PSD utiliza pareceres jurídicos encomendados pela Câmara de Gaia
Por Margarida Gomes
22/03/2013 in Público
Parecer solicitado pela Câmara de Gaia, liderada por Luís Filipe Menezes, sugere que deveria ser o Parlamento a clarificar a lei
Luís Filipe Menezes pediu dois pareceres sobre limitação de mandatos e reforma do poder local. PSD usou-os nos tribunais onde foram apresentadas providências cautelares sobre essa restrição eleitoral
A Câmara de Gaia encomendou dois pareceres jurídicos a dois professores de Direito sobre a Lei de Limitação de Mandatos e regime jurídico da reorganização administrativa territorial que foram usados pelo PSD na argumentação que o partido fez relativamente às providências cautelares apresentadas em vários tribunais contra candidaturas de autarcas sociais-democratas que já cumpriram três mandatos consecutivos.
Um dos pareceres foi encomendado em Outubro, pouco dias depois de Luís Filipe Menezes ter anunciado através da SIC Notícias a sua candidatura à Câmara do Porto, e o segundo parecer é mais recente: data de 1 de Março.
O advogado do Movimento Revolução Branca (MRB), que interpôs sete providências cautelares contra candidaturas de autarcas sociais-democratas que vão a votos este ano em novos concelhos, vai participar o caso ao Ministério Público para que avalie se "há alguma ilegalidade".
Pedro Pereira Pinto chega mesmo a falar de promiscuidade. "Há uma clara promiscuidade, é o que eu posso dizer", afirma o advogado, sublinhando que "é preciso perceber como é que o PSD teve acesso a pareceres jurídicos que foram encomendados pela Câmara de Gaia" e que não se sabe quanto custaram.
A câmara presidida por Luís Filipe Menezes confirma que solicitou dois pareceres jurídicos a dois professores de Direito sobre a lei de limitação de mandatos autárquicos e questões relacionadas com a reforma do poder local. "Esta decisão foi aprovada por unanimidade por todos os partidos com assento no executivo camarário (PSD, CDS e PS) e visou habilitar a câmara a preparar com todos os agentes políticos do concelho uma tomada de posição rigorosa e fundamentada sobre o processo de reforma do poder local, nomeadamente no que concerne à agregação de freguesias", escreve a autarquia de Gaia num email enviado ao PÚBLICO.
A informação refere ainda que os "doutos pareceres jurídicos foram, por isso, disponibilizados a todos os partidos políticos com assento no executivo autárquico, ajudando-os na preparação e elaboração da sua decisão". Nesta conformidade - acrescenta a nota - "os doutos pareceres ficaram no domínio público, pelo que qualquer entidade pode tê-los utilizado, sendo a Câmara Municipal de Gaia alheia e a esse facto".
E o que dizem os pareceres de Paulo Otero e de João Pacheco de Amorim a que o PÚBLICO teve acesso? Que "o presidente de uma câmara municipal que tenha completado três mandatos sucessivos no mesmo município não se encontra impedido de se candidatar a presidente de câmara de um diferente município ou, se assim o entender, a presidente de uma junta de freguesia situada na área territorial do município em que acabou de completar o terceiro mandato como presidente de câmara". "Em igual sentido, o presidente de uma junta de freguesia que completou três mandatos consecutivos numa mesma freguesia não está impossibilitado de se candidatar a presidente de junta de uma outra freguesia - isto ainda que situada no território do mesmo município -, tal como se poderá candidatar, se assim pretender, a presidente da câmara municipal do município em que fazia parte a freguesia em que acabou de completar três mandatos como presidente de junta."
Paulo Otero alude ao sentido interpretativo da incapacidade eleitoral passiva de quem já completou três mandatos consecutivos como presidente de câmara municipal ou presidente de junta de freguesia para afirmar que o "texto da Lei n.º 46/2005 de 29 de Agosto revela-se, na realidade, pouco claro, permitindo dele fazer-se uma leitura ambígua". "Em vez de ser clara, todavia, a lei resolveu optar pela obscuridade, adoptando um enunciado normativo que, numa leitura literal, permite em termos leigos, sem recurso a qualquer metodologia técnico-interpretativa própria da ciência jurídica, extrair duas leituras opostas: estar-se diante de uma inelegibilidade absoluta (face a toda e qualquer autarquia) ou, ao invés, perante uma inelegibilidade relativa (apenas perante a autarquia em que foram exercidos os três mandatos sucessivos)", refere o parecer.
Para o professor de Direito, a solução sempre possível de resolver este imbróglio jurídico-interpretativo seria a própria a Assembleia da República proceder a uma interpretação autêntica da lei: o legislador tem sempre competência para proceder à aclaração do sentido de uma acto legislativo". Mas reconhece que "ninguém pode obrigar o Parlamento a exercer uma tal competência interpretativa das leis".
Mais duas providências para impedir candidaturas
Por Margarida Gomes
22/03/2013 in Público
O Movimento Revolução Branca (MRB) vai apresentar mais duas providências cautelares relativas às candidaturas da CDU de Victor Proença, à presidência da Câmara de Alcácer do Sal, e de Carlos Pinto de Sá, ao município de Évora.
A informação foi avançada ao PÚBLICO pelo advogado do movimento cívico, Pedro Pereira Pinto, que aguarda apenas que as candidaturas sejam oficialmente anunciadas para entregar nos respectivos tribunais as providências cautelares. O advogado entende que "ambas as candidaturas são ilegais, violando a Lei de Limitação de Mandatos [LLM]".
Victor Proença, que preside à Câmara de Santiago do Cacém, transita directamente desta autarquia, onde cumpre o seu terceiro e último mandato, para Alcácer do Sal. Já Carlos Pinto Sá suspendeu em Dezembro passado o cargo de presidente de Montemor-o-Novo, por estar impedido de se recandidatar devido à LLM, para avançar para Évora.
Na opinião de Pereira Pinto, o ex-presidente da Câmara de Montemor-o-Novo está também abrangido pela lei, apesar de ter deixado a presidência. Para o advogado, a lei é clara e explica porquê: "O ponto 3 do artigo 1 da Lei de Limitação de Mandatos diz que aquele que renunciar ao mandato estando no cumprimento do terceiro mandato consecutivo fica abrangido pelo impedimento da lei, não se podendo recandidatar a um quarto mandato pelo facto de ter renunciado".
Até ao momento, o MRB já apresentou oito providências relativamente às candidaturas em Lisboa, Porto, Beja (duas acções, uma relativa ao PSD e outra à CDU), Estremoz, Loures, Tavira e Vila Real de Santo António, com o objectivo de travar candidaturas dos chamados "dinossauros" autárquicos. O Tribunal Cível de Lisboa declarou na quarta-feira que o actual presidente da Câmara de Sintra, Fernando Seara, está impedido de se candidatar à presidência da Câmara de Lisboa e que o PSD e o CDS-PP estão impedidos de o apresentarem como candidato nas eleições autárquicas deste ano.
O autarca de Sintra vai recorrer da decisão para o Tribunal da Relação e o PSD vai interpor um recurso no mesmo tribunal.
O assunto está na ordem do dia, mas o Presidente da República recusou ontem comentar a decisão judicial que impede Fernando Seara de ser candidato a Lisboa, argumentando que a "interpretação" da lei "compete aos tribunais" e que, por isso, não se deve "intrometer".
Também o secretário-geral do PS, António José Seguro, recusou fazer qualquer comentário sobre a rejeição do Tribunal Cível de Lisboa à candidatura de Seara à Câmara de Lisboa, lembrando que recandidaturas de autarcas com três mandatos não são viabilizadas no PS.
Já Luís Filipe Menezes, que troca Gaia pelo Porto, disse acreditar no "espírito da lei" da limitação de mandatos, afirmando estar "nesta candidatura para vencer".
O presidente da Câmara de Lisboa, António Costa, tem uma opinião diferente. Diz que a Assembleia da República devia "assumir as suas responsabilidades" no sentido de clarificar a Lei de Limitação de Mandatos, considerando que a indefinição é "uma coisa incompreensível em qualquer país".
Duas das providências apresentadas não foram aceites pelos tribunais, alegando que o caso deve ser apreciado em processo eleitoral. É o caso de Estremoz e de Loures. Já em Beja, a queixa deixou de fazer sentido no que diz respeito ao PSD, uma vez que o candidato, António Sebastião, desistiu. O MRB aguarda pelas decisões relativas ao Porto, Tavira, Vila Real de Santo António e Beja (CDU), a última a ser entregue. Neste caso, o tribunal terá de se pronunciar sobre a candidatura do "histórico" autarca de Serpa, João Rocha, abrangido pela limitação de mandatos.
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