Acho muito bem que o Movimento Europa e Liberdade faça
uma convenção e acho muito bem que convide quem entender. Mas, o que é que Rui
Rio está a fazer lá?
José Pacheco
Pereira
1 de Maio de
2021, 0:10
https://www.publico.pt/2021/05/01/opiniao/noticia/mel-problema-pegajoso-1960755
Antes de mais,
para que não haja confusões deliberadas – hoje a maioria das confusões são
deliberadas –, eu acho muito bem que o Movimento Europa e Liberdade (MEL) faça
uma convenção com os seus; acho muito bem que convide quem entender; acho muito
bem que, se Sérgio Sousa Pinto, Álvaro Beleza e Luís Amado se sentem bem lá,
devem ir; acho muito bem que se o MEL quer Ventura lá, o convide; e acho que a
clarificação que daqui resulta é positiva para a política portuguesa. O caso de
Rui Rio fica para o fim.
A clarificação
vale muito e a lista de pessoas vale muito mais. No seu núcleo duro está a
tribo. Este núcleo vem da comunicação social, em particular do principal think
tank da direita radical em Portugal, o grupo de comunicação social do
Observador, online, rádio e revistas, que pelos seus financiamentos é
claramente um braço armado de um lóbi empresarial, e assenta numa lógica
política sectária. O jornal tem qualidade e, de novo, ainda bem que existe. Mas
convém não ter a ilusão de que se trata de um projecto de comunicação social –
é um projecto político da ala mais radical da direita portuguesa e o que
verdadeiramente nele conta é a opinião e a mobilização da tribo pelos
comentários. E é essa opinião que está em peso no MEL, Rui Ramos, José Manuel
Fernandes, Helena Matos, Jaime Nogueira Pinto, Alexandre Homem Cristo, João
Marques de Almeida, Vítor Cunha, etc.
Esta lista comunica
com blogues, alguns actualmente muito próximos do Chega e da extrema-direita,
que não é a mesma coisa que a direita radical. E tem uma presença muito activa
nas redes sociais, a que se acrescenta a opinião no PÚBLICO (Fátima Bonifácio,
João Miguel Tavares) e no Jornal de Negócios (Camilo Lourenço, Joaquim Aguiar),
na imprensa económica em geral, e nas televisões em sinal aberto, com Portas e
Júdice. Só a lista de nomes e posições revela como a vitimização da direita
sobre o acesso aos órgãos de comunicação social é apenas isso, vitimização,
para se apresentarem como perseguidos quando têm vindo a aumentar
significativamente a sua presença nos jornais, rádios e televisões. O problema
não está tanto na opinião, está na crescente influência na agenda editorial. De
novo, para não haver mais daquelas confusões intencionais, acho muito bem na
opinião, até porque alguns deles são gente com qualidade. Agora não me venham
com histórias da carochinha sobre vitimizações.
A Maçonaria está
também presente, a do PSD e a outra, da direita radical. Depois há gente do
PSD, e da Aliança, na sua esmagadora maioria opositores de Rui Rio, vindos do
“passismo”, reciclado em nostalgia da troika, como Morgado, Pinto Luz, Paulo
Sande, Nogueira Leite, etc. Do mesmo modo, a esmagadora maioria dos presentes
que não são do PSD andaram nessas águas durante o governo Passos-Portas-troika
e são agressivos opositores de Rio, que tratam como uma espécie de traidor
serventuário de António Costa e do PS. Para eles, o que é preciso é correr o
mais depressa possível com Rio para “reconfigurar a direita” com o único
partido que tem votos, o PSD.
Há outra questão.
O MEL não está a fazer um colóquio ou um debate, está a fazer uma “convenção”.
Isso significa que há pertença, e é por isso que tem sentido falar de uma
espécie de “congresso” de uma certa direita, a direita que inclui o Chega, a
Iniciativa Liberal, o CDS e… parte do PSD.
Nenhum problema do país, e da sua realidade de atraso,
pobreza, exclusão, desigualdade, injustiça, exploração, baixos salários,
ambiente, corrupção, estará presente nas intervenções, ou, se não estiver
ausente, será de forma perversa, para falar de outras coisas
Depois, o resto é
o que se espera. Nenhum problema do país, e da sua realidade de atraso,
pobreza, exclusão, desigualdade, injustiça, exploração, desequilíbrio nas
relações laborais, baixos salários, débil protecção social, ambiente,
corrupção, estará presente nas intervenções, ou, se não estiver ausente, será
de forma perversa, para falar de outras coisas. Nem nenhum problema sério da
direita conservadora, democrática e liberal será lá discutido. Compreende-se
que seja assim, não é para isso que eles vão lá.
Os três problemas
desta direita serão iludidos. O primeiro problema da direita é a ineficácia
eleitoral, não é o adormecimento das pessoas pelas habilidades de Costa, nem a
“perseguição” de que são “vítimas”, nem o esmagar das liberdades do povo
português manipulado pelo PS a pretexto da pandemia. Tretas. O segundo
problema, que é a causa do primeiro, é a sua radicalização e tribalização.
Criam grande identidade e militância, para dentro, mas marcam fronteiras de
ferro e fogo para fora. Para além da sua fronteira, todos são comunistas ou
idiotas úteis da esquerda. E a tribo está longe de ser grande, daí o desejo de
capturarem o PSD e o estarem à vontade com o Chega, porque precisam do
populismo agressivo. Desprezam-no como gente fina que são, mas precisam de
alguma rua. O terceiro problema, que deriva do segundo e explica o primeiro, é
a errada análise da realidade política, com uma aproximação ideológica e
política que tem medo de dizer ao que vem, com uma enorme ambiguidade em
relação à ditadura e à guerra colonial, com contradições profundas entre um
nacionalismo de bandeira e a aceitação do poder não-democrático da Europa, se
lhes servir de reforço para a TINA, entre o reaccionarismo de costumes, a
agenda evangélica à portuguesa e às modas a que são sensíveis pela idade e pelo
corpo, entre o machismo, a xenofobia, o racismo e o autoritarismo para que
tendem, e a perversão da palavra liberdade.
Tenham, pois, uma
boa convenção. Mas, o que é que Rui Rio está a fazer lá?
Historiador
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