzir o risco de infeção e para a saúde pública por propagação da doença Covid-19 durante o evento, afirma o parecer da DGS esta segunda-feira divulgado.

 

No seu parecer técnico sobre a realização da Festa do Avante! deste ano, a DGS refere que a tipologia do evento "acarreta diferentes riscos" e a organização "tem a responsabilidade de aplicar medidas de redução de risco e de cumprir, promover e garantir o cumprimento da legislação vigente aplicável, bem como das normas, orientações e recomendações da DGS, durante todo o período de duração do evento, atendendo ao risco existente de infeção por Sars-Cov-2 e ao risco para a saúde pública por propagação da doença Covid-19".

Sem comentários: