Depois da Alfaiataria
Nunes Correia e da Alfaitaria Picadilly, agora a Camisaria Pitta ... O que “está
a dar” é nítidamente o “pastel de Bacalhau com queijo”, etc.,
Bye Bye Baixa ...
OVOODOCORVO
Camisaria Pitta
é mais uma loja histórica a fechar na Baixa
A histórica
alfaiataria da baixa lisboeta está em “liquidação total” a preparar-se para
fechar as portas no final do mês de Maio. Aberta no final do século XIX, é mais
uma loja centenária que fecha na cidade.
Cristiana Faria Moreira
CRISTIANA FARIA
MOREIRA 9 de Março de 2018, 20:27
Sobram poucas
casas assim em Lisboa, onde ainda se riscam, cortam e cosem tecidos em oficinas
que têm ar de museu. As casas com alfaiates e costureiras tradicionais
contam-se pelos dedos das mãos e não há quem queira pegar-lhes nas tesouras. É
mais uma loja, onde se fazia por vender o que é feito à medida, que tem o fim
anunciado. A Camisaria Pitta, que ocupa os números 195 e 197 da rua Augusta, na
baixa de Lisboa, fecha no fim de Maio.
O anúncio foi
feito pelo gerente da alfaiataria, Ricardo Teixeira, na sua página de Facebook.
“Venho comunicar com muita tristeza a todos os meus amigos que a nossa loja
Camisaria Pitta na Baixa vai encerrar, iniciaremos a liquidação total de
imediato”, escreveu.
É o ponto final
na história daquela que será a camisaria mais antiga da Península Ibérica. Foi
em 1887 que A. M. Pitta foi buscar inspiração às casas inglesas, para criar o
negócio. E que se instalou, primeiro, na rua de São Julião, mas que havia de
passar, em 1903, para a rua Augusta, onde foi esculpida a fachada em madeira,
com o detalhe de nela se poder procurar por dois colarinhos esculpidos. Serviu
a realeza e, mais tarde, vestiu o corpo diplomático da presidência e as elites
da capital.
O gerente da
alfaiataria não quis prestar qualquer declaração ao PÚBLICO sobre as razões
para o encerramento.
A histórica
alfaiataria integra o programa “Lojas com História”, promovido pela câmara de
Lisboa, para “preservar e salvaguardar os estabelecimentos [de comércio
tradicional] e o seu património material, histórico e cultural”. No entanto,
essa distinção não tem impedido que vários negócios "com história"
encerrem na cidade. Ainda no início do ano, o PÚBLICO dava conta do fecho da
Livraria Aillaud & Lellos na rua do Carmo, que ali abriu em 1931. O aumento
do preço das rendas, por conta da pressão imobiliária na cidade, tem obrigado
muitas destas casas a fechar as portas.
A Camisaria Pitta
começou por ser uma casa que privilegiava o que é feito à medida, tendo em
atenção que cada ombro é um ombro, cada manga é uma manga, cada corpo é um
corpo. Onde tudo se podia personalizar - do colarinho ao punho ou ao pesponto.
Mas a alfaiataria tradicional, que começou por ser um ofício desprezado - diz
quem sabe - tornou-se um luxo pouco acessível. Que ainda é procurado por quem
têm medidas fora do que o padronizado pronto-a-vestir oferece ou por quem pode
pagar milhares de euros por uma "obra de arte" que assenta no corpo
como uma segunda pele.
Culpa dos tempos,
das modas, da abertura ao mercado internacional, algumas casas obrigaram-se a
apostar no pronto-a-vestir para sobreviver. Foi o caso da Pitta, onde ainda se
vendem casacos, camisas, polos, blusões, fatos completos, chapéus e gravatas
para homem.
Agora, afixados
nas montras estão pequenos cartazes que anunciam as “promoções e grandes
descontos” que se podem encontrar no interior. Manter-se-á assim até ao final
do mês de Maio.
Mas a memória da
casa há-de ficar perpetuada no filme O Leão da Estrela (1947), quando António
Silva elogia a indumentária de outro personagem: “São camisas de qualidade, são
Pitta”.
A nau de
bacalhau com velas de queijo e corvos de massapão
A autenticidade e
a sobrevivência da nossa identidade está ameaçada pelo triunfo efémero do
Híbrido.
ANTÓNIO SÉRGIO
ROSA DE CARVALHO
9 de Janeiro de
2016, 1:25
Em Lisboa, os
últimos dias de 2015 foram dominados na opinião pública, pelo polémico e
imposto desaparecimento do Palmeira.
O Palmeira era um
restaurante “atascado” de consideráveis dimensões em notável espaço térreo
Pombalino, conjugando respectivas abóbodas e pilares com antiga e genuína
decoração “Portugal/Português”.
Aqui, azulejos e
ferragens junto a autênticos pastéis de bacalhau (sem queijo) permitiam
associações mentais em “viagens por serras e vales” no tempo das estradas
nacionais, com árvores ancestrais apresentando bandas brancas reveladas por
redondos faróis pejados de mosquitos, feixes luminosos invasores de silhuetas
campestres sobre um glorioso e estrelado céu nocturno, dominado pelas abóbodas
do Firmamento.
Tudo isto
terminou abruptamente. A C.M.L. decidiu vender o edifício, na parte superior
uma ruína, sem acautelar a garantia de sobrevivência deste notável e autêntico
estabelecimento. Isto, depois de apregoar aos quatro ventos a criação do
Projecto “Lojas com História”., que garantiu a formulação de extensas e
completas listas de estabelecimentos a preservar, definidas por notáveis
seguidores de Ulisses.
Estas heróicas
listas e intenções só apresentavam uma sombra. A C.M.L. não garantia a
protecção perante a implacável e arbitrária Lei do Arrendamento. Assim,
declarava-se impotente e também vítima, numa mítica, heróica e eterna luta
entre as intenções, a defesa do valor único cultural de tais estabelecimentos,
e a realidade dos valores e interesses dos investidores que se sobrepunham aos
valores culturais.
Havia portanto
uma essência pura de “Dr. Jeckill” no organismo da C.M.L., que sucumbia assim
por impotência, ás maléficas intenções vindas do “exterior”.
Mas a
perversidade reside precisamente no facto de que tal como na conhecida novela,
“Dr. Jeckill” e “Mr. Hyde” são duas facetas da mesma pessoa. E não se trata
aqui, apenas. de um conflicto entre duas essências no mesmo organismo, em luta
interna e permanente.
Não, mais
perversamente, aqui, a existência de “Dr. Jeckill” é um falso mito criado por
“Mr. Hyde”.
Por outras
palavras, a principal causa do desaparecimento dos Estabelecimentos é a
política urbanística desenvolvida pela C.M.L. e respectivos licenciamentos
concedidos.
Na avalanche de
projectos de hóteis e residências turísticas permitida e licenciada pela C.M.L.
está presente uma ausência total de estratégia ou visão futura. Cada projecto,
no actual estado de coisas, implica inevitávelemente o desaparecimento de
qualquer estabelecimento existente, independentemente da sua antiguidade ou do
seu reconhecido e apregoado insubstituível valor cultural.
Embora todos
reconheçam que a autenticidade e a diferença local e cultural, constituem a
principal e determinante razão da visita turística, Lisboa está a ser destruída
sistemáticamente na sua identidade e a ser transformada numa artificial
plataforma onde a banalidade, o pastiche e o híbrido triunfam.
Numa grave crise
económica, repentinamente o Turismo surgiu como balão de oxigénio salvador.
Como em Portugal
nada se medita, reflecte ou se planeia, tudo simplesmente parece nos acontecer,
aceitamoss estes processos como inevitáveis. No entanto estes processos
conhecem responsáveis e são estimulados ou contrariados por alguém.
Numa Lisboa onde
o “pastel de bacalhau com queijo” triunfa, a autenticidade e a sobrevivência da
nossa identidade está ameaçada pelo triunfo efémero e irreversivelemente
destruidor do Híbrido.
A nau heráldica e
respectivos atributos iconográficos originalmente símbolo das características,
virtudes e valores da nobre Urbe, está a ser lentamente mas irreversívelmente
transformada numa “nau de bacalhau, com velas de queijo e corvos de massapão.”
Historiador de Arquitectura
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