sábado, 11 de abril de 2020

Coronavirus: EU could fail over outbreak, warns Italy's Giuseppe Conte -... / Depois das palmas, soaram agora as críticas ao pacote aprovado no Eurogrupo




UNIÃO EUROPEIA
Depois das palmas, soaram agora as críticas ao pacote aprovado no Eurogrupo

Ministros das Finanças assinaram acordo mas não mudaram de opinião: a fractura entre os países do Norte e do Sul mantém-se. Questões que justificaram impasse das negociações não foram resolvidas.

Rita Siza
Rita Siza , Bruxelas 10 de Abril de 2020, 19:42

Não durou muito a trégua alcançada pelos ministros das Finanças da União Europeia após uma longuíssima reunião do Eurogrupo, que se prolongou por três dias e culminou com o anúncio de um “excelente acordo” para uma resposta económica conjunta, “ambiciosa” e “robusta”, à crise profunda provocada pela pandemia de coronavírus no continente. “São biliões e biliões de euros. Não há precedentes”, resumiu o presidente do Eurogrupo, Mário Centeno.

Na manhã seguinte, as reacções eram bem menos entusiásticas. O plano europeu, alavancado em empréstimos e garantias no valor de 500 mil milhões de euros para a assistência financeira dos Estados membros, a liquidez das empresas e a protecção dos postos de trabalho, era criticado por eurodeputados de diversas bancadas como inadequado, insustentável ou insuficiente — até o presidente do Parlamento Europeu, David Sassoli, que aplaudiu o acordo alcançado no Eurogrupo, sublinhou que será preciso ir muito mais além. “Os chefes de Estado e de governo têm de ser corajosos e actuar com base na estimativa do Banco Central Europeu de que serão precisos mais do que 1,5 biliões de euros para a reconstrução”, considerou.

Depois de horas e horas de debates técnicos e políticos sobre o recurso ao Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE) e à disponibilização do seu “poder de fogo” para o financiamento urgente dos países, os líderes preferiram virar a página e desviar a sua atenção para o futuro, posicionando-se já para os próximos embates: uma nova cimeira europeia por videoconferência, agendada para 23 de Abril, e a posterior negociação do plano de relançamento e recuperação da economia europeia e do próximo quadro financeiro plurianual para 2021-27, que vão envolver o Conselho e a Comissão Europeia.

“É chegado o momento para lançar as bases da nossa recuperação. Estou a trabalhar com a presidente da Comissão Europeia num plano de acção para relançar a economia e promover a convergência, através do crescimento sustentável e inclusivo baseado na nossa estratégia verde e digital”, informou o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, em comunicado.

Quanto à solução encontrada para desfazer o impasse relativo à linha de crédito cautelar do MEE — a sua limitação à despesa directa ou indirectamente ligada ao sector da saúde, com a aceitação de uma condicionalidade macroeconómica light, enquadrada pelos instrumentos do Semestre Europeu — as opiniões dividiram-se. David Sassoli considerou a solução “muito útil”, por facilitar os investimentos nas unidades, equipamentos e pessoal hospitalares, na investigação de tratamentos ou curas para a covid-19 e nas regiões mais atingidas pela pandemia.

“Claro que nenhum país será obrigado a utilizar este recurso: ele existe como uma opção adicional”, assinalou. Em declarações ao PÚBLICO, o secretário de Estado Adjunto e das Finanças, Ricardo Mourinho Félix, confirmou que Portugal deverá ser um dos países a prescindir, para já, deste apoio (que, segundo a fórmula prevista, poderia garantir até 4000 milhões de euros de crédito ao país). Como explicou, o interesse desta linha é servir como um “mecanismo de seguro” que protege os países na eventualidade de se depararem com dificuldades em financiarem-se no mercado. “Como qualquer seguro, é algo que compramos para não ter de usar”, justificou.

Já Sassoli apresentou o argumento para que países como a sua Itália utilizem o fundo de resgate do euro, agora “reconvertido” para o apoio de emergência sanitária. “A Itália já pagou 14 mil milhões de euros para este fundo, e agora pode receber 37 mil milhões, sem restrições nem condições desagradáveis”, assinalou.

De resto, bastou uma noite de sono para se perceber que as divergências que dificultaram as negociações, e quase impediram um consenso ao nível do Eurogrupo, continuam por resolver. As fracturas entre o Norte e o Sul da Europa eram evidentes nas diferentes leituras que o anúncio do acordo suscitou. “Vitória”, assinalavam os títulos dos jornais dos Países Baixos, ecoando as declarações do ministro das Finanças, Wopke Hoekstra, para quem o desfecho da “batalha” do seu país na Europa não podia ter sido mais “razoável”. “Traição”, gritava a oposição italiana, e em particular o líder da Liga, Matteo Salvini, que prometeu submeter a confiança no ministro das Finanças, Roberto Gualtieri, à votação do parlamento, por alegadamente ter aceitado um compromisso que vai contra o interesse nacional.

O acordo só surgiu porque os governantes decidiram riscar da ordem do dia a discussão da mutualização da dívida, através da emissão de títulos conjuntos, os chamados “coronabonds”. Mas isso não impediu que a discussão entre os governantes corresse à margem do encontro, na arena mediática, inquinando qualquer compromisso. “Às vezes é preciso bater o pé”, comentava Wopke Hoekstra no fim da reunião, garantindo que essa linha vermelha (partilhada com a Alemanha, a Áustria e a Finlândia) jamais será ultrapassada.

Mas Mário Centeno manteve uma porta aberta para o debate, ao conseguir que os líderes subscrevessem um caderno de encargos preliminar para o trabalho de Charles Michel e Ursula von der Leyen. “Concordamos que é preciso desenhar um fundo de recuperação que possa acelerar o investimento”, dizem as conclusões da reunião, que deixam explícitas as diferentes visões dos Estados membros relativamente a esse futuro instrumento financeiro “inovador”. “Alguns entendem que deve passar pela emissão conjunta de dívida, outros querem encontrar outras alternativas”, assumiu Centeno. O impasse continua.

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