Procedimento de Avaliação de Impacte Ambiental de mina de
lítio em Montalegre está suspenso
Processo de avaliação ambiental da mina de lítio em
Montalegre está suspenso, devido a lacunas do estudo ambiental. Sem estudo
aprovado ao fim de 2 anos de contrato, Estado pode rescindir.
Agência Lusa
Texto
Ana Suspiro
Texto
28 abr 2021,
17:19
A Agência
Portuguesa do Ambiente (AIA) esclareceu que o procedimento de Avaliação de
impacte Ambiental (AIA) do projeto mineiro de exploração de lítio em
Montalegre, concessionado à Lusorecursos Portugal Lithium, está “suspenso”. O
esclarecimento surge depois de serem conhecidas declarações do ministro do
Ambiente, João Matos Fernandes, ao jornal Político nas quais considerou “muito
improvável” a possibilidade da mina prevista para Montalegre avançar.
O contrato de
concessão da exploração de lítio estabelece que a concessionária tem até dois
anos para obter um estudo de impacte ambiental favorável à laboração. O
incumprimento desse prazo dá direito ao Estado de rescindir o contrato que foi
assinado em março de 2019, mas a APA concedeu uma prorrogação para a realização
do estudo de impacte ambiental.
“A Comissão de
Avaliação identificou um conjunto de lacunas e incoerências, não só ao nível do
Estudo de Impacte Ambiental (EIA) mas também do próprio projeto, que não
permitiam a continuidade do procedimento de AIA”, afirmou a APA, por escrito, à
agência Lusa. A APA esclareceu ter comunicado esta informação ao proponente em
janeiro, altura em que abriu um período de 10 dias para audiência de
interessados, tendo posteriormente a empresa solicitado uma prorrogação desse
período “até 13 de agosto”, o que foi autorizado, “pelo que o procedimento de
AIA se encontra suspenso”.
Após um pedido de
esclarecimentos sobre a “Concessão de Exploração de Depósitos Minerais de Lítio
e Minerais Associados — Romano”, no concelho de Montalegre, distrito de Vila
Real, a APA referiu que o procedimento de AIA se iniciou a 14 dezembro. A
Agência explicou que, na qualidade de autoridade de AIA, nomeou a respetiva
Comissão de Avaliação e que o procedimento de AIA se iniciou com a análise da
conformidade do respetivo EIA. “Esta fase do procedimento tem como objetivo
aferir se o referido estudo contém toda a informação necessária à avaliação
ambiental do projeto ou se, pelo contrário, é necessária a apresentação de
elementos adicionais”, explicou.
Nesse contexto, a
Comissão de Avaliação “identificou um conjunto de lacunas e incoerências, não
só ao nível do EIA mas também do próprio projeto, que não permitiam a
continuidade do procedimento de AIA. Neste sentido, a APA comunicou esta
pronúncia ao proponente a 26 de janeiro, tendo procedido nessa data à abertura
de um período de 10 dias úteis para audiência de interessados. “O proponente,
posteriormente, solicitou prorrogação desse período até 13 de agosto de 2021.
Essa prorrogação foi concedida pela APA, pelo que o procedimento de AIA em
causa se encontra suspenso”, salientou a Agência Portuguesa do Ambiente.
Ministro do
Ambiente diz que concessionária “tem de ser mais profissional”
O ministro do
Ambiente disse que o próximo Estudo de Impacto Ambiental [EIA] da LusoRecursos
para o projeto de lítio em Montalegre tem de ser “muito melhor”, caso contrário
“é inevitável” que a licença de concessão seja revogada. “Se a LusoRecursos não
for mais profissional do que aquilo que tem sido, é inevitável que esses prazos
se esgotem e que essa licença venha a ser revogada”, afirmou o ministro do
Ambiente e da Ação Climática, João Matos Fernandes, referindo que a empresa à
qual o Governo concedeu o contrato de exploração em 2019 pediu um adiamento de
prazo até agosto para poder voltar a entregar o novo EIA.
Falando à margem
da apresentação do Projeto Centrais Fotovoltaicas – Telheiras e Parque das
Nações, promovida pela Empresa Portuguesa de Águas Livres (EPAL), em Lisboa, o
ministro esclareceu o que disse em entrevista ao jornal Politico, publicada
esta quarta-feira, em que avançou que o Governo vai cancelar o projeto da mina
de lítio em Montalegre da LusoRecursos.
O ministro do
Ambiente indicou entretanto que “a LusoRecursos já apresentou, por duas vezes,
o seu EIA junto da APA [Agência Portuguesa do Ambiente]. A primeira das vezes
foi preliminarmente rejeitada. A segunda das vezes foi considerada
desconforme”. No âmbito do pedido de adiamento de prazo para apresentação do
novo EIA por parte da empresa, o titular da pasta do Ambiente reforçou que “o
próximo EIA tem mesmo que vir muito melhor e tem mesmo de estar em condições de
permitir avaliar quais são os impactos ambientais que são gerados por uma
atividade como esta”.
“Portugal está
fortissimamente empenhado na exploração do lítio, porque só tendo a Europa 9%
das suas matérias críticas para o desenvolvimento da sua economia, é essencial
que aposte naquelas que tem e direi que a pandemia da Covid-19 reforça esta
mesma convicção: não podemos estar sistematicamente expostos a não termos na
Europa, neste caso em Portugal, as matérias de que necessitamos”, declarou.
Autarca de
Montalegre disse que teria sido boa notícia chumbo do projeto mineiro
O presidente da
Câmara de Montalegre disse que teria sido uma boa notícia o chumbo do projeto
mineiro e que aguarda o Estudo de Impacte Ambiental para tomar uma posição
sobre a exploração de lítio no concelho.
Para o presidente
da Câmara de Montalegre, Orlando Alves, o chumbo do Governo “teria sido uma boa
notícia” porque o projeto deixou a população “inquieta” e “em alvoroço”.
Depois de
apresentar dois EIA, a empresa Lusorecursos Portugal Lithium pediu um adiamento
de prazo até agosto para poder voltar a entregar o novo Estudo de Impacte
Ambiental.
“Se lhe é dado
mais um prazo significa que o processo pode estar vivo ainda”, referiu Orlando
Alves à agência Lusa.
Para o autarca do
distrito de Vila Real, “esta evidência da incapacidade da empresa só surpreende
o menos atento”, justificando esta declaração com o “terceiro EIA que há de
vir”.
“Só tomaremos
posição quando conhecermos os impactes, os positivos e os negativos, e isso é o
que tem que vir plasmado no EIA que, pelos vistos, ainda não há”, afirmou
ainda.
Orlando Alves fez
questão de ressalvar que a “posição da câmara tem sido extraordinariamente
coerente porquanto fez sempre valer uma posição oficial da avaliação que venha
a ser feita ao EIA”.
E acrescentou que
a autarquia também garantiu que “será tomada oficialmente a posição que a
associação Montalegre Com vida quer que seja tomada”.
“A associação é
contra, muito bem, a câmara será contra. Estamos aqui para agir em
representação do povo e o povo é quem elege os autarcas e os incumbe da missão
de os defender”, sublinhou.
No entanto,
lembrou que “este projeto é um desígnio governamental e quem decide é o
Governo”.
“Vamos estar
atentos e vamos ver o que é que isso representa e no que é que isto vai dar.
Uma coisa é certa, (…) hoje podemos todos dormir mais tranquilos, mas sempre
desconfiando no que estas sucessivas prorrogações podem vir a dar”, frisou.
Em Montalegre, a
população, nomeadamente das aldeias de Morgade, Rebordelo e Carvalhais, opõe-se
ao projeto, elencando preocupações ao nível da dimensão da mina e consequências
ambientais, na saúde e na agricultura.
Associação
“agradada mas não descansada” com suspensão do EIA da mina
Já a Associação
Montalegre Com Vida disse que ficou “agradada” mas “não descansada” com a
desconformidade do Estudo de Impacte Ambiental (EIA) do projeto de exploração
de lítio e garantiu que vai prosseguir com a “luta cerrada”.
“Não é nada que
nós não estivéssemos já à espera. Nós alertámos desde o início para a forma
como estava a ser feito o EIA, nunca vimos ninguém no terreno, estavam
proibidos de entrar no terreno”, afirmou à agência Lusa Armando Pinto, da
Associação Montalegre com Vida, que foi criada para lutar contra a mina de
lítio prevista para o concelho do distrito de Vila Real.
“Não foi nada que
não tivéssemos já previsto porque o EIA estaria certamente a ser feito em algum
gabinete, mas nunca com os dados concretos do terreno. Não vimos ninguém da
empresa nem de empresas subcontratadas por eles, nem a população permitia que
eles lá andassem”, salientou Armando Pinto.
O responsável
disse que a associação ficou agradada porque “as coisas não estão a correr bem
para a empresa”.
Mas também não
ficamos descansados porque sabemos que há um processo a decorrer para um
concurso internacional e, caso até seja retirado este projeto à Lusorecursos,
nós tememos que esta zona possa vir a ser incluída nesse concurso público
internacional”, afirmou.
E continuou: “não
vamos descansar, não nos deixa confortáveis, pelo contrário, vamos continuar
com luta cerrada, muito atentos e já no dia 5 de maio vamos estar em Lisboa a
protestar contra a falácia que são as minas verdes”.
Catorze movimentos
portugueses e internacionais que se opõem às minas marcaram uma manifestação
para o dia em que decorre uma conferência subordinada ao tema “Green Minning”,
que contará com a presença dos ministros do ambiente europeus e se realiza no
âmbito da Presidência Portuguesa.
Os ativistas
pretendem alertar para a “falácia” que é a mineração verde ou “green mining”,
título e foco do congresso, e que, no seu entender, é apenas “outra forma de
extrativismo e poluição, com consequências dramáticas para os territórios
afetados, sobretudo a destruição do ambiente e dos recursos indispensáveis à
vida e ao futuro das gerações vindouras”.
“Achamos estranho
que alguém como o ministro do Ambiente possa num dia dizer uma coisa e no dia
seguinte dizer outra coisa completamente diferente. Achamos que é extremamente
grave e, no nosso entender, isto devia ter consequências políticas”, afirmou
Armando Pinto.
Para o
responsável, “isto só exemplifica a forma como este processo foi gerido desde o
início, com falta de transparência”.
Projeto da
Savannah para Boticas está em consulta pública
Em andamento está
o estudo de impacte ambiental para uma outra exploração de lítio em Boticas
apresentada pela empresa Savannah que foi aceite pela APA e colocado em
consulta pública na semana passada. Este projeto suscitou já o interesse e
investimento da Galp Energia que adquiriu uma participação.
No caso do
projeto de Montalegre, a Comissão de Avaliação inclui, além de representantes
da APA, representantes da Direção-Geral de Energia e Geologia, da Direção-Geral
do Património Cultural, da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional
do Norte, do Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas, da
Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil, da Faculdade de Engenharia da
Universidade do Porto, do Instituto Superior de Agronomia e da Administração
Regional de Saúde do Norte.
Relativamente às
notícias divulgadas hoje e através das quais o ministro do Ambiente e da Ação
Climática, Matos Fernandes, apontava para o cancelamento do polémico projeto de
mineração de lítio em Montalegre, a APA adiantou que “referências feitas à
licença deste projeto não correspondem a nenhum título ou decisão emitidos ou a
emitir pela Agência Portuguesa do Ambiente mas sim às licenças específicas da
atividade, da responsabilidade da Direção-Geral de Energia e Geologia”.
O contrato de
concessão de exploração de lítio no concelho de Montalegre foi assinado em
março de 2019, entre o Governo e a Lusorecursos Portugal Lithium, e tem estado
envolto em polémica. A empresa tem dito que a exploração da mina de lítio em
Morgade vai ser mista, efetuando-se primeiro a céu aberto e depois em
subterrâneo, e prevê a construção de uma unidade industrial para transformação
do minério.
Em Montalegre, a
população, nomeadamente das aldeias de Morgade, Rebordelo e Carvalhais,
opõem-se ao projeto, elencando preocupações ao nível da dimensão da mina e
consequências ambientais, na saúde e na agricultura.
Os opositores à
mina têm também alertado para a incompatibilidade entre o Património Agrícola
Mundial, distinção atribuída a Montalegre e Boticas em 2018, pela Organização
das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), e a mina do Romano
(Sepeda).
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