A Ryanair devia simplesmente ir à falência.
OVOODOCORVO
AVIAÇÃO
Michael O’Leary: “Vai ser muito difícil a TAP cumprir
condições” do apoio estatal
Presidente do grupo Ryanair considera que o dinheiro a
injectar na TAP “seria melhor distribuído através das várias companhias aéreas
que operam em Portugal em proporção do seu contributo para a conectividade do
país”.
Luís Villalobos
Luís Villalobos
23 de Junho de 2020, 6:30
A trabalhar no
sector há mais de 30 anos, o presidente do grupo Ryanair, Michael O’Leary, diz
que apoios estatais, como os empréstimos feitos à Air France e à Lufthansa,
distorcem a concorrência e que se devia antes suspender impostos e taxas a
todas as companhias, “na proporção do seu contributo para a conectividade
aérea”. Em respostas por escrito, diz que no actual panorama haverá “uma
recuperação rápida dos níveis de tráfego à boleia de tarifas baixas. As
companhias de bandeira vão “oferecer preços abaixo do custo nos próximos anos”
e as tarifas do grupo que lidera, conhecido por apostar no baixo custo, “terão
de ser mais baixas para competir e sobreviver”. Essa estratégia tem
repercussões imediatas ao nível do número de trabalhadores e salários, com a
perspectiva de corte de cerca de três mil trabalhadores, incluindo Portugal,
onde o Sindicato Nacional do Pessoal de Voo da Aviação Civil (SNPVAC) já veio
falar em tentativas de acordo “ilegais”. Sobre esse tema, Michael O’Leary, de
59 anos, diz que apela “à participação” dos trabalhadores e sindicatos para
“diminuir a perda de empregos e o encerramento de bases”.
Tem criticado os
apoios estatais às companhias aéreas, como os que já envolveram a Iberia, Air
France e Lufthansa. Porquê? Não é esta uma conjuntura extraordinária, do ponto
de vista negativo, que atingiu fortemente tudo e todos?
Nós opomo-nos a
qualquer ajuda de Estado que seja opaca e discriminatória. Operações de
salvamento massivas, compostas por muitos milhares de milhões de euros, a um
punhado de companhias aéreas nacionais, são regressivos, injustos e ilegais
numa crise que, como refere, afectou tudo e todos. O panorama do sector aéreo
vai ser distorcido pelos mais de trinta mil milhões de euros que, a nível
estatal, estão a ser entregues ao grupo Lufthansa, Air France-KLM, SAS e
Finnair, entre outros. Este tipo de ajuda discriminatória vai prejudicar o sector
europeu de aviação e os danos no mercado único vão ser sentidos muito tempo
após a pandemia ter passado.
Tem falado,
proactivamente, com diversos órgãos de comunicação social para mostrar o seu
ponto de vista contrário aos apoios de Estado. Porquê esta iniciativa? Qual o
objectivo?
Estes são tempos
sem precedentes. A covid-19 tem sido uma catástrofe para todas as companhias
aéreas e os governos devem aplicar medidas para ajudar à recuperação do tráfego
de forma transversal ao sector. O mecanismo de apoio mais justo seria o de
suspender, reduzir ou adiar os impostos na aviação e as taxas de aeroporto e de
controlo aéreo, beneficiando assim todas as companhias áreas na proporção do
seu contributo para a conectividade aérea na Europa. Em vez disso, governos
ricos estão a distorcer as regras do jogo ao entregar mais de trinta mil
milhões de euros a um punhado de companhias áreas que asseguram menos de 30% da
conectividade a nível europeu. Isto é mau para a concorrência e mau para os
consumidores, numa altura em que a economia europeia precisa de voos directos a
preços acessíveis para as várias regiões, algo que apenas as companhias aéreas
com tarifas baixas podem disponibilizar.
A Ryanair não
recebeu nem um cêntimo de apoios estatais?
A Ryanair não
recebeu qualquer ajuda discriminatória. Acedemos a mecanismos de apoio para o
pagamento de salários em vários países, acessíveis a todas as companhias
aéreas, e aproveitámos o financiamento do Reino Unido ligado aos efeitos da
covid-19, que está disponível para todas as empresas que contribuam para a
economia britânica.
Queremos
condições idênticas para todos. Não somos uma companhia aérea nacional [de
bandeira], somos uma verdadeira companhia aérea europeia, e sempre reagimos às
crises sem apoios estatais. O nosso instinto numa crise é sempre o de inovar,
reduzir os custos e as tarifas, procurar novas rotas e crescer ao nível do
tráfego.
Sem apoios
estatais, vão cortar empregos, reduzir a frota e as rotas, bem como fechar
algumas bases, certo? A perspectiva é a de despedir cerca de 3000
trabalhadores, o equivalente a 15% da vossa força de trabalho…
Desde o início da
pandemia, implementámos uma série de medidas para preservar dinheiro e reduzir
os custos. Estamos a trabalhar com os nossos funcionários e com os seus
sindicatos a nível europeu, bem como com os nossos fornecedores, para baixar
custos de modo a conseguir responder a este novo contexto e sobreviver numa
realidade de concorrência distorcida. Estamos a negociar reduções de salários
com os sindicatos de modo a ajudar a reduzir de forma significativa o número de
3000 potenciais despedimentos e apelamos à sua participação para diminuir a
perda de empregos e o encerramento de bases.
Isso não seria
evitável se a Rynair recebesse apoios estatais?
Há uma crescente
oposição na Europa à defesa, por parte da Alemanha, França e Holanda, dos seus
“campeões nacionais”, incluindo companhias aéreas, com resgates massivos.
Outros governos europeus simplesmente não se podem dar ao luxo de efectuar esse
nível de gastos. A forma de ajudar as companhias aéreas sem distorcer o mercado
único é ajudar a recuperação do tráfego de maneira justa e transparente. Isso
protegeria empregos e a conectividade, em benefício da indústria de turismo da
Europa.
Acha que a sua
empresa fica em desvantagem face aos concorrentes que receberam apoios? Há quem
considere que a Ryanair pode ter vantagens, porque com a sua política de cortes
conseguirá ter mais margem de manobra para recuperar passageiros com base numa
política agressiva de tarifas… e pode aproveitar as exigências impostas por
Bruxelas à Lufthansa, como é o caso das slots no aeroporto de Frankfurt, ou
não?
Lufthansa, Air
France-KLM e Alitalia, entre outras, receberam muitos milhões dos seus
governos, o que distorce a concorrência e coloca a Ryanair, a Easyjet e a Wizz
em desvantagem. A Comissão Europeia deu luz verde aos sete mil milhões de euros
de apoio à Air France sem impor condições e os nove mil milhões de euros para a
Lufthansa foram autorizados numa sexta-feira à noite depois de a Alemanha ter
feito pressão para que a Comissão exigisse apenas um compromisso simbólico por
parte da Lufthansa e que nada faria para restringir os seus instintos
anti-concorrenciais. Vamos enfrentar uma concorrência intensa a nível europeu,
com as companhias de bandeira a oferecer preços abaixo do custo nos próximos
anos, e as nossas tarifas terão de ser mais baixas para competir e sobreviver.
Como será o
mercado este ano, e no próximo?
Esperamos uma
recuperação rápida aos níveis de tráfego de 2019 à boleia de tarifas baixas. Em
termos de preços, [a recuperação] vai demorar um pouco mais, cerca de dois a
três anos.
Vai-se assistir
ao fim de muitas companhias aéreas? E, se sim, quem vai ocupar o seu espaço? A
Ryanair? As companhias de bandeira?
Já assistimos a
várias falências no sector, como a Flybe no Reino Unido. É inevitável que mais
pequenas companhias aéreas desapareçam.
O que é que vai
mudar na forma como viajamos?
Vamos assistir a
um regresso gradual à normalidade. Após quatro meses de restrições necessárias,
é altura de colocar a Europa a voar outra vez, de salvar o que resta da época
de Verão, de reunir amigos e famílias e de relançar a indústria de turismo
europeia, que é responsável por imensos postos de trabalho. Precisamos de nos
adaptar a uma nova realidade, e todos devem fazê-lo de forma responsável,
através do uso de máscaras, da introdução de controlos de temperaturas nos
aeroportos e da redução das interacções entre pessoas quando for possível.
No caso de
Portugal, qual vai ser o nível de redução da operação? Quantas pessoas emprega
actualmente e quantas poderão ser despedidas? Vão fechar, ou não, alguma base,
como a de Faro?
Estamos a
trabalhar com os nossos funcionários e com os sindicatos a nível europeu em
medidas de emergência para responder a esta nova realidade, incluindo a perda
de até 3000 postos de trabalho e a redução temporária de 20% dos pilotos com
salários mais altos e de 10% para os tripulantes de cabine. Apelamos ao
envolvimento dos sindicatos e dos funcionários, de modo a mitigar a perda de
empregos em Portugal.
Como vê os apoios
públicos que estão a ser preparados para a TAP? Neste caso, o Estado até é dono
de 50% do capital…
Vai ser muito
difícil para a TAP conseguir cumprir com as condições do programa, uma vez que
tem de pagar os [até] 1,2 mil milhões de euros do empréstimo em seis meses ou
apresentar um plano de reestruturação. Já assistimos a esta situação com a
Alitalia. Acabam por nunca pagar o empréstimo nem reestruturar devidamente a
empresa, pelo que continuam a ser resgatadas pelo Estado. O dinheiro que o
Governo português vai gastar na TAP seria melhor distribuído através das várias
companhias aéreas que operam em Portugal em proporção do seu contributo para a
conectividade do país.
Anunciaram
recentemente que vão restabelecer cerca de 120 rotas envolvendo Portugal a 1 de
Julho. Quantas eram antes da covid-19? Alguma vez pensam voltar a esse nível
anterior?
Recuperámos mais
de 90% da rede de rotas em Portugal e esperamos voltar aos níveis pré-covid num
futuro próximo.
E ao nível de
frequências, quantas eram e quantas serão a 1 de Julho?
Planeámos operar
mais de 400 frequências a partir de 1 de Julho, contras as 650 frequências que
tínhamos planeado para o Verão antes da pandemia.
tp.ocilbup@sobolalliv.siul
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