EDP
António Mexia e Manso Neto suspensos de funções na EDP
por Carlos Alexandre
O afastamento de funções tinha sido proposto pelo
Ministério Público e foi validado pelo juiz Carlos Alexandre.
Mariana Oliveira
6 de Julho de 2020, 15:48
O juiz Carlos
Alexandre determinou esta segunda-feira a suspensão de funções de António
Mexia, presidente da EDP, e de João Manso Neto, presidente da EDP Renováveis,
no âmbito do caso das rendas da eléctrica. Este afastamento de funções tinha
sido proposto pelo Ministério Público, que exigia igualmente outras medidas de
coacção. Foi nesse âmbito que o juiz de instrução deu 15 dias a António Mexia para
prestar uma caução no valor de um milhão de euros, o mesmo valor aplicado a
Manso Neto. Os dois ficam ainda proibidos de contactar, por qualquer meio, com
vários arguidos e testemunhas do caso e de entrar em todos os edifícios da EDP.
Também lhes fica vedada qualquer viagem ao estrangeiro, ficando com a obrigação
de entregarem o passaporte.
Para João
Conceição, o administrador da REN- Redes Energéticas Nacionais e antigo
consultor de Pinho, o juiz Carlos Alexandre não determinou a suspensão de
funções igualmente pedida pelo Ministério Público, optando por aplicar uma
caução de 500 mil euros, que os procuradores admitiam ser uma solução se o
gestor se mantivesse em funções. Conceição fica ainda proibido de contactar
quatro arguidos no processo.
O jornal Eco
avançou com a notícia, entretanto confirmada pelo PÚBLICO e pela própria EDP.
O processo das
rendas excessivas da EDP está há cerca de oito anos em investigação no
Departamento Central de Investigação e Acção Penal e tem vários arguidos, entre
eles António Mexia, João Manso Neto, o antigo banqueiro Ricardo Salgado, o
antigo director-geral de Geologia e Energia Miguel Barreto, Rui Cartaxo e Pedro
Furtado, responsável de regulação na empresa gestora das redes energéticas. O
ex-ministro Manuel Pinho também foi constituído arguido, mas esse acto foi
invalidado pelo juiz Ivo Rosa, tendo mais tarde a Relação de Lisboa anulado
essa decisão. No entanto, ainda se mantém-se uma discussão jurídica no Tribunal
Constitucional sobre os poderes de um juiz de instrução e a legitimidade para
invalidar o acto de constituição de um arguido em determinadas situações.
Uma teia
intrincada
António Mexia e
João Manso Neto são suspeitos de terem corrompido, em conjunto, um ministro, um
secretário de Estado, um assessor governamental e um director-geral, imputações
que integram o inquérito das rendas da EDP e que levaram os procuradores do
caso a pedir a suspensão de funções de ambos na eléctrica nacional.
Segundo
documentos do processo a que o PÚBLICO teve acesso, os dois executivos da EDP
estão ainda indiciados por lesarem os interesses da própria eléctrica com a
adjudicação da construção da barragem do Baixo Sabor, em meados de 2008, ao
consórcio composto pelo grupo Lena e pela Odebrecht. A primeira foi acusada de
corrupção na Operação Marquês e a segunda condenada na Operação Lavo-Jato como
uma das peças fundamentais de um grande esquema de corrupção no Brasil, que
passava por carregar nos preços de grandes obras públicas para suportar assim o
pagamento de luvas aos políticos que as contratavam.
Entre as
personagens principais desta intrincada teia de interesses está o antigo
ministro da Economia, Manuel Pinho — que exerceu funções governativas entre
2005 e 2009, durante o executivo liderado por José Sócrates —, que é suspeito
de ter sido corrompido pela dupla de executivos, que controla a EDP desde 2006.
Mexia é padrinho da filha mais nova de Pinho e ambos foram executivos no Banco
Espírito Santo (BES), liderado por outro arguido deste caso, Ricardo Salgado,
também ele, segundo a tese do Ministério Público, corruptor activo do antigo
ministro da Economia. Recorde-se que o BES tinha uma participação qualificada
na EDP, empresa que, segundo relatórios externos, terá sido beneficiada em
cerca de 1200 milhões de euros pelos vários arguidos do caso. A maior parte
(852 milhões) terá resultado do alegado baixo preço atribuído em 2007 à
extensão da concessão, sem concurso público, de 27 barragens, que continuaram a
ser exploradas pela EDP e da sobrevalorização nessa mesma altura do valor
acordado pelo fim antecipado dos 32 Contratos de Aquisição de Energia. Estes
contratos tinham sido celebrados em 1996 para atrair investimento em centrais
eléctricas de que o país precisava, mas que o Estado optou por não financiar.
Ricardo Salgado é
suspeito de ter ordenado pagamentos mensais de quase 15 mil euros mensais
através da Espírito Santo Enterprises, conhecida como o saco azul do grupo
Espírito Santo, que começou a transferir o dinheiro para uma offshore
controlada por Pinho, já este era ministro da Economia. Só durante o mandato,
Pinho recebeu mais de 500 mil euros, metade do que recebeu por esta via, já que
a mensalidade continuou a ser paga até Junho de 2012. Através de várias
offshore, noticiou o Observador, Pinho terá recebido 2,1 milhões de euros,
alegadamente para favorecer o universo empresarial Espírito Santo.
A principal
contrapartida de Mexia e Manso Neto a Pinho terá sido uma doação de 1,2 milhões
de euros de uma empresa da EDP, a Horizon, à Escola de Relações Públicas e
Internacionais da Universidade de Columbia, em Nova Iorque, que permitiu a
Pinho ser convidado e pago como professor visitante na prestigiada escola,
entre 2010 e 2012, após ter saído do governo. E tornar realidade um sonho da
mulher de Pinho que sempre quisera viver em Nova Iorque, como mesma reconhece
num e-mail trocado com a mulher de um professor daquela universidade, que
intermediou o contacto com o reitor da escola. Num desses e-mails, em Setembro
de 2009, a norte-americana explicava ao reitor que segundo a mulher de Pinho um
“salário alto não era necessário”. “Ela diz-me que ele já angariou fundos para
projectos e pode trazer parte deles para a Columbia”, explicava.
Mexia e Manso
Neto são igualmente suspeitos de terem corrompido o então secretário de Estado
da Energia, Artur Trindade, que exerceu funções entre 2012 e 2015, no Governo
liderado por Passos Coelho. É que em 2013 contrataram o pai do então secretário
de Estado, como consultor externo, para integrar o recém-criado Comité de
Acompanhamento das Autarquias. O pai do então governante era o único membro
daquele comité com essa qualidade, onde tinham assento apenas administradores e
directores da EDP.
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