“Este é um museu de grandes esperanças e eu quero ver aquela praça cheia, quero que ele participe da alegria do lugar."
Paulo Mendes da Rocha.
Por enquanto é uma praça vazia onde o vento uiva … e símbolo de um despesismo irresponsável num País falido, determinado pela vaidade de políticos e egos no Star System Arquitectónico.
Pode ser que possa ser simbólicamente inaugurado numa data futura incerta por “Aquele cujo nome não pode ser pronunciado” para festejar o seu regresso …
Antonio Sérgio Rosa de Carvalho.
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O arquitecto brasileiro Paulo Mendes da Rocha na praça do museu |
O Museu dos Coches abriu por um dia: só falta ver "se o povo gosta"
Por Lucinda Canelas in Público
27/03/2013
"Agora só faltam mesmo os carros de luxo de há muitos séculos", diz o arquitecto Paulo Mendes da Rocha. Para que o museu abra é preciso a exposição e a ponte pedonal que o liga ao rio. Mas a obra está parada há nove meses
Uma longa fila à porta e o átrio repleto de largas dezenas de arquitectos, alunos e professores de arquitectura, com câmaras fotográficas ao pescoço. Os seguranças não esperavam uma tarde tão concorrida. Cá fora, olhando para todas aquelas pessoas, Paulo Mendes da Rocha sorri e reconhece estar ansioso por ver as portas abertas. Não por um dia, mas para sempre. "Quanta gente... A praça fica bem mais bonita quando tem gente, não é?"
O arquitecto brasileiro, autor do projecto do novo Museu Nacional dos Coches, em Lisboa, feito em parceria com o português Ricardo Bak Gordon, quer sentir que "Lisboa entra" pela praça que criou, quer ver os "maravilhosos coches dourados, bem iluminados, naquele imenso espaço branco das galerias" e, sobretudo, quer saber "se o povo gosta".
Mendes da Rocha esteve ontem a percorrer o grande edifício de Belém, numa visita técnica com Bak Gordon, Nuno Sampaio, autor da proposta museográfica, e Rui Furtado, o engenheiro responsável pela obra. Percorrendo os dois edifícios ligados por uma ponte - o pavilhão expositivo, composto por duas galerias de 2700 metros quadrados cada, e o edifício anexo, onde ficarão o auditório, os serviços administrativos e o restaurante - os autores do projecto foram explicando as suas opções e conduzindo os visitantes naquilo a que Sampaio chamou "um exercício de imaginação".
Foi preciso imaginar que os dois grandes espaços de exposição permanente, que serão ocupados por uma colecção de coches única no mundo, estavam já habitados. Foi preciso imaginar que dos passadiços das duas naves se podem ver, como se de verdadeiras peças de escultura se tratassem, as delicadas berlindas de D. Maria I e as liteiras do século XVIII, o coche de viagem de Filipe II e os da sumptuosa embaixada ao papa Clemente XI. "A arquitectura é isso no começo - imaginação", diz Mendes da Rocha ao PÚBLICO, explicando em seguida que usou uma técnica pouco convencional para pensar nas dimensões que deveriam ter as galerias de exposição, hoje com um pé direito de 7,5 metros e 17 de largura: "Estava desenhando e comecei a pensar que espaço seria preciso para que pudéssemos movimentar os coches, para que pudéssemos rodeá-los. E de repente lembrei-me, ao olhar na janela, que podia medir a largura da minha rua, que tem sempre carros estacionados. Fui lá em baixo e contei: 20 passos, 20 metros. Aqui fizemos um pouco menos na largura e na altura para manter o orçamento previsto [31 milhões de euros]."
Mendes da Rocha vai parando muitas vezes para dar autógrafos e tirar fotografias com os estudantes, como se fosse uma estrela pop. "Todo mundo fotografando e ninguém desenhando", repara.
Muitas das opções do programa arquitectónico, diz Bak Gordon, decorreram, como seria de esperar, da própria natureza da colecção. A luz que vem das janelas, por exemplo (as galerias têm apenas dois estreitos rasgões a toda a largura), tem de ser muito reduzida. "O pavilhão expositivo é muito mais opaco, porque, por questões de conservação, os coches não podem receber muita luz natural", explica o arquitecto.
Nuno Sampaio, também director da Estratégia Urbana, associação do Porto que no Verão leva a São Paulo uma grande embaixada da arquitectura portuguesa (ver caixa), diz que isto só foi possível porque os projectos de museografia e de arquitectura foram desenvolvidos ao mesmo tempo. "Os coches vão estar organizados por núcleos, mas as galerias têm propositadamente paredes muito amplas onde poderão ser projectados filmes e animações", acrescenta Sampaio. A ideia é que pelas galerias haja imagens e "chuvas de sons" capazes de criar ambiente. Um coche a entrar num palácio, com o barulho que as rodas fariam na terra ou gravilha, imagens de palácios e cavalos em corrida. "Mas isso ficará agora a cargo de quem fizer o programa da exposição. Nós demos ideias, até porque o arquitecto Mendes da Rocha sempre nos disse que imaginava o museu com uma certa ligação ao cinema."
"Você conhece aquele filme de Mastroianni sobre Casanova [Casanova e a Revolução, Ettore Scola, 1982]? Há coches por todo o lado. Os choches fazem-me pensar em cinema, ficam muito bem na tela", disse ao PÚBLICO Mendes da Rocha, Prémio Pritzker em 2006.
No fim de 2014?
O "exercício de imaginação" que os autores do projecto promoveram ontem no novo espaço é para já o único possível. O programa está a ser preparado pela equipa do museu, mas a Secretaria de Estado da Cultura (SEC) e a sua Direcção-Geral do Património Arquitectónico (DGPC) têm optado por guardá-lo em segredo. Em segredo, ao que parece, estão também as causas que levam a obra a estar parada há nove meses, sem que se saiba ainda quando pretende a SEC começar a instalar a exposição e dar luz verde à construção do passeio pedonal e ciclável que deverá ligar o novo complexo arquitectónico, que Bak Gordon espera venha a ter 600 mil visitantes por ano, e o passeio ribeirinho.
"Há dois anos que têm os projectos nas mãos para a montagem da exposição e para o passeio e desde Junho que tudo está parado", disse o engenheiro Rui Furtado. O novo museu, garante a equipa que o projectou e construiu, poderia estar já inaugurado, se os prazos para a instalação da colecção tivessem sido tão rigorosamente cumpridos como os da obra. "O dinheiro para a conclusão dos trabalhos existe, está no Turismo de Portugal, e o passeio que parte da praça do museu está já começado", acrescenta o engenheiro.
O PÚBLICO tentou ontem, sem sucesso, falar com a directora-geral do Património e o presidente do Turismo de Portugal. Por que está a obra parada se, ao que tudo indica, os seus custos estão assegurados? Por que razão não se avançou já com a instalação da colecção se as galerias estão prontas a recebê-la?
Jorge Barreto Xavier, secretário de Estado da Cultura, garantiu ontem de manhã que o museu será inaugurado no segundo semestre de 2014 ou seja, na melhor das hipóteses, dentro de 15 meses. Mas não ficou até ao fim da conferência para justificar os atrasos e responder a outras perguntas. Ao fim da tarde, o gabinete de Barreto Xavier fez chegar por email uma resposta lacónica: "Este dossier está a ser gerido pelo gabinete do Secretário de Estado da Cultura, em articulação com a Secretaria de Estado do Turismo."
Isabel Cordeiro, directora da DGPC, que tutela os museus, disse na entrevista que deu ao PÚBLICO em Fevereiro que a sua equipa ia trabalhar para abrir os novos Coches no fim de 2014. Decorriam, então, trabalhos de conservação e restauro na colecção do museu e o modelo de gestão estava ainda em estudo.
Ricardo Bak Gordon diz que não compreende o atraso e sublinha: "No Museu dos Coches, ao contrário de muitas das grandes obras em Portugal, não houve atrasos na construção nem derrapagens orçamentais. Tudo foi cumprido com rigor."
Paulo Mendes da Rocha fala de um projecto que gostaria de ver entregue à cidade, mas "difícil". Pelas burocracias? Pela construção numa zona rodeada de outros ícones arquitectónicos? Os "ícones" não o incomodam, porque, diz, "quanto maior a festa, melhor...": "As dificuldades vêm da imprevisibilidade da vida. Temos de lidar com elas. Este é um museu de grandes esperanças e eu quero ver aquela praça cheia, quero que ele participe da alegria do lugar."