sexta-feira, 4 de setembro de 2020

Turismo europeu cai 75% em quatro meses // O crescimento do turismo de massas e do low-cost flying é profundamente criminoso, por ANTÓNIO SÉRGIO ROSA DE CARVALHO

  


TURISMO

Turismo europeu cai 75% em quatro meses


No sector, a maior quebra de vendas registou-se nas agências de viagens e operadores turísticos, com menos 83,6% em Junho em comparação com Fevereiro.

 

Rita Robalo Rosa 4 de Setembro de 2020, 12:46

https://www.publico.pt/2020/09/04/economia/noticia/turismo-europeu-cai-75-quatro-meses-1930371

 

O sector dos serviços de turismo caiu 75% na União Europeia (UE) em Junho de 2020, face a Fevereiro do mesmo ano, último mês antes da economia mundial ser afectada pela pandemia de covid-19, segundo dados divulgados esta sexta-feira pelo Eurostat.

 

No geral, todos os sectores dos serviços da UE viram o seu volume de negócios decrescer nesse período, havendo uma queda de 16,4% entre Fevereiro e Junho no total. Contudo, foi o turismo que se destacou pela negativa naquele que costuma ser o mês em que a época alta se inicia na Europa.

 

Dentro do turismo, a maior quebra deu-se nas agências de viagens e operadores turísticos, com menos 83,6%, seguidos pelos transportes aéreos (-73,8%), alojamento (-66,4%) e restaurantes (-38,4%), indica o gabinete estatístico europeu.

 

Ainda assim, houve uma recuperação em Junho face a Abril em diversos sectores como a restauração (sector que em 2017 teve um peso de 1,6% no valor acrescentado bruto (VAB) europeu, mais precisamente 96,4 mil milhões de euros) e o alojamento (1,3% do VAB em 2017, com 79 mil milhões). De notar que, em Abril, a maioria dos países europeus estava em confinamento, com Portugal ainda a estado de emergência, decretado em meados de Março.

 

Em comparação com Abril de 2020, em Junho, o sector do transporte aéreo teve uma ligeira recuperação. Já o sector das agências de viagens e operadores turísticos encontrava-se em Junho no mesmo nível que estava em Abril. Quer o transporte aéreo, quer as agências de viagem e operadores turísticos têm menor impacto na economia visto que representavam, em 2017, aproximadamente 0,5% e 0,3% do VAB europeu - o que não significa que a quebra acentuada não seja intensa para a economia europeia.

 

No que diz respeito ao emprego, entre os sectores analisados pelo Eurostat, o que tinha menos peso era o transporte aéreo, correspondendo a 0,2% do emprego na Europa em 2017. Já os restaurantes e alojamento representavam 4% e 1,9%, respectivamente, dos postos de trabalho da UE.





OPINIÃO

O crescimento do turismo de massas e do low-cost flying é profundamente criminoso

 

O Bureau de Turismo de Amsterdão passou a dedicar-se precisamente ao oposto da sua função original. Ou seja a sua nova função será o desencorajamento do turismo.

 

ANTÓNIO SÉRGIO ROSA DE CARVALHO

31 de Maio de 2019, 21:44

https://www.publico.pt/2019/05/31/local/opiniao/gestao-efeitos-globalizacao-turistificacao-gentrificacao-imagem-efectividade-credibilidade-democracia-1873037

 

As viagens aéreas low cost permitiram o acesso a uma inédita mobilidade, traduzida num verdadeiro ‘tsunami’ turístico, que invadiu de forma avassaladora, as cidades europeias.

 

O termo ‘invasão’ é aqui utilizado de forma consciente, pois os efeitos negativos na ecologia urbana, e as alterações dos seus equilíbrios locais, são nitidamente reconhecíveis e visíveis, e já foram vezes sem conta, diagnosticadas.

 

 O que, sim, é intuitivamente sentido, mas nunca diagnosticado, são os efeitos erosivos resultantes da exposição permanente e diária dos cidadãos a um caos e anarquia sem gestão, onde os seus direitos básicos e fundamentais, nas áreas da segurança e sossego, direito à habitação, custo de vida, direito ao transporte etc., ou seja, o espaço vital de sobrevivência e vida e da identidade são postos em causa.

 

E aqui, chegamos ao prestígio e credibilidade da imagem da Democracia e da efectividade da sua gestão.

 

Desta vez, em vez, de falarmos de Lisboa, vamos deslocarmo-nos a Amsterdão, cidade que habito e experimento na vida quotidiana.

 

Amsterdão é importante pois devido à sua pequena escala e espaço disponível limitado, transformou-se num laboratório directo, in extremis, destes desafios. Mais ainda do que Veneza pela simples razão que Amsterdão, apesar do êxodo motivado pelas tensões diárias das suas vivências e pela expulsão dos habitantes locais devido à espiral de especulação imobiliária, ainda é habitada por um milhão de pessoas.

 

Em Outubro de 2018 foi tomada uma decisão do mais alto valor simbólico e que representa uma viragem radical da concepção da gestão do Turismo. A autarquia decidiu retirar do ponto estratégico e emblemático, em frente ao Rijksmuseum, em Dezembro de 2018, o famoso letreiro I AMSTERDAM, e anunciou que as verbas destinadas à promoção do turismo iriam ser reduzidas, e o respectivo Bureau do Turismo iria a partir desse momento dedicar-se à gestão distributiva do mesmo turismo.

 

Por outras palavras, o Bureau iria dedicar-se precisamente ao oposto da sua função original. Ou seja a sua nova função será o desencorajamento do turismo.

 

A nova alcaide de Amsterdão,  Femke Halsema, abriu e definiu várias frentes de urgente regulação; rigoroso regulamento para o Alojamento Local, forte limitação do turismo no red light district, novo regulamento limitativo para a navegação nos canais, etc.

 

A cidade de Amsterdão está, por falta de espaço e por um crescente número de pessoas a utilizarem este limitado espaço de forma autista, egocêntrica e anárquica, a ‘rebentar pelas costuras’.

 

Para especificar apenas através de um exemplo. O trânsito em Amsterdão é dominado pelas muitas centenas de milhares de ciclistas que circulam numa rede bem desenvolvida de ciclovias. Nos últimos anos, estas ciclovias foram também invadidas por scooters. Isto, e o facto de que estes ciclistas, motorizados ou não, frequentemente não respeitarem os sinais de trânsito, invadirem os passeios, e demonstrarem uma indiferença egocêntrica que põe em perigo permanente os peões (muitas tensões hostis entre habitantes e especialmente com turistas que não estão habituados às ‘regras’ arbitrárias da ‘roleta russa’) levou a situação a um ponto de ruptura. Assim foi estabelecido que a partir de 8 de Abril não seria permitido às scooters circularem nas ciclovias e seria obrigatório o uso de capacete, estabelecendo-se um período de tolerância de dois meses. O problema é que, sem fiscalização, quase ninguém respeita as regras pois Amsterdão, durante o ciclo neoliberal de privatização e de desconstrução das instituições centrais do Estado, fechou muitas esquadras de polícia.

 

Quando os efeitos múltiplos destes fenómenos resultantes de uma conjugacão de factores globalizadores (turismo de massa tornado possível pelo low-cost flying,  falta de espaço, destruição da identidade e autenticidade local através de uma actividade monofuncional, expulsão dos habitantes locais devido a uma espiral especulativa, etc.) atingem o ponto de uma ‘tempestade perfeita’, aí, como em Veneza, torna-se impossível negar o crescer da irritação e da hostilidade dos habitantes e as tensões tornam-se bem visíveis e explícitas.

 

 Neste ponto de malaise a atitude liberal de laissez faire, laissez passer torna-se insustentável do ponto de vista político e as autarquias são confrontadas com um crescente cepticismo por parte dos habitantes locais que se sentem cada vez menos representados nas suas ansiedades e desesperam com a ausência de uma autoridade central reguladora e de referência estimulante de pedagogia democrática.

 

Em Democracia, ‘A Sua Liberdade Termina Quando Começa a do Outro’.

 

As cidades são também ecosistemas e portanto não podem comportar o conceito de crescimento ilimitado. A salvaguarda dos equilíbrios da civilitas na ecologia urbana precisa de uma regulação e vigilância permanente por parte de uma autoridade central responsável e portadora de uma visão estratégica.

 

O nosso futuro vai ser de forma crescente dominado pelo desafio ecológico e pelas alterações climáticas. Nesta perspectiva, o crescimento do turismo de massas e do low-cost flying não é só insustentável mas é profundamente criminoso.

 

Portanto não é de espantar que a implementação de impostos nos bilhetes e no combustível no transporte aéreo é urgentemente necessária e inevitável


A Europa vai reunir-se sobre esta questão em Junho.

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