Ministra das Finanças: “Os desafios
vão ser ainda maiores”
3/7/2014, 6:34 /Nuno André
Martins / OBSERVADOR. http://observador.pt/2014/07/03/austeridade-e-restricoes-sao-para-continuar-ministra-das-financas/
Maria Luís Albuquerque escreve, em artigo de opinião, que os desafios
depois da saída da troika serão ainda maiores. Porque o país tem falhado mais
quando acabam os períodos mais críticos.
Ministra das Finanças: uma crítica forte a quem pede reestruturação da
dívida
Portugal vai
enfrentar, “em grande medida”, desafios maiores no período pós-troika do que os
que tem enfrentado nos últimos anos e tem de ter presente que as restrições e a
austeridade vão continuar, escreve a ministra das Finanças num artigo de
opinião que vai ser publicado na próxima semana.
No artigo de duas
páginas, escrito para a nova revista ‘Plano_’, Maria Luís Albuquerque não poupa
os anteriores governos, em especial o de José Sócrates, a resposta inicial da
União Europeia à crise das dívidas soberanas, e os partidos que agora pedem a
reestruturação da dívida pública portuguesa, mas deixa principalmente um aviso:
a troika saiu, mas as restrições têm de continuar.
“O perigo é se
nos iludirmos agora e pensarmos que podemos voltar a não ter restrições, que já
passou e que não é preciso manter a austeridade”, escreve a ministra, que diz
ainda que Portugal tem demonstrado grande capacidade de mobilização em períodos
críticos, mas que tem falhado depois disso: “A história do país desde 1974
demonstra uma enorme capacidade de mobilização e realização em momentos chave,
mas que parece ser difícil manter depois dos períodos mais críticos”.
“É precisamente
agora, que se conclui o programa de ajustamento e que podemos ultrapassar o
estigma que as dificuldades fizeram recair sobre Portugal, que somos
verdadeiramente postos à prova. A nossa capacidade de não desperdiçar os
progressos alcançados, de manter a disciplina das contas públicas, de
prosseguir as reformas estruturais, de continuar a apostar nas vantagens de uma
economia aberta sem setores protegidos que reduzam a competitividade, determina
o nosso futuro coletivo”, escreve.
A governante faz
então uma ronda de críticas ao que considera ter corrido mal. Em primeiro lugar
a gestão do país após aceder ao euro: “Conseguimos cumprir os critérios de
convergência para integrar a moeda única desde o primeiro momento. Mas desde
essa altura, as coisas começaram a correr menos bem e algumas das causas vêm de
trás”.
“Paradoxalmente,
acreditamos que união económica e monetária nos protegeria dos problemas de
excesso de endividamento, mas que permitiria ao mesmo tempo proteger da
concorrência os setores não transacionáveis”, escreve.
Do processo de
ajustamento dos últimos anos, a ministra reconhece um problema de gestão
política, que diz ter resultado da imagem que se criou nos países do norte de
que os da periferia seriam indisciplinados: “Criou-se, e alimentou-se, nos
países do norte da Europa a ideia de que os países da periferia, em especial os
do sul, seriam indisciplinados, pouco trabalhadores e que, de alguma forma,
tinham recorrido a expedientes pouco sérios para parecer que cumpriam os
critérios da moeda única”. Esta será, diz Maria Luís Albuquerque, “a maior
queixa que podemos ter dos nossos parceiros, se não a única” — porque foi isto
que criou “uma dificuldade na gestão política dos programas de ajustamento”.
O anterior
Governo é também ele alvo de severas criticas. Segunda a ministra, “a crise
financeira de 2007 não foi a causa dos problemas de Portugal, apenas expôs a
fragilidade da nossa aparente prosperidade” e a primeira reação a esta crise,
desenhada na altura pelo Governo de José Sócrates, só veio fazer pior e tornar
inevitável o resgate.
“A primeira
reação à crise veio agravar ainda mais o problema. Aplicar a Portugal as
medidas de combate à depressão da procura que faziam sentidos noutros países
foi um erro trágico. (…) Rapidamente ultrapassámos o ponto de não-retorno,
tornando inevitável o pedido de resgate, e piorando a situação com a recusa em
aceitar essa inevitabilidade. Não tenhamos ilusões, a decisão de aumentar a
despesa pública não deixou outro caminho”, escreve.
A oposição, e
outros que têm feito a defesa da reestruturação da dívida pública, também são
alvo de Maria Luís Albuquerque.
A ministra
defende que sem o financiamento associado ao resgate “a dureza do ajustamento
teria sido incomparavelmente maior” e que “são as poupanças de outros que
sustentam este crédito. (…) Ao contrário do que se tenta fazer passar, a
maioria dos investidores na dívida pública portuguesa não são especuladores,
são fundos de pensões, gestores de ativos, bancos centrais, fundos soberanos, a
que se juntam os pequenos aforradores nacionais”.
“Por que razão
tanta gente parece achar legítimo que defraudemos as suas legítimas expetativas
para não afetar as nossas é muito difícil de compreender”, diz, defendendo um
debate onde é feita a “ponderação dos verdadeiros custos e benefícios de cada
escolha”.
Há ainda espaço
para uma crítica aos líderes europeus: “No início da crise das dívidas
soberanas na área do euro, há que reconhecer que a gestão política não foi bem
conseguida. No que diz respeito ao Governo, a ministra diz, no entanto que, que
tem “a enorme convicção que este é o caminho certo” .
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