quinta-feira, 27 de maio de 2021

Rui Rio no MEL.

 




Por este Rio abaixo

 

Há algo de comovente na tragédia de Rui Rio. Tem um programa, mas é impossível.

 

Ana Sá Lopes

26 de Maio de 2021, 23:34

https://www.publico.pt/2021/05/26/politica/analise/rio-abaixo-1964226

 

Há qualquer coisa de trágico – e ao mesmo tempo de quase comovente — em Rui Rio. Aceita aparecer no chamado “congresso das direitas” contente por não haver uma tabuleta a dizer “congresso das direitas”, porque como não é de direita não iria conseguir entrar; repete o mesmo discurso sobre dívida, défice, crescimento e exportações que tem há anos (recusando sugestões para que o discurso do PSD deixe de estar centrado nas finanças); anuncia que o seu programa para salvar Portugal passa por um acordo com o PS e que o tal programa — que é o de sempre, reforma do sistema político e do sistema da justiça — é impossível. “O PS não quer reformar nada”: foi o único momento, o das críticas ao PS e não o enunciado do programa, em que o congresso das direitas acedeu a aplaudi-lo. Depois, diz que já tomou a vacina da Astrazeneca, está muito bem e vai-se embora. Passos Coelho, o fantasma presente na sala, acompanha com carinho o sucessor à saída, numa quase metáfora do que pode ser o futuro do PSD, a avaliar pelo saudosismo passista presente na velha FIL.

 

Sentado na primeira fila, para onde saltou rapidamente depois de na terça-feira ter começado por sentar-se cá mais atrás, Passos Coelho foi um catalisador do sentimento de orfandade existente no PSD, expresso em aplausos e homenagens ao antigo líder enquanto o nome de Rui Rio ou era omitido ou atacado.

 

No fim de contas, a convenção serviu para sinalizar que Passos Coelho é um unificador das várias direitas na órbita do PSD — e a sua disciplinada presença dentro da sala quase do princípio ao fim funcionou como um cartaz. A reunião serviu também para institucionalizar o partido da extrema-direita, o Chega, e ajudar a Iniciativa Liberal a percorrer o seu caminho — pelo menos enquanto D. Sebastião não se levantar da primeira fila da assistência e decidir subir ao palco. Com André Ventura a declarar querer ser “Governo” e a ameaçar que a direita não voltaria ao poder sem o Chega (e assinava também o seguro de vida do PS e de António Costa) os presentes entusiasmavam-se e aplaudiam.

 

Foi também um palco excelente para mostrar um Paulo Portas moderadíssimo, candidatável a Belém e contra a democracia transformada em “gritaria" (longe vão os tempos do CDS do triunvirato Manuel Monteiro/Paulo Portas/O Independente e a sua específica gritaria numa época sem redes sociais). Da presença obnóxia de militantes do PS num encontro para discutir a reconfiguração das direitas, útil só o conselho de Henrique Neto: “Esta reunião tem por trás de si o desejo de substituir um Governo de esquerda por um Governo de centro-direita. É preciso ver quem está em condições de liderar. Eu, se fosse ao dr. Rui Rio, limitava-me a pôr numa folha de papel dez causas e propunha-as ao centro-direita do país”. Até há causas, mas são impossíveis.

 

Discurso inteligente e a sair da estranha amálgama que pairou na “reconfiguração das direitas" foi o de Miguel Poiares Maduro a estabelecer as fronteiras que Rui Rio não quis fazer, contra os que “entendem que a necessidade de oferecer uma alternativa se sobrepõe à qualidade dessa alternativa”. Não é o seu caso: “De pouco serve unir todo o espaço não socialista se as diferenças no seu seio forem tão ou mais graves do que as que o separam do outro lado”.

 

Quanto ao resto, é de lembrar o papel patriótico dos “founding fathers” da direita portuguesa quando integraram os saudosistas do Estado Novo nos seus partidos — o PSD “socialista” de Sá Carneiro e o CDS centrista de Freitas do Amaral. A adesão ao regime deposto sempre existiu — “O que era preciso era outro Salazar” sempre foi um elemento do vox populi — e continua a aparecer em eventos da direita, mesmo que poeticamente. A historiadora Fátima Bonifácio encerrou a sua intervenção a citar Fernando Pessoa sobre o ditador: “A sua simplicidade dura e fria pareceu qualquer coisa de bronze e fundamental”. Tinha dito.


Rui Rio no MEL. “O PSD não é um partido de direita”

POLÍTICA

26.05.2021 às 21h32

RITA RATO NUNES

JORNALISTA

JOSÉ CARLOS CARVALHO

REPÓRTER FOTOGRÁFICO

https://visao.sapo.pt/atualidade/politica/2021-05-26-rui-rio-no-mel-o-psd-nao-e-um-partido-de-direita/?fbclid=IwAR1gu6DK8Nah8qG6hEri17BlbMuQGiZHnITk6hDGFtlOEqHaR3W6qVcc5iU

 

O líder social-democrata entrou na convenção do Movimento da Europa e das Liberdades (MEL) às escuras. Ignorou o tema transversal à reunião das direitas (a possibilidade de uma união) e lavou daqui as suas mãos, afastando-se dos outros partidos presentes e que tantas críticas lhe dedicaram, durante dois dias

 

Chegada a hora da desforra, Rui Rio – o líder partidário mais criticado durante a terceira convenção do Movimento da Europa e das Liberdades (MEL) – subiu ao palco e ignorou o repto dos partidos à sua direita para se unir ao CDS, à IL e ao Chega. Aliás, até começou por se demarcar destes: “Se isto fosse um congresso das direitas eu não conseguiria entrar. Teria sido barrado. O PSD não é um partido de direita”. Esclarecendo que “o PSD, quando nasceu, em 1974, não só era de centro como era marcadamente de centro-esquerda”.

 

Nos últimos dois dias, o presidente do PSD esteve debaixo de fogo de todos os líderes da direita e até dos militantes do seu próprio partido, que o acusaram de ser um líder fraco, de se aproximar do Partido Socialista e de ser responsável pelo surgimento das novas forças políticas à direita. Francisco Rodrigues dos Santos, líder do CDS-PP, deixou o recado: “Para combater a esquerda, não precisamos de uma obsessão pelo centro” nem de fazer “fretes ao PS”. João Cotrim de Figueiredo, líder da Iniciativa Liberal, foi mais concreto, dizendo mesmo que o PSD “está a fazer o jogo dessa esquerda” e André Ventura, líder do Chega, apontou que Rio é incapaz de “fazer o seu papel de oposição”. Mesmo dentro do PSD ouviram-se várias críticas ao atual líder, que tiveram o seu expoente máximo na pessoa de Miguel Pinto Luz. O vice-presidente da Câmara de Cascais, que disputou as últimas eleições internas com Rio, até concedeu que o seu presidente “seria muito melhor primeiro-ministro do que António Costa”, mas “a verdade é que não tem adesão”.

 

Perante isto, o líder social-democrata assobiou para o lado, optou por olhar para o passado e defender o Governo de Passos Coelho, que cumprimentou entusiasticamente assim que entrou no auditório do Centro de Congressos de Lisboa. E que, segundo Rio, “só teve um ano de liberdade. Nos outros três foi a troika que governou”.

 

Mas o presidente do PSD centrou-se sobretudo na análise dos problemas estruturais do País sob os eixos do “brutal endividamento externo” e do “endividamento público”, que terão levado Portugal à estagnação, tendo apenas arrancado palmas à plateia já no final, quando falou no PS para dizer que este partido “não quer reformar nada”.

 

Com a mão que afastou, também condescendeu, justificando ainda que o País precisa de reformas estruturais e que estas não podem ser alcançadas sem diálogo entre os dois grandes partidos: o PS e o PSD. “A cultura dominante não é a cultura do diálogo democrático. Existe a ideia de que uma oposição forte nunca coopera, só diz mal, está sempre contra. E quando coopera tem de se tirar e pôr alguém que venha falar mais alto”, declarou Rio.

 

Se Passos Coelho quisesse…

Não falou, mas também não foi preciso. O ex-primeiro-ministro social-democrata, Pedro Passos Coelho, chegou para a abertura da convenção, nesta quarta-feira, e ficou até ao final para ouvir Rio. Manteve-se o tempo (quase) todo em silêncio, mas a ânsia do seu regresso era palpável na sala e deixou uma certeza: se Passos Coelho quiser voltar, Rui Rio terá dores de cabeça.

 

De todas as vezes que o seu nome foi mencionado – e não foram poucas – a sala dedicava-lhe uma salva de palmas. Comum também foi a interpretação de que os problemas da direita seriam minimizados com o ex-primeiro-ministro ao leme.

 

Rio e Passos abandonaram o MEL juntos, mas sobre o discurso do atual líder – que Passos aplaudiu de pé – nada quis acrescentar aos jornalistas.

 

Sem comentários: