terça-feira, 30 de junho de 2020

TAP vai ser nacionalizada. Privados chumbam proposta do Governo em conselho de administração da companhia / A TAP e a política de “mão estendida”

TAP será nacionalizada se privados não aceitarem proposta do Estado

As negociações têm sido muito difíceis, marcadas por uma enorme divergência entre o Governo e os accionistas privados. O PÚBLICO apurou que se as negociações falharem em definitivo a nacionalização é o passo seguinte. E no Parlamento o ministro Pedro Nuno Santos disse: “Faremos intervenção mais assertiva do Estado se o privado continuar a não aceitar.”

Ana Sá Lopes e Ana Brito 30 de Junho de 2020, 10:42 actualizada às 13:02

Os accionistas privados da TAP chumbaram na segunda-feira à noite a proposta que o Estado lhes apresentou para aceder ao empréstimo já aprovado por Bruxelas. As negociações continuam, mas se falharem em definitivo a nacionalização é o passo seguinte, apurou o PÚBLICO.

O ministro das Infra-estruturas, Pedro Nuno Santos, disse esta terça-feira, no Parlamento, que vai apresentar proposta ao parceiro privado e que espera que seja aceite, se não o Estado avança para “intervenção mais assertiva”. “Se o privado não aceitar as condições do Estado português, nós teremos de intervencionar a empresa, nacionalizar a empresa”, reconheceu o ministro. A alternativa era deixar cair a TAP ou ceder ao privado, “não vamos fazer nem uma coisa nem outra”, sublinhou o governante.

Pedro Nuno Santos, que está a ser ouvido esta terça-feira na Assembleia da República, na comissão parlamentar de Economia, Inovação, Obras Públicas e Inovação, revelou que as condições propostas pelo Estado para ajudar a TAP foram chumbadas na segunda-feira, dia 29 de Junho, em reunião do conselho de administração da transportadora.

A proposta foi aprovada pelos seis administradores que representam o Estado, mas os outros seis administradores que representam o consórcio Atlantic Gateway abstiveram-se, explicou Pedro Nuno Santos em resposta à deputada do Bloco de Esquerda Isabel Pires.

Como necessitava da aprovação de oito administradores, a proposta foi chumbada, adiantou. “Deve ser isso que justifica as notícias que hoje estão a sair”, sobre a nacionalização da TAP, disse o ministro, referindo-se à notícia avançada pelo Expresso esta manhã.

Pedro Nuno Santos explicou que o Governo ainda vai “submeter a proposta ao parceiro privado e que espera que ela seja aceite”. Se não for, a alternativa é que seja “acordada uma saída” que “traga paz à TAP e garanta que não haja litígios futuros”.

“Faremos uma intervenção mais assertiva do Estado [na TAP] se o privado continuar a não aceitar” a proposta do Estado para injectar 1200 milhões de euros na TAP. Depois o accionista privado “terá todo o direito de defender a sua posição”, disse Pedro Nuno Santos, sem detalhar mais.

“A TAP é demasiado importante para o país a deixar cair”, sublinhou o ministro. A TAP tem de “responder a necessidades de mercado e às necessidades nacionais” de ligação aos países com relações históricas, com comunidades de emigrantes e com relações económicas relevantes. “Isso só se faz quando temos influência e por isso é que é tão importante para nós a intervenção”, acrescentou.


O consórcio privado Atlantic Gateway, de David Neeleman e Humberto Pedrosa detém 45% do capital da TAP, mas controla a gestão da companhia. O Estado, com 50%, e os trabalhadores, controlam os restantes 5%.

Prejuízos de 395 milhões
Depois do empréstimo de emergência à TAP ter sido aprovado por Bruxelas a 10 de Junho, na segunda-feira David Neeleman, um dos accionistas, veio, em comunicado, garantir “o empenho dos privados” na companhia aérea e agradeceu “muito” o empréstimo do Estado, afirmando que os privados aceitavam a entrada do Estado na comissão executiva da TAP.

“Apesar de não ter sido essa a nossa proposta, agradecemos muito o apoio do Estado português através de um empréstimo de emergência à TAP e aceitamos obviamente as medidas de controlo da utilização desse empréstimo”, escreveu Neelman. À noite os privados chumbavam a proposta do Estado.

A TAP registou prejuízos de 395 milhões de euros no primeiro trimestre do ano deste ano. Os resultados foram afectados “por eventos relacionados com a pandemia”, como o reconhecimento de encargos com a cobertura de risco de combustível (150 milhões) e por diferenças cambiais negativas (100 milhões).

Contudo, “excluindo estes dois efeitos”, os resultados líquidos da transportadora teriam igualmente sido negativos em 169,9 milhões de euros (que comparam com perdas de 107 milhões no mesmo trimestre de 2019)

“Seria um desastre o país perder a TAP. Quem acha que não, não percebe patavina”, diz Pedro Nuno Santos
Rita Neto
10:23
O ministro das Infraestruturas e da Habitação está a ser ouvido no Parlamento, no dia em que o Expresso avança que a TAP vai ser nacionalizada dada a falta de acordo entre o Estado e os privados.
Pedro Nuno Santos está a ser ouvido esta terça-feira na Comissão de Economia, Inovação, Obras Públicas e Habitação, sendo que um dos temas quentes será a TAP. Isto porque, minutos antes de a audição arrancar, o Expresso avançou que a companhia aérea 


TAP vai ser nacionalizada. Privados chumbam proposta do Governo em conselho de administração da companhia
Rita Neto e António Costa
10:06

A TAP vai ser nacionalizada porque os privados não aceitam as condições impostas pelo Governo. Neste momento, decorre assembleia geral da empresa e está a ser feito último esforço para haver acordo.

ATAP vai ser nacionalizada, avança o Expresso e confirmou o ECO junto de fontes que conhecem as negociações. Depois de um conselho de administração da companhia aérea ao longo da tarde e noite de segunda-feira, a proposta com as condições exigidas pelo Estado para avançar com um empréstimo até 1.200 milhões de euros foi chumbada pelos administradores indicados pela Atlantic Gateway de David Neeleman e Humberto Pedrosa. E agora só um volta-face de última hora poderá impedir a publicação do decreto de nacionalização, que deverá suceder provavelmente já amanhã.

A Atlantic Gateway, que tem 45% da TAP, rejeitou as condições esta segunda-feira à noite o empréstimo de até 1.200 milhões de euros que o Estado português ia fazer. Empréstimo esse ao qual até a Comissão Europeia já tinha dado luz verde. E a principal razão está na exigência do Governo de que 217 milhões de prestações acessórias dos privados passem a capital social, condição que David Neeleman não aceita.

Neste momento, sabe o ECO, decorre uma assembleia geral de acionistas da TAP e está a ser feito um último esforço, incluindo da parte de Humberto Pedrosa, para convencer o sócio David Neeleman a aceitar as condições do Estado que permitiriam evitar a nacionalização. “Ainda temos o dia de hoje para tentar ultrapassar este impasse”, disse ao ECO uma fonte que acompanha as negociações.

A solução para evitar uma nacionalização poderia também passar por uma recompra da posição acionista de David Neeleman, mas o empresário exigiu 65 milhões de euros, o que foi considerado inviável pelo Governo.

O ECO contactou o Ministro das Infraestruturas e Habitação, que remeteu esclarecimentos para a audição de Pedro Nuno Santos, que está a decorrer esta manhã na Comissão de Economia, Inovação, Obras Públicas e Habitação. Já fonte oficial da transportadora aérea diz desconhecer esta informação, uma vez que não integram as negociações.

EDITORIAL
A TAP e a política de “mão estendida”

Colocada fora de questão a nacionalização ou a falência, a sobrevivência da TAP só aconteceria se quem paga a conta escolhesse o menu.

MANUEL CARVALHO
30 de Junho de 2020, 6:44

O lamentável folhetim da TAP está prestes a chegar ao fim com o epílogo que se adivinhava: com o triunfo da lei do mais forte. Após meses de resistência, os accionistas privados foram forçados a capitular e o Estado prepara-se para garantir a capitalização na condição de senhor absoluto. Já se sabia que ia ser assim porque nestes jogos manda quem tem o controlo do dinheiro e obedece e agradece quem dele depende para sobreviver.

Mas esta constatação não tinha de demorar tanto tempo a acontecer. Entre a bizarra tentativa dos privados em obter capital para manter tudo como estava e a atitude do Estado que os quis vergar à condição de mendigos, entre o tempo que se levou a apresentar um pedido à Comissão Europeia e os incompreensíveis lamentos da administração sobre uma possível “injustiça”, perdeu-se tempo, a TAP desvalorizou-se e os cidadãos foram obrigados a assistir um filme algures entre o western-spaghetti e o drama passional.

Não tinha de ser assim e só o foi porque entre o ministro Pedro Nuno Santos e David Neeleman, Humberto Pedrosa e Antonoaldo Neves se foi acumulando nos últimos anos um clima de mal-estar insuportável. Na troca de argumentos, todos tiveram a sua parte de razão, que é o mesmo que dizer que todos tiveram uma parte nas responsabilidades.

A TAP era, antes da pandemia, uma empresa com mais futuro, mas dera saltos imponderados; a TAP era comandada por privados, mas o Estado tinha mais capital; a TAP tinha gestão privada, mas, como é natural, o Estado exige-lhe a prestação de serviços públicos. Numa circunstância normal, os choques poderiam passar despercebidos. Numa crise grave, tinha de haver ajuste de contas.

Colocada fora de questão a nacionalização ou a falência, a sobrevivência da TAP só aconteceria se quem paga a conta escolhesse o menu. Não sabemos se a reestruturação imposta pela Comissão Europeia era mesmo inevitável ou se Pedro Nuno Santos teve um papel nessa imposição, ao sugerir que a empresa estava em crise antes da crise.

Sabemos, sim, que em tudo o resto, e no geral, o ministro fez o que tinha de fazer: exigiu que os empréstimos dos accionistas à TAP ficassem no capital da empresa; determinou que, com a ajuda, o Estado tinha de entrar no conselho executivo; e impôs que os créditos do Estado que não forem pagos se transformarão em capital.

Tudo, portanto, acabou por correr como era inevitável. O que se lamenta é que a salvação da companhia não se tivesse feito de forma mais pacífica e natural.

tp.ocilbup@ohlavrac.leunam

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