Remuneração dos
gestores do Novo Banco disparou 75% com Lone Star
Subida da massa
salarial nos últimos dois exercícios completos acompanha prejuízos milionários
do banco e injecções do Estado de mais de dois mil milhões.
Cristina Ferreira
Cristina Ferreira
20 de Maio de 2020, 6:58
Os membros da
comissão executiva do Novo Banco viram as suas remunerações serem aumentadas em
quase um milhão de euros assim que a instituição passou para a esfera do fundo
de private equity norte-americano Lone Star e, em três anos, assumiu prejuízos
de 3,866 mil milhões, os que sustentaram os pedidos de injecção de dinheiros
públicos na instituição que já superaram dois mil milhões. Se a conta incluir o
que recebem os membros do Conselho Geral e de Supervisão do Novo Banco,
chefiado por Byron Haynes, criado a seguir à venda, então o diferencial, face
aos encargos com a gestão em 2016 (em que não havia este órgão), aumenta para
quase dois milhões de euros.
Em 2017, a
remuneração anual dos seis gestores executivos do Novo Banco cifrou-se em
1.336.000 euros, dos quais 329.600 euros imputados a António Ramalho. Dois anos
depois, agora com mais três gestores, a equipa de executivos recebeu 2.345.296
euros, tendo o mesmo presidente executivo auferido 400 mil euros. Uma subida de
75% durante dois exercícios completos e vincadamente negativos.
Neste bolo
salarial fixo não está incluído um prémio de assinatura de 320 mil euros pago
na contratação de Mark Bourke, um dos novos gestores desta equipa executiva.
Se recuarmos a
2016, um ano antes do Fundo de Resolução ter concretizado o negócio, a
remuneração anual de António Ramalho era de 121.285 euros. Portanto, o salário
anual deste gestor disparou logo 278.715 euros com a entrada na órbita do fundo
norte-americano do Texas, que o reconduziu e à sua equipa executiva em funções
antes da alienação. E foi crescendo, sendo que dado o período de reestruturação
em que o banco se encontra até 2022 o salário dos gestores tem um tecto, não
podendo ser superior a 10 vezes o salário médio anual dos colaboradores.
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Quando ainda
estava no perímetro do Fundo de Resolução, o Novo Banco não dispunha de
administradores não executivos, sendo gerido pelos sete elementos encabeçados
por Ramalho, a maioria dos quais ainda se mantém em funções. Na altura, foram
indicados pelo Fundo de Resolução e agora são pelo Lone Star (e sem intervenção
directa do Fundo de Resolução, apesar de manter 25% do capital do Novo Banco).
A partir do
momento em que passou a ser gerido integralmente pelo accionista privado, foi
criado um Conselho Geral e de Supervisão (CGS) presidido por Byron Haynes, que
recebe pela função 378 mil euros, quase tanto quanto o CEO, apesar de não estar
presente na instituição no dia-a-dia, como reconheceu o próprio numa entrevista
ao Expresso. Já o vice-presidente, Karl Eick, recebe 250 mil euros.
Com nove membros,
todos indicados pelo investidor do Texas, as responsabilidades do Novo Banco
com o Conselho Geral e de Supervisão cifram-se em 878 mil euros. Apenas um dos
elementos é português – Carla Alexandra Antunes da Silva –, que aufere 60 mil
euros como não executiva e que tem origem em bancos norte-americanos como
Haynes confirmou na mesma entrevista.
Somando as
remunerações dos executivos e dos não executivos, os encargos do Novo Banco com
o conselho de administração e com o Conselho Geral e de Supervisão totalizam
3.180.332 euros.
O detalhe está no
facto de os salários dos administradores executivos do Novo Banco terem subido
assim que o banco foi vendido e os prejuízos disparado para 3,866 mil milhões:
em 2017, 1,395 mil milhões (valor que em 2016 foi de apenas 788 milhões); em
2018, 1,412 mil milhões; em 2019, 1,058 mil milhões.
Foi no exercício
do ano passado que a gestão de António Ramalho garantiu um prémio de dois
milhões de euros, condicionado ainda ao cumprimento de determinados critérios,
como a solidez da instituição e um desempenho operacional positivo de forma
consecutiva.
Foi neste período
que a gestão começou a “descobrir” uma sucessão de créditos mal provisionados
no Novo Banco, que atribuiu ao “antigamente”, numa menção de António Ramalho a
Ricardo Salgado. E foi o que possibilitou ao Lone Star, passados apenas quatro
meses de ter assumido o controlo da instituição, começar a accionar o mecanismo
de capital contingente, uma almofada de 3,8 mil milhões de euros, que
constituía a protecção dada pelas autoridades portuguesas ao negócio.
Uma almofada de
segurança que podia ser accionada caso a gestão do Novo Banco descobrisse novas
imparidades ou tivesse de reconhecer perdas resultantes de vendas de activos a
desconto. E são estas as razões que justificaram as injecções de 2,7 mil
milhões de euros no Novo Banco por parte do Fundo de Resolução, com
financiamento público.
Tudo isto se
passou num ciclo de maior crescimento económico em Portugal, quando os activos
sofrem valorizações, pelo que, em regra, as contas dos bancos até melhoram. E
sabe-se que, na fase que antecedeu a venda do Novo Banco ao Lone Star, os
relatórios e contas de 2014 (de Agosto a Dezembro), de 2015 e de 2016,
assinados por António Ramalho, auditados pela PwC e aprovados pela equipa do
Banco de Portugal (BdP), encabeçada por Carlos Costa, consideraram que as
carteiras de crédito herdadas do BES estavam correctamente provisionadas. As
tais que agora a gestão veio dizer que tinham muitos buracos.
As contas
anteriores à venda, como as seguintes, foram todas validadas pelo Fundo de
Resolução, que tem à frente o vice-governador Luís Máximo dos Santos, que
reporta ao Ministério das Finanças, o seu credor.
Outras
informações que se retiram dos relatórios e contas, neste caso do documento
relativo a 2019, é que o Novo Banco é totalmente monitorizado pelo Lone Star,
que ocupa todos os lugares nos comités de controlo interno. O comité de risco é
formado por Byron Haynes (presidente do Novo Banco), Karl-Gerhard Eick
(vice-presidente), Kambiz Nourbakhsh e Benjamin Dickgiesser, que, entre outras
coisas, tem competências “no que respeita a certas operações de crédito e a
alterações de políticas de risco.”
Por seu turno,
Byron Haynes, Karl-Gerhard Eick e Benjamin Dickgiesser integram o comité de
remunerações, cabendo-lhes aprovar a contratação de colaboradores com
remuneração anual superior a 200 mil euros. John Herbert, Robert Sherman,
Donald Quintin e Mark Coker decidem todas as nomeações que o banco faz.
Já o comité para
as matérias financeiras, o que faz o “acompanhamento e a supervisão da
performance financeira”, das “políticas e processos de reporte de contas e no
acompanhamento do auditor externo” é composto pelo presidente do CGS, Haynes,
pelo vice-presidente do banco, Eick, e por Kambiz Nourber. No comité de
compliance estão Robert Sherman, John Herbert e Mark Coker.
Esta terça-feira,
em entrevista ao Eco, António de Sousa, o ex-governador do Banco de Portugal, e
fundador do fundo de recuperação de crédito vendido pela banca, ECS, defendeu:
“dar bónus numa empresa com prejuízos não é necessariamente mau, desde que já
se saiba que a empresa não vai ter bons resultados, mas pode melhorá-los
bastante.” O ex-presidente da CGD sublinhou ainda que “só não sabemos se é o
caso no Novo Banco”.
tp.ocilbup@arierrefc
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