Empresa holandesa só emprega trabalhadores portugueses
nas suas estufas em Odemira
Esta opção contraria o argumento dos empresários
agrícolas que se queixam da dificuldade em recrutar mão-de-obra local por fazer
demasiadas exigências e não querer trabalhar.
Carlos Dias
5 de Janeiro de
2018, 8:00
Os empresários
agrícolas portugueses que investem na produção intensiva em estufas e túneis de
plástico ou vidro no concelho de Odemira insistem em contratar estrangeiros
alegando que os locais não se sujeitam aos salários e aos ritmos de trabalho
impostos por um modelo que requere mão-de-obra intensiva em certas alturas do
ano. Mas há excepções: uma empresa holandesa não poupa elogios aos portugueses
e é com eles, e só com eles, que conta.
A opção por
mão-de-obra estrangeira acabou por alterar a realidade social e demográfica do
concelho de Odemira. A freguesia de S. Teotónio já é considerada a “capital da
Bulgária em Portugal”. Dos cerca de 6000 habitantes, quase metade são
estrangeiros. E em cada cinco bebés, só um é de pais portugueses.
Gil Oliveira,
proprietário de uma exploração de framboesas, justificava ao PÚBLICO em 2015
que a contratação de estrangeiros se deve ao facto da mão-de-obra portuguesa
“ser, em média, mais fraca”. E avançou com um exemplo: em média, a recolha dos
pequenos frutos ronda os 4,5 quilos por hora e por pessoa “mas as mulheres
búlgaras conseguem colher entre seis a sete quilos”, salientando ainda a
necessidade que têm de laborar aos fins-de-semana nas épocas da colheita.
Como a
mão-de-obra local, dizem, não se adapta a ritmos de trabalho que chegam a durar
12 horas e a temperaturas que superam os 30º graus na época da apanha,
contratam-se búlgaros, tailandeses, vietnamitas, nepaleses, romenos,
brasileiros e naturais do Bangladesh.
A excepção vem de fora
No entanto, há
pelo menos um exemplo que contraria o preconceito em relação à mão-de-obra
local. A empresa Amigo Plantas Portugal, na herdade dos Arneirinhos, que se
dedica ao cultivo e tratamento de plantas suculentas no lugar de Cavaleiro,
freguesia de S. Teotónio é propriedade do empresário holandês Gerard Van
Langen. Foi adquirida há quatro anos, tem 20 hectares de área, mas apenas 3,5
hectares têm estufas para “preservação dos valores ambientais do Parque Natural
do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina”, justifica o empresário holandês.
Trabalham na cultura das plantas cerca de meia centena de portugueses,
“enquanto outros permanecem inscritos numa lista na expectativa de poderem ser
chamados”, assinala a agrónoma Teresa Traquina, portuguesa e responsável técnica
da exploração.
Gerard Van Langen
explica que os trabalhadores “ganham acima da média” e têm trabalho para o ano
inteiro. A sua formação é determinante. Teresa conta o caso de um jovem do
Cavaleiro que depois de um período de aprendizagem executou todos os sistemas
de irrigação existentes nos 3,5 hectares de estufas e agora é responsável pelo
seu funcionamento. O mesmo acontece com os serviços de contabilidade e de
gestão atribuídos a funcionários locais e “em quem Gerard deposita toda a
confiança”, observa jovem técnica.
O empresário
holandês esclarece que a contratação de trabalhadores locais está vinculada à
vontade de fazer parte da comunidade: “Gostamos de aqui estar, não apenas pelo
negócio, mas sobretudo pelos amigos que vamos fazendo com um sorriso na cara”.
Diz ter boas razões para acreditar na competência dos portugueses, dedicação e
sobretudo “vontade de trabalhar”.
Tudo comprado em Portugal
Desde que chegou
a Odemira, o empresário holandês já investiu mais de dois milhões de euros,
praticamente sem apoios da banca e do Estado português. Gerard explica que
“todo o material necessário para a produção das suculentas, turfa,
fertilizantes, material de rega e de estufas, as reparações, as viaturas, os
serviços necessários ao nosso funcionamento” é adquirido em Portugal e boa
parte na própria região.
A empresa tem 130
trabalhadores nas suas plantações de suculentas dispersas pela Holanda e em
Odemira. Produz mais de 450.000 exemplares por semana que vende a mais de mil
clientes, que inclui as grandes superfícies comerciais como o Aldi, Lidl,
Carrefour, Tesco e Ikea. Todas as semanas partem do Cavaleiro rumo à Holanda
três a quatro camiões TIR, carregados de suculentas que depois seguem para o
mercado mundial, incluindo Portugal. Dali saem cerca de 80 variedades
diferentes.
As plantas nascem
no Quénia, onde são recolhidas as estacas. Estas são enviadas para a exploração
no Cavaleiro, perto do oceano, onde Gerard Van Langen diz ter encontrado as
condições ideais para as suculentas iniciarem o seu crescimento. “Elas gostam
de sol e o Inverno holandês não o garante entre o fim de Setembro e Maio”,
acrescenta Teresa Traquina. Algo que não falta no litoral alentejano.
As preocupações
ambientais são destacadas pela técnica portuguesa. A empresa recorre à alta
tecnologia para manter uma elevada densidade de plantas por cada metro
quadrado. Este tipo de cultura necessita de pequena quantidade de água na rega
e as plantas que crescem em vasos com turfa ”raramente precisam de
fertilizantes e pesticidas químicos”, explica Teresa Traquina, frisando que as
plantas são sujeitas a análises periódicas “para avaliação dos resíduos
químicos”. Esta é outra das grandes diferenças em relação a outras culturas
praticadas no Perímetro de Rega do Mira, que recorrem a elevadas doses de
fertilizantes, água e pesticidas variados.
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