terça-feira, 28 de julho de 2020

Gestão do Novo Banco sob ataque da esquerda à direita



NOVO BANCO
Gestão do Novo Banco sob ataque da esquerda à direita

Operações de venda de imóveis na mira dos partidos. Investigação judicial, comissão de inquérito, audições, nacionalização, suspensão de transferências: partidos querem controlar dinheiro que segue para o Novo Banco.

Marta Moitinho Oliveira e Maria João Lopes 28 de Julho de 2020, 20:30

A auditoria à gestão do Novo Banco chega na sexta-feira à mesa do Governo, culminando uma semana em que, da esquerda à direita, se ouviram ataques aos processos de venda de imóveis feitos pela instituição. A temperatura do termómetro político voltou a subir com a publicação da investigação do PÚBLICO a dar conta de mais um negócio com perdas compensadas pelo Fundo de Resolução. A poucos dias do sexto aniversário da resolução do BES, a classe política quer envolver o Ministério Público, a quem pede uma investigação judicial. “Espero que o Ministério Público agarre neste dossier”, atirou o líder do PSD.

O Novo Banco vendeu em 2018 um conjunto significativo de imóveis a um preço inferior ao que resultava da sua avaliação prevista no balanço do banco, revela a investigação publicada nesta segunda-feira pelo PÚBLICO, que adiantava ainda outros dois pontos: houve compensação por parte do Fundo de Resolução e a operação foi financiada pela própria instituição de crédito, que concedeu um empréstimo a um fundo com beneficiários desconhecidos.

“A investigação do PÚBLICO eleva o nível de preocupação do PS com estas operações de venda”, afirmou o vice-presidente da bancada socialista João Paulo Correia, acrescentando que o grupo parlamentar vai indicar à Comissão de Orçamento e Finanças que, em Setembro quando os trabalhos parlamentares forem retomados, que quer começar as audições das 30 entidades do sector financeiro pelos responsáveis máximos do Novo Banco e do Fundo de Resolução, António Ramalho e Luís Máximo dos Santos.

O Novo Banco nasceu do fim do BES a 3 de Agosto e foi vendido ao Lone Star em 2017, com o Fundo de Resolução a ficar com 25% do capital. Em três anos, o banco já foi buscar ao Mecanismo de Capital Contingente quase 3000 milhões de euros estando perto de esgotar o montante total disponibilizado para cobrir possíveis perdas com activos identificados como problemáticos.

Este fardo tem aumentando a pressão da classe política que quer um escrutínio maior das contas do banco. Ontem, o líder do PSD criticou o Governo por pagar ao Novo Banco sem conhecer o detalhe das facturas que lhe eram apresentadas. Rui Rui admite que, em termos políticos, e passado o mês de Agosto, o partido peça uma comissão parlamentar de inquérito que análise a gestão de António Ramalho na venda de imóveis. Mas, para já, quer que o tempo seja o da justiça.

Na semana passada, depois do debate do Estado da Nação, António Costa apoiou-se em Rio para pedir à PGR que suspenda processos de venda até que a auditoria seja conhecida, e ontem Rio pôs o pé no acelerador. “Espero que o Ministério Público agarre neste dossier”, disse, dando quase como certo que isso aconteça. “Estou convencido de que haverá uma investigação judicial” para verificar se as perdas com as vendas de imóveis “são reais ou fabricadas”.

Do lado dos centristas, a pressão é distribuída por três: Governo, supervisão e justiça. O CDS “vê com bons olhos todas e quaisquer investigações do Ministério Público”, exigindo “saber como é que cada cêntimo dos portugueses foi empregue e gasto no Novo Banco, com toda a transparência e verdade” e exigindo “aos responsáveis políticos, ao Governo e à supervisão do Banco de Portugal que dêem estas explicações aos portugueses”, disse o líder Francisco Rodrigues dos Santos, citado pela Lusa.

A lista de dúvidas e de pedidos de esclarecimento sobre os negócios do Novo Banco vai engordando. Além de audições, investigações, há pedidos por parte dos partidos para que se parem as transferências, as vendas, que se conheça quem compra os imóveis, que se nacionalize o Novo Banco, que se aumente o controlo do Estado sobre quem no banco está responsável pela aprovação da venda de imóveis ou que se faça uma renegociação dos acordos de venda do Novo Banco.

“O Banco de Portugal que diga quem são os últimos beneficiários, já que garantiu que havia mecanismos de fiscalização”, diz Mariana Mortágua, deputada do Bloco de Esquerda, adiantando que pretendia enviar, ainda na terça-feira, um requerimento ao Novo Banco e ao Fundo de Resolução a perguntar quem são os beneficiários últimos de todos os activos vendidos​. “O que agora começamos a perceber é que não é possível, sequer, aferir se há partes relacionadas ou não, porque estamos a falar de veículos secretos nas Caimão”, disse, referindo-se à venda de imóveis investigada pelo PÚBLICO. “É óbvio que a única coisa que há a fazer é suspender tudo: suspender as transferências para o Novo Banco e as vendas dos activos do Novo Banco”, insiste Mortágua.

Do lado do PCP chega outra insistência: a nacionalização do banco. A venda noticiada ontem pelo PÚBLICO pode não ser “apenas um mau negócio”, mas passar a ser “um crime económico contra o Estado português”, diz o PCP, estimando que a privatização do banco pode custar mais de 10 mil milhões de euros.

O PAN quer renegociar o contrato de venda “para evitar mais prejuízos para o erário público com operações como esta”. O partido de André Silva quer ainda que durante a crise sanitária não haja mais transferências para o Novo Banco.

Sob fogo no tabuleiro político, a instituição liderada por António Ramalho fez ontem saber que a “generalidade” dos imóveis do Projecto Viriato - o que foi noticiado ontem - não está coberta pelo mecanismo de protecção de capital e garantiu que não há “prejuízos directos” para o Fundo de Resolução com esta operação. O banco tentou ainda mostrar que não tem nada a esconder. “Em antecipação” seguiu na segunda-feira para o Ministério Público “um conjunto detalhado de informação” sobre a venda de imóveis no Projecto Viriato e Sertorius.

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