DESFLORESTAÇÃO
Investigação denuncia ligação da maior empresa de carne
do mundo à desflorestação na Amazónia
A brasileira JBS transporta gado de uma fazenda na
Amazónia ligada à desflorestação ilegal.
Sofia Correia
Baptista 27 de Julho de 2020, 18:16
Uma fazenda em
Mato Grosso terá usado os serviços de transporte da JBS para transferir gado
para outra empresa com “ficha limpa”
A brasileira JBS,
a maior empresa de carne do mundo, transporta gado de uma fazenda na Amazónia
ligada à desflorestação ilegal, apesar de se ter comprometido a erradicar todas
as relações com esta prática na sua cadeia de fornecimento.
A descoberta
resultou de uma investigação conjunta da Repórter Brasil, do The Bureau of
Investigative Journalism e do jornal britânico The Guardian, que refere que
esta é a quinta vez este ano que surgem alegações que ligam a empresa a
fornecedores implicados na desflorestação ilegal.
Uma fazenda em
Mato Grosso terá usado os serviços de transporte da JBS para transferir gado
para outra empresa com “ficha limpa”, que depois abastecia a JBS, lê-se na
investigação. Fotografias captadas por funcionários mostram o transporte na
fazenda com área embargada, onde a pecuária não é permitida.
A falta de
monitorização dos fornecedores indirectos é um dos principais obstáculos no
combate à desflorestação na pecuária da Amazónia, explica a investigação. Em
resposta à Repórter Brasil, a JBS referiu que não tem acesso a informação
adequada para fazer o rastreio deste tipo de fornecedores.
“A empresa
esclarece que o serviço de logística e transporte fornecido e executado, de
forma independente, deve atender às mesmas políticas de sustentabilidade da
empresa, incluindo o bloqueio das fazendas que não estejam em conformidade com
essas políticas”, diz a JBS na resposta.
Maior empresa de carne do mundo fornecida por autor de
chacina na Amazónia
Há indícios de que o envolvido no massacre da Amazónia
fez uso de uma prática de “lavagem de gado”, para conseguir vender animais a matadouros
de forma ilegal.
PÚBLICO 3 de
Março de 2020, 20:20
Uma investigação
do Repórter Brasil identificou ligações da maior empresa de carne do mundo, a
JBS, e da sua rival Marfrig com uma quinta cujo dono está implicado num dos
maiores massacres na Amazónia dos últimos anos.
Nove homens foram
brutamente assassinados a 19 de Abril de 2017, naquele que ficou conhecido como
“massacre de Colniza”, na região de Mato Grosso. Os corpos dos homens foram
encontrados uma região remota da floresta. Alguns foram encontrados com sinais
de tortura, outros foram esfaqueados ou mortos a tiro.
Segundo apurou a
Repórter Brasil, há indícios de que Valdelir João Souza, produtor de animais e
alegado mandante da chacina, praticou a chamada “lavagem de gado” para conseguir
vender animais à JBS.
A prática
consiste em transferir o gado de uma fazenda com desflorestação ilegal para uma
propriedade com “ficha limpa”, de modo a encobrir a origem dos animais. O
objectivo é fugir ao compromisso de “desmatamento zero” e ao Termo de Ajuste de
Conduta de Carne, que as maiores produtoras brasileiras de carne assumiram em
2009. Nestes acordos prevê-se a monitorização dos fornecedores e o fim da
compra de animais a quintas que recorram à desflorestação à margem da lei e ao
trabalho escravo.
A investigação
surge numa altura em que a JBS sofre pressões por falhas de transparência no
fornecimento de gado na Amazónia.
O “massacre de
Colniza"
De acordo com as
denúncias feitas pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso, o massacre
de Abril de 2017 foi perpetrado por um gangue que queria assustar os locais para
os obrigar a abandonar as terras que queriam ocupar e delas extrair recursos
naturais valiosos.
Um mês depois do
crime, o Ministério Público abriu um processo contra Valdelir João Souza e mais
quatro homens. Valdelir era trabalhador da indústria pecuária e proprietário de
duas empresas madeireiras. Depois das acusações, Souza fugiu das autoridades,
encontrando-se a monte há dois anos.
Em Abril de 2018
as quintas de Três Lagoas e Piracama, no estado de Rondônia, foram registadas
no nome de Valdelir Souza. Em Maio, a quinta de Três Lagoas transferiu
ilegalmente 143 animais fêmeas para a fazenda de Maurício Narde e, 11 minutos
depois, a quinta transferiu 143 animais com as mesmas características para o
matadouro da JBS. Contactado pelo jornal britânico The Guardian, Maurício Narde
confirmou o negócio repentino, mas não explicou o porquê de o ter feito.
Poucos meses
depois, em Junho de 2018, Souza voltou a negociar 153 bovinos com a quinta de
Morro Alto, de José Carlos de Albuquerque, um dos fornecedores da JBS e da
Marfrig. Contactado pela Repórter Brasil, Albuquerque afirmou que o rebanho de
Souza estava habilitado para venda e com a documentação sanitária em dia.
Na reacção à
investigação do Repórter Brasil, a JBS diz que é “irresponsável qualquer tentativa
de vinculação da empresa à pessoa mencionada pela reportagem, que nunca esteve
em sua lista de fornecedores” e que “não adquire animais de quintas envolvidas
com desmatamento de florestas nativas, invasão de terras indígenas ou áreas de
conservação ambiental”. Ao Guardian, a Marfrig não fez comentários, remetendo
para uma informação enviada em Dezembro ao jornal: 53% do seu gado da Amazónia
vem de fornecedores indirectos.
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