Candidatura da Arrábida à UNESCO
caiu porque a serra não é “única, nem excepcional”
MARISA SOARES
05/05/2014 - 17:15
Parecer de peritos internacionais sublinha a existência de "várias
pressões" causadas pela construção, o turismo e a actividade da cimenteira.
O Estado retirou
a candidatura da Serra da Arrábida a Património Mundial e Cultural da UNESCO,
na sequência de um parecer da União Internacional de Conservação da Natureza
(IUCN) e do Conselho Intermunicipal dos Monumentos e Sítios (Icomos). Embora
reconheça a importância da Arrábida a nível regional e nacional, os peritos
consideram que a serra não tem características excepcionais que justifiquem a
classificação.
“O Parque Natural
da Serra da Arrábida é importante no contexto da região mas não exibe
características de relevância internacional”, lê-se no parecer, que arrasa os
argumentos apresentados no dossiê de candidatura apresentado à UNESCO em
Fevereiro de 2013. Embora este não inclua na área a classificar o local onde
estão a cimenteira da Secil e as pedreiras, os autores do parecer destacam
negativamente o seu impacto na paisagem, como “cicatrizes” irreparáveis a longo
prazo. Os peritos apontam também o dedo à construção, nalguns casos ilegal, de
casas de férias naquela zona e às pressões do turismo.
O técnicos da
IUCN e do Icomos estiveram na Arrábida entre 1 e 4 de Outubro de 2013 para
avaliarem o cumprimento dos critérios da candidatura. No relatório, admitem que
a serra é “sem dúvida um sítio bonito de importância local e nacional”. Mas na
comparação com outros locais classificados como Património Mundial, a Arrábida
sai a perder. Os “valores naturais e culturais” presentes no território são
importantes a nível nacional e europeu mas não são “únicos e excepcionais” à
escala mundial, critério fundamental para a classificação. Os especialistas
identificam também "deficiências no plano de gestão, desafios de
coordenação e financiamento global indefinido".
“A Arrábida
carece claramente da grandeza de muitas áreas costeiras protegidas e/ou de
definições em termos de escala, isolamento, natureza intacta e integridade
visual”, escrevem os autores do parecer, que tem um peso decisivo na
classificação.
“Tendo em conta o
relatório, e para não sujeitar o dossiê à recusa, o Estado decidiu recuar”, diz
ao PÚBLICO João Afonso, da Associação de Municípios da Região de Setúbal
(AMRS), coordenador da equipa técnica que preparou a candidatura. Este desfecho
apanhou-o de surpresa. “O conjunto de indicadores que tínhamos apontavam noutro
sentido”, afirma, garantindo porém que o “longo” processo de candidatura não
foi em vão: "As parcerias entre os vários agentes que intervêm no
território vão continuar”.
“Todo este
trabalho tem valor independentemente da classificação”, sublinha, acrescentando
que os parceiros envolvidos no processo - além da AMRS, as câmaras de Setúbal,
Palmela e Sesimbra, o Instituto de Conservação da Natureza e Florestas - vão
agora analisar melhor o parecer e “procurar outras formas de obter o
reconhecimento da zona”.
A candidatura,
entregue na UNESCO em Fevereiro de 2013, foi assumida pelo Estado devido ao seu
“enorme potencial”. “A Arrábida é uma das jóias da coroa do património
português que poderá ganhar muito com o seu reconhecimento internacional”,
afirmou Paulo Portas, na altura ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.
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