TVI abre inquérito interno após queixa de jornalista sobre notícia retirada do telejornal
Por Mariana Oliveira in Público
30/03/2013
Ana Leal tinha questionado a direcção, via Conselho de Redacção, sobre a retirada de uma notícia do Jornal das Oito
A TVI abriu um processo de inquérito, na sequência da participação da jornalista Ana Leal ao Conselho de Redacção (CR) sobre uma notícia retirada do alinhamento do Jornal das 8 no sábado de 26 de Janeiro, pela subdirectora Judite Sousa.
Contactada pelo PÚBLICO, a assessora de imprensa da TVI respondeu através de um email: "A TVI não tem por hábito pronunciar-se sobre questões internas, pelo que não se irá pronunciar sobre este assunto".
Há cerca de uma semana, um advogado da estação de televisão começou a ouvir vários dos envolvidos no episódio, incluindo o director de informação, José Alberto Carvalho, e a subdirectora, Judite Sousa. Igualmente inquirida foi a jornalista Ana Leal, que se apresentou acompanhada pelo advogado Ricardo Sá Fernandes, o que o PÚBLICO confirmou com o próprio. O defensor e a jornalista recusaram, contudo, prestar esclarecimentos sobre o caso.
O PÚBLICO sabe que o instrutor do processo ouviu também o jornalista Carlos Enes, elemento do CR e envolvido indirectamente no caso, a par de alguns editores que combinaram as duas peças sobre o polémico Sistema Integrado das Redes de Emergência e Segurança de Portugal, conhecido pela sigla SIRESP.
Em causa, na notícia, estava o facto de o Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), então dirigido por Cândida Almeida, ter avocado um processo sobre a polémica parceria público-privada do SIRESP, mas depois ter optado por não reabrir o caso.
A notícia de Ana Leal, que dava conta deste recuo do DCIAP numa altura em que se aproximava a eventual renovação da comissão de serviço de Cândida Almeida (que acabou por ser afastada pela nova procuradora-geral da República), deveria ter sido emitida a 26 de Janeiro, a par de uma outra do jornalista Carlos Enes. Esta última dava conta do não-funcionamento do SIRESP, durante a vaga de mau tempo, ocorrida uns dias antes.
Este sistema de comunicações custou ao Estado mais de 500 milhoes de euros, tendo a sua adjudicação dado origem a um inquérito que acabaria arquivado em Março de 2008.
A adjudicação daquele sistema de comunicações foi feita por dois ministros do Governo de Santana Lopes a um consórcio liderado pela Sociedade Lusa de Negócios (SLN) - proprietária do BPN, antes da sua nacionalização - três dias após as legislativas de 2005, ganhas por Sócrates. Na holding que liderava o consórcio ao qual foi entregue o SIRESP, a SLN, tinha trabalhado o então ministro da Administração Interna Daniel Sanches, antes de integrar o Governo de Santana. O grupo era então presidido pelo ex-secretário de Estado dos Assuntos Fiscais de Cavaco, Oliveira Costa, que se encontra em prisão domiciliária no âmbito de uma das investigações ao BPN.
A participação de Ana Leal sustentada na convicção (errada) de que a notícia não tinha sido emitida (a notícia tinha sido entretanto divulgada no 25.ª Hora, da TVI24) foi dirigida a José Alberto Carvalho e remetida aos elementos do CR, um órgão que representa os jornalistas junto da direcção editorial. A repórter alertava para situações que, do seu ponto de vista, podiam ter "repercussões negativas para a imagem e credibilidade do jornalismo da TVI, bem como para o prestígio dos seus profissionais". A participação visava, assim, "de forma construtiva, esclarecer o que se passou".
No início desta semana, depois de conhecida a decisão da TVI de abrir o inquérito e temendo que Ana Leal pudesse ser alvo de um processo disciplinar, seis membros do CR confirmaram que o que analisaram foi um mero "pedido de esclarecimento da jornalista" e não uma "participação de censura". Para clarificar a questão, os membros do CR anexam à nota a acta da última reunião e a participação de Ana Leal. Acrescentam que "o artigo 38 da Constituição da República Portuguesa garante aos jornalistas o direito de participação na orientação editorial dos órgãos de informação e o direito de elegerem o CR".
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