Assis
convoca opositores de Costa para encontro no sábado
Margarida Gomes
02/11/2015 - PÚBLICO
Eurodeputado
considera "impensável" e "erro histórico"
acordo com PCP e BE, mas diz que não vai apelar aos deputados para
desrespeitarem a disciplina de voto.
Começou a contagem
das espingardas no PS. Em vésperas da discussão do programa do
Governo da coligação, Francisco Assis convoca os militantes do
partido que discordam do rumo que o secretário-geral está a seguir
para um encontro sábado, na Mealhada.
Os opositores de
António Costa, apesar de estarem em minoria nos órgãos do partido
e no próprio grupo parlamentar, acreditam que “representam metade
do eleitorado do PS”. “Metade do eleitorado socialista está
assustado com a deriva que o partido está a seguir e isto que nós
estamos a fazer comparado com o que os apoiantes do actual
secretário-geral fizeram à anterior direcção não é nada”,
afirma fonte socialista, agitando com o risco de o PS guinar
completamente à esquerda. “O partido corre o risco da
'pasokização' e 'syrização'. Há aqui uma deriva à esquerda e
isso é muito perigoso”, adverte a mesma fonte, considerando que o
partido “deve ter uma reserva, evitando pôr as fichas todas em
António Costa” numa próxima disputa da liderança.
A realização deste
encontro está a deixar o aparelho do partido nervoso. A mobilização
está a ser grande e são esperados militantes de todo o país. A
organização conta com a presença de aproximadamente duas centenas
de pessoas, entre militantes de base, ex-dirigentes do partido e
presidentes de câmara. Poucos deputados devem marcar presença.
Eurico Brilhante Dias, que integrou o secretariado nacional do
anterior secretário-geral, António José Seguro, deverá ser um dos
poucos deputados a deslocar-se à Mealhada, o mesmo acontecendo com
os líderes das distritais do partido, até porque alguns deles foram
eleitos deputados.
“É muito
importante demonstrar ao próprio país que há, de facto, no PS quem
defenda uma solução distinta daquela que aparentemente está a
prevalecer e que para mim é um erro histórico”, afirma Francisco
Assis, que considera ”impensável um entendimento do PS com o PCP e
o Bloco”. O eurodeputado socialista reconhece que tal como ele “há
muita gente no PS que está contra um entendimento” e declara que,
ao assumir uma divergência com a linha oficial do partido, contrai
responsabilidades, às quais – frisa – não se furta. “Não
estou indisponível para nada nem nunca estive. Mas esse agora não é
o meu objectivo neste momento”, sublinha o ex-líder da bancada
parlamentar do PS, frisando que a “questão fundamental neste
momento é mostrar que este caminho é um caminho errado e que é
perigoso para o PS”.
Ao PÚBLICO
Francisco Assis diz não ter dúvidas de que o PS pode “pagar caro
esta aproximação à esquerda” e refere que “um governo desta
natureza é um governo com uma grande incapacidade para fazer
reformas": "Um Governo do PS apoiado por um partido tão
conservador como é o PCP e por um partido tão contraditório como é
o Bloco de Esquerda inibe-nos de ter a capacidade de promover
reformas que o país precisa”.
Sublinhando a
importância de o país fazer “reformas sérias”, Assis vinca a
necessidade de o “PS ter a sua agenda reformista como acontece com
a direita”. “A direita tem uma agenda reformista ultraliberal que
não é a nossa. Nós temos de ter uma agenda reformista
verdadeiramente social-democrata e eu não acredito que com este
entendimento à esquerda essa agenda reformista se possa levar a cabo
com sucesso”, afirma.
Em declarações ao
PÚBLICO, o eurodeputado reafirma a ideia de que o “PS deveria
assumir-se como partido da oposição com sentido de responsabilidade
e, a partir da oposição, construir uma alternativa de governação
ao país. É isso que os portugueses esperam do PS neste momento”.
Para já, afasta
qualquer cisão no partido, mas assume que “há determinados
momentos em que as pessoas têm a obrigação perante a sociedade de
se assumirem e de afirmarem as suas posições": "E é isso
que eu estou a fazer”.
Quanto ao encontro,
deixa a garantia que não vai aproveitar a reunião de sábado para
apelar aos deputados do PS para que desrespeitem a disciplina de
voto. ”Não vou apelar a que desrespeitem a disciplina de voto
porque a disciplina de voto é importante”. Porquê? “Porque se
não o país entra num quadro de ingovernabilidade.” “Há
princípios que têm de ser respeitados”, aponta.
“É fundamental
que aqueles que neste momento têm uma divergência profunda em
[relação a um futuro governo do PS com o apoio pela esquerda] que
se encontrem e que digam claramente que nós estamos aqui para dizer
que há outro caminho, que há outra via, que temos um entendimento
do que deve ser o papel do PS completamente distinto daquele que
neste momento parece prevalecer no interior do partido. É só isso e
nada mais”.
Insistindo na
questão que os socialistas estão a tratar de uma “alteração
profunda da vida política portuguesa – o PS dispõe-se a governar
com o apoio do PCP e Bloco”, o eurodeputado aponta exemplos em que
o seu partido diverge dos outros dois - “e não são divergências
menores”, como faz questão de evidenciar, e avisa que “Portugal
está longe de ter superado as dificuldades”. “Ainda estamos numa
situação de crise”.
Assis elogia a
inteligência e a capacidade do secretário-geral socialista, recusa
dizer se se mostra desapontado com ele e pede mudança de estratégia,
porque - frisa - a “celebração de acordos à esquerda é um erro
histórico”. “Aquilo que o separa de António Costa são
“divergências muito sérias do ponto de vista estratégico e que é
por causa dessas divergências que tomou a decisão de convocar o
partido para um encontro”.
Fonte socialista
ligada à direcção de António José Seguro diz que “é
importante que os socialistas que discordam de Costa tenham dado um
sinal ao país” e que “é fundamental que se prepare uma corrente
crítica e alternativa no PS”. E diz que esta corrente que se
começa a desenhar, seja em que circunstância for, vai disputar a
liderança do PS no próximo congresso. “É uma questão de
dignidade!”, diz.
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