PATRIMÓNIO
UNESCO reconhece esforço de associação na defesa do
património do Porto
Associação para a Reabilitação Urbana e Protecção do
Património ganhou candidatura a programa da UNESCO e vai ter duas dezenas de
voluntários, de vários países, a avaliar estado do edificado histórico da
cidade, em 2021
Abel Coentrão
Abel Coentrão 25
de Outubro de 2020, 7:54
A Reabilitação
Urbana que, na última década, à boleia do turismo, lavou a cara do centro
histórico do Porto é também um factor de risco para as marcas identitárias do
edificado mais antigo da cidade. Há muitas vozes que, aqui e ali, vêm
denunciando a opção pelo “fachadismo”, e, para perceber até onde vai essa
tendência, e ajudar os agentes no terreno a evitar repetir erros, a Associação
Portuguesa para a Reabilitação Urbana e Protecção do Património (APRUPP) vai
desenvolver, na primavera de 2021, um projecto de monitorização, com o apoio da
UNESCO.
A APRUPP ganhou
uma candidatura ao programa World Heritage Volunteers 2021, da UNESCO, através
do qual vai acolher no final de Fevereiro vinte voluntários de vários países
das áreas da arquitectura e conservação do património, entre outras. Com eles,
a associação liderada pela investigadora Alice Tavares Costa, e sediada no
Porto, vai avançar com uma iniciativa de avaliação, no terreno, do estado de
conservação dos elementos que caracterizam a arquitectura portuense do centro
histórico.
Oficinas de
conservação
Neste momento, a
APRUPP, que já tem um princípio de entendimento com o município, para apoiar o
projecto, procura outros parceiros para realizar, esperando, como o país, que
até lá o novo coronavírus ceda terreno, e permita levar a cabo todo o programa
no momento previsto. Este incluirá a realização de oficinas dedicadas a algumas
técnicas e materiais que estão a cair em desuso, como as paredes de tabique, os
tectos estucados, caixilharias em madeira, etc. E Alice Costa gostaria que
algumas dessas sessões formativas - abertas a técnicos portugueses - pudessem
acontecer em plena rua.
Este projecto,
que abrange áreas classificadas pela UNESCO com algum tipo de risco para o
património existente, surge na continuidade daquela que tem sido a intervenção
da APRUPP, uma organização sem fins lucrativos que, desde 2012, tem procurado
alertar para a necessidade de se conjugar a renovação do edificado com a
preservação dos principais elementos que o caracterizam e que, na verdade,
justificaram a sua elevação a Património da Humanidade. Muitos desses alertas
têm passado pelas acções de formação, cada vez mais procuradas e
descentralizadas pelo país, nota Alice Costa. Na última, dedicada à conservação
e restauro de estruturas em aço antigo - o caso de estudo era o Elevador de
Santa Justa - havia 80 inscritos.
Um país a perder
património
Centro Histórico
do Porto numa encruzilhada: fachadismo ou recuperação?
Alice Tavares
Costa assume que as preocupações com o património não se cingem, nem se devem
cingir, apenas ao Porto e a Lisboa, as duas cidades mais pressionadas pelo boom
do imobiliário. Há várias zonas do país onde o edificado anterior à era do betão
armado já representa menos de 5% do total, percebeu esta investigadora da
Universidade de Aveiro num levantamento que fez há alguns anos. Uma situação
preocupante, a que soma o facto de, em muitas reabilitações dos últimos anos,
estarem a ser usados materiais de menor durabilidade e nem sempre ajustados ao
pré-existente que, em pouco tempo, originarão novas demolições.
A par da
dificuldade de convencer muitos agentes imobiliários da necessidade de
preservação de elementos patrimoniais, estas opções de projecto são aliás, um
dos grandes problemas da reabilitação urbana em Portugal, explica a académica e
dirigente da APRUPP. Os edifícios reconstruídos, em que apenas se aproveita a
fachada, podem ter, na aparência, um melhor desempenho ambiental (pelo lado da
poupança energética), mas vão ter necessidades de intervenção nos próximos
anos, e nos casos em que se opte pela demolição, a pegada ecológica será sempre
considerável, assinala.
A estreia do
prémio APRUPP
Nos últimos anos,
a APPRUPP tem dedicado parte do seu esforço a criar mecanismos de circularidade
num dos sectores da economia em que menos se recicla. O Repositório de
Materiais de Construção, que foi apontado pelo Ministério do Ambiente como um
bom exemplo de Economia Circular, tem é tido dificuldade em circular, como
conceito, e instalar-se no território, a uma escala pelo menos municipal. Ter
um lugar, em cada concelho, onde quem vai reconstruir uma casa sabe que pode
encontrar vigas de madeira, estruturas de clarabóias, portas, janelas, peças de
mármore ou de madeira antigos resultantes de outras obras parece, á partida,
não só uma boa ideia mas um contributo para a sociedade que seremos obrigados a
construir nas décadas que aí vêm. Mas poucos perceberam, ainda, isso.
Interessada em
garantir que cada vez mais técnicos e investigadores se sensibilizem para
aquelas que têm sido as suas preocupações centrais, a APRUPP está a lançar este
ano um prémio para teses de mestrado (mil euros) e doutoramento (1250 euros),
que abordem um de três tópicos: intervenção mínima vs máxima preservação;
compatibilização entre tecnologias e materiais antigos e novos; durabilidade e
sustentabilidade das intervenções. As candidaturas podem ser entregues até 31
de Outubro, e os premiados serão anunciados ainda este ano, numa sessão em que
será apresentado também, oficialmente, o programa do projecto apoiado pela
UNESCO
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