EXCLUSIVO OPINIÃO
A direitização da direita europeia
A maioria dos partidos da direita populista ou
extrema-direita da União Europeia tem representação ou intenções de voto bem
acima dos 10%.
Jorge Botelho
Moniz
29 de Dezembro de
2023, 6:20
https://www.publico.pt/2023/12/29/opiniao/opiniao/direitizacao-direita-europeia-2075116
O populismo da e
na Europa. Desde o final da Segunda Grande Mundial que direitas e esquerdas
relativamente moderadas foram um dos principais esteios da integração europeia.
Contudo, com o acentuar da retórica da crise – financeira, migratória,
cultural, pandémica, securitária – ao longo de décadas, a dicotomia nós e
outros foi elevada para um nível emergencial (veja-se o acordo recente sobre o
Pacto de Migração e Asilo na UE). Como consequência, certos partidos, quer lhe
chamemos populistas de direita ou de extrema-direita, tornaram-se parte do
mosaico político europeu. Por exemplo, a ascensão do FPÖ ao poder, na Áustria,
na década de 2000, e o sucesso de partidos similares em França, Finlândia,
Países Baixos e Suécia nos inícios dos anos 2010. Num relatório do Institute
for Global Change sobre os populistas no poder no mundo, na secção sobre a
Europa, conclui-se que o populismo cultural – o que fala das e para as
verdadeiras pessoas, aquelas, provavelmente, de bem – é o mais recorrente e
bem-sucedido no continente.
Tendências de
direitização. O que é que preocupa os europeus? A situação económica e a
imigração, a transição verde e digital e a exclusão que daí advém e o desgaste
provocado pela(s) guerra(s). Quem tem liderado essas “agendas”? Pelo menos, ao
nível retórico, a direita, mas não a moderada. Na Polónia, o Lei e Justiça
esteve no poder desde 2015 e ganhou eleições recentemente, embora sem maioria
para permanecer no Governo. Na Hungria, Orbán conquistou o poder há quase
década e meia, tendo vencido de novo as eleições em 2022. Em setembro desse
ano, Meloni venceu as eleições com os seus Irmãos de Itália e na Suécia a
extrema-direita dos Democratas Suecos ficou em segundo lugar, oferecendo apoio
parlamentar ao novo Governo. O mesmo sucedeu na Finlândia, em abril de 2023,
com o Partido dos Finlandeses a integrar o Governo dos conservadores. Na
Alemanha, os nacionalistas da AfD assumiram-se como a segunda força política
nas eleições regionais de outubro passado. Nos Países Baixos, o VVD de Geert
Wilders, saiu vencedor nas eleições gerais de novembro passado.
Ao nível das
tendências, verifica-se que, em grande parte da Europa, a maioria dos partidos
deste espectro ideológico se situa atualmente bem acima dos 10%. Lideram as
sondagens na Áustria, FPÖ (30%), e Bélgica, Vlaams Belang (23%). Estão em
segundo em França, Rassemblement National (24%); Roménia, Aliança para a União
dos Romenos (19%); e República Checa, Partido Democrático Cívico (13%); e em
terceiro em Portugal, Chega! (16%), e Letónia, Aliança Nacional (13%).
O fim do centro
político na UE. Bem sei que são consideradas eleições de segunda linha e que,
antes, temos eleições legislativas em Portugal. Contudo, estamos a menos de
meio ano das eleições europeias de 2024 e isso inquieta-me. Inquieta-me, porque
a maioria dos partidos supramencionados faz parte de dois grupos no Parlamento
Europeu – ID e ECR – que partilham entre si populismo de direita, nacionalismo
e euroceticismo. Inquieta-me, porque esta direitização é uma tendência
crescente que deve prosseguir – recordo que metade dos europeus inquiridos
disse, recentemente, estar insatisfeita com o funcionamento das suas
democracias e com o estado da União e que apenas uma minoria disse sentir
alguma influência nas suas decisões. Inquieta-me, porque isto significará uma
profunda reconfiguração das maiorias no Parlamento Europeu, pondo em questão o
bloco central PPE e S&D e, consequentemente, o próprio processo de
integração europeu. Por fim, inquieta-me que tudo isto pareça irrelevante,
quando, a bem ou a mal, 70% a 80% da legislação vem de Bruxelas.
Inquieta-me que tudo isto pareça irrelevante, quando, a
bem ou a mal, 70% a 80% da legislação vem de Bruxelas
Para países como
Portugal, estas dinâmicas têm consequências. É extraordinário ver partidos
portugueses a apoiar estas perspetivas quando, no geral, estes outros partidos
europeus olham para nós – beneficiários líquidos da UE – como meros sorvedouros
de fundos comunitários. Como diria um antigo presidente do Eurogrupo: os países
do Sul da Europa não podem gastar em mulheres e álcool e, depois, pedir ajuda.
Com a direitização da direita europeia e o potencial fim do centro político na
Europa, países como Portugal serão, porém, a menor das preocupações da
Comunidade. Nas próximas eleições, o que está em jogo, verdadeiramente, é a
(des)integração europeia como um todo.
O autor escreve
segundo o novo acordo ortográfico
Sem comentários:
Enviar um comentário