sexta-feira, 17 de abril de 2020

American Democracy May Be Dying. NYT / Covid-19: Sobrevive a democracia ao coronavírus? Público




Opinion
American Democracy May Be Dying

Authoritarian rule may be just around the corner.

By Paul Krugman
Opinion Columnist
April 9, 2020

Wisconsin Republican leaders gave citizens a choice on Tuesday: give up their vote or go to the polls and risk their and their neighbors’ health.

If you aren’t terrified both by Covid-19 and by its economic consequences, you haven’t been paying attention.

Even though social distancing may be slowing the disease’s spread, tens of thousands more Americans will surely die in the months ahead (and official accounts surely understate the true death toll). And the economic lockdown necessary to achieve social distancing — as I’ve been saying, the economy is in the equivalent of a medically induced coma — has led to almost 17 million new claims for unemployment insurance over the past three weeks, again almost surely an understatement of true job losses.

Yet the scariest news of the past week didn’t involve either epidemiology or economics; it was the travesty of an election in Wisconsin, where the Supreme Court required that in-person voting proceed despite the health risks and the fact that many who requested absentee ballots never got them.

Why was this so scary? Because it shows that America as we know it may not survive much longer. The pandemic will eventually end; the economy will eventually recover. But democracy, once lost, may never come back. And we’re much closer to losing our democracy than many people realize.

To see how a modern democracy can die, look at events in Europe, especially Hungary, over the past decade.

Paul Krugman’s Newsletter: Get a better understanding of the economy — and an even deeper look at what’s on Paul’s mind.

What happened in Hungary, beginning in 2011, was that Fidesz, the nation’s white nationalist ruling party, took advantage of its position to rig the electoral system, effectively making its rule permanent. Then it further consolidated its control, using political power to reward friendly businesses while punishing critics, and moved to suppress independent news media.

Until recently, it seemed as if Viktor Orban, Hungary’s de facto dictator, might stop with soft authoritarianism, presiding over a regime that preserved some of the outward forms of democracy, neutralizing and punishing opposition without actually making criticism illegal. But now his government has used the coronavirus as an excuse to abandon even the pretense of constitutional government, giving Orban the power to rule by decree.

If you say that something similar can’t happen here, you’re hopelessly naïve. In fact, it’s already happening here, especially at the state level. Wisconsin, in particular, is well on its way toward becoming Hungary on Lake Michigan, as Republicans seek a permanent lock on power.

The story so far: Back in 2018, Wisconsin’s electorate voted strongly for Democratic control. Voters chose a Democratic governor, and gave 53 percent of their support to Democratic candidates for the State Assembly. But the state is so heavily gerrymandered that despite this popular-vote majority, Democrats got only 36 percent of the Assembly’s seats.

And far from trying to reach some accommodation with the governor-elect, Republicans moved to effectively emasculate him, drastically reducing the powers of his office.

Then came Tuesday’s election. In normal times most attention would have been focused on the Democratic primary — although that became a moot point when Bernie Sanders suspended his campaign. But a seat on the State Supreme Court was also at stake.

Yet Wisconsin, like most of the country, is under a stay-at-home order. So why did Republican legislators, eventually backed by the Republican appointees to the U.S. Supreme Court, insist on holding an election as if the situation were normal?

The answer is that the state shutdown had a much more severe impact on voting in Democratic-leaning urban areas, where a great majority of polling places were closed, than in rural or suburban areas. So the state G.O.P. was nakedly exploiting a pandemic to disenfranchise those likely to vote against it.

What we saw in Wisconsin, in short, was a state party doing whatever it takes to cling to power even if a majority of voters want it out — and a partisan bloc on the Supreme Court backing its efforts. Donald Trump, as usual, said the quiet part out loud: If we expand early voting and voting by mail, “you’d never have a Republican elected in this country again.”

Does anyone seriously doubt that something similar could happen, very soon, at a national level?

This November, it’s all too possible that Trump will eke out an Electoral College win thanks to widespread voter suppression. If he does — or even if he wins cleanly — everything we’ve seen suggests that he will use a second term to punish everyone he sees as a domestic enemy, and that his party will back him all the way. That is, America will do a full Hungary.

What if Trump loses? You know what he’ll do: He’ll claim that Joe Biden’s victory was based on voter fraud, that millions of illegal immigrants cast ballots or something like that. Would the Republican Party, and perhaps more important, Fox News, support his refusal to accept reality? What do you think?

So that’s why what just happened in Wisconsin scares me more than either disease or depression. For it shows that one of our two major parties simply doesn’t believe in democracy. Authoritarian rule may be just around the corner.



ANÁLISE CORONAVÍRUS
Covid-19: Sobrevive a democracia ao coronavírus?

“A democracia, uma vez perdida, não voltará mais”, avisa o Nobel Paul Krugman. “Viktor Orbán e Xi Jinping apenas serão o futuro do Ocidente na imaginação de fazedores de opinião instantânea”, responde o alemão Josef Joffe.

JORGE ALMEIDA FERNANDES
18 de Abril de 2020, 6:25
https://www.publico.pt/2020/04/18/mundo/analise/covid19-sobrevive-democracia-coronavirus-1912817


Avisou há dias Paul Krugman, Nobel da Economia: “A democracia americana pode estar a morrer.” A Covid-19 e as suas consequências económicas são aterradoras. O pior está ainda para vir. Escreve no New York Times: “Por que é tão assustador? Porque mostra que a América que conhecemos pode não sobreviver por muito tempo. A pandemia acabará; a economia pode finalmente recuperar. Mas a democracia, uma vez perdida, não voltará mais. Estamos mais perto de perder a nossa democracia do que muitas pessoas imaginam.”

As pessoas reconhecem que, em si mesma, não é a “peste” que muda os regimes. A virulência da pandemia criaria, sim, um terreno favorável ao nacional-populismo e às pulsões autoritárias. A “democracia iliberal” de Viktor Orbán ou a de Jaroslaw Kaczynski, na Polónia, seria o nosso horizonte. O gradual processo de corrosão das instituições democráticas culminaria agora, graças à pandemia, em regimes descaradamente autoritários. O “estado de emergência”, imposto para conter o contágio do vírus, seria um pretexto para sacrificar as liberdades à segurança.

Nos Estados Unidos, esse processo foi desencadeado pela eleição de Donald Trump. “Trump está todos os dias a atacar as instituições democráticas dos EUA e, lentamente, está a desmantelá-las”, declarou há dias ao PÚBLICO o politólogo americano Daniel Ziblatt, autor, com Steven Levitsky, do livro Como morrem as democracias. (edição Vogais)

A visão pessimista
Trump não enganou ninguém. Logo em 2016, dias após a eleição, o politólogo Stephen Walt publicou na Foreign Policy um artigo intitulado: Dez formas de saber se o seu Presidente é um ditador. Em Fevereiro de 2020, Walt fez uma verificação dos mesmos dez pontos e concluiu: “Depois do impeachment, o Presidente passou na maior parte dos testes do caminho para o autoritarismo.”

A pandemia colocou Trump perante uma situação inesperada. A contagem dos mortos, a subida vertical do desemprego e a perspectiva de recessão económica põem em xeque toda a sua estratégia para a reeleição. Como resposta, ocupa os ecrãs diariamente, ameaçando ou dizendo disparates que desmente do dia seguinte. Em contraponto, o democrata Joe Biden é quase remetido ao silêncio, o que é uma pesada desvantagem.

Os últimos dias foram frenéticos. Trump atacou em todos os azimutes. Denunciou os media, em termos mais agrestes que o habitual, recusou qualquer responsabilidade nos erros cometidos, abriu fogo sobre a Organização Mundial de Saúde, ou seja, reinventou o “inimigo externo”, desafiou os governadores sobre a “reabertura económica”, ameaçando retirar-lhes as suas prerrogativas constitucionais e proclamando: “Quando alguém é o Presidente” dos Estados Unidos, a autoridade é total. E é assim que tem de ser.” Na mesma linha, desafiou a seguir o Senado.

Trump tem de manter o espectáculo. De manhã, lança um tweet dizendo que está na hora de despedir Antonhy Fauci, o conselheiro científico para a epidemia, para logo a seguir o chamar ao palanquim numa conferência de imprensa. Fauci continuará certamente a desmentir com factos o que o Presidente diz contra os factos. Que importa? Na quinta-feira à noite, Trump esqueceu-se do que dissera sobre os poderes dos governadores reconhecendo a sua competência para determinar o fim da quarentena.

Há duas realidades em choque. Por um lado, o coronavírus está a arruinar a presidência de Trump, associando a pandemia e uma recessão que os seus adeptos vão sofrer na pele. Por outro lado, depois de uma liderança catastrófica da pandemia, tem de se servir dela para refazer a sua campanha: mostrar-se como o Presidente que toma as medidas decisivas. “A sua audácia mascara o desespero”, escreve o jornal Politico. Responde, no mesmo jornal, uma antiga conselheira eleitoral: “Nunca subestimem Donald Trump.” Poderá transformar-se a epidemia numa “oportunidade” para Trump?

Krugman é um irredutível pessimista. Se Trump vencer as eleições? “A América será uma perfeita Hungria.” E se as perder? Denunciará a vitória de Biden como uma fraude e recorrerá a todos os meios para recusar a realidade. O que poderia arrastar a decisão para o Supremo Tribunal.

Walt sublinha o desgaste das instituições e conclui: “É impossível falhar a ironia da presente situação. Os americanos gastaram 25 anos a tentar espalhar a democracia em vários lugares improváveis e com escasso sucesso. O verdadeiro desafio, surpreendentemente, será termos a certeza de que a não perdemos em casa.”

A relativização da ameaça
Remando contra a maré do pessimismo e pensando sobretudo na Europa, o ensaísta Josef Joffe, antigo director do semanário alemão Die Zeit, respondeu na quinta-feira no American Interest: “As emergências nacionais no Ocidente não alimentam déspotas e são de curta duração. A imprensa devia tomar nota disto.” 

Contesta a pertinência dos precedentes húngaro e polaco. “A deriva do Fidesz de Orbán para um regime de partido único data de 2011. O corona [vírus] foi apenas a cereja no bolo. O mesmo na Polónia, onde os irmãos Kaczynski começaram a desmantelar o Estado de Direito em 2006. O corona não pode explicar hoje o que começou ontem.”

Quanto às “emergências”, lembra que, depois de Pearl Harbor, o Presidente Franklin Roosevelt dispôs de poderes quase ditatoriais. E as emergências não são um cheque em branco e reúnem um vasto consenso. Na Alemanha, 93% dos cidadãos aprovam o confinamento parcial. O mesmo na Itália, na França ou nos Estados Unidos. Trump comete abusos mas é difícil acusá-lo de estar a preparar um golpe de Estado, argumenta Joffe.

Poderia acrescentar que os primeiros meses da epidemia na Europa não estão a ser capitalizados pelas correntes nacional-populistas, bem pelo contrário.

Os “mercadores da angústia”, prossegue Joffe, ignoram outras coisas cruciais. Um pouco de História ajudaria. “O Estado liberal dá mais do que tira. Em flagrante contraste com os anos 1930, quando as massas miseráveis alimentaram a ascensão dos tiranos, o Estado Providência ocidental gasta triliões para diminuir o sofrimento e salvaguardar o futuro da economia. (…) Viktor Orbán e Xi Jinping apenas serão o futuro do Ocidente na imaginação de fazedores de opinião instantânea.” 

O mundo continuará a rodar em torno do coronavírus e o debate do autoritarismo mal começou.

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