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EDITORIAL
Um enxovalho ao primeiro-ministro
Vejam bem: um presidente de um clube a braços com várias
suspeitas judiciais e embrulhado nos calotes ao BES recusou a “honra” que o
primeiro-ministro lhe concedera em apoiá-lo.
MANUEL CARVALHO
17 de Setembro de
2020, 19:19
https://www.publico.pt/2020/09/17/politica/editorial/enxovalho-primeiroministro-1931968
Na sequência de
“uma das campanhas mais hipócritas e demagógicas” que Luís Filipe Vieira guarda
na memória, surgiu a decisão: a sua honra dispensa a presença de políticos na
comissão que a devia exaltar. De uma penada, o presidente do Benfica tentou
travar o prolongamento do “clima difamatório” que o caso gerou e,
subliminarmente, resolver um problema ao primeiro-ministro (e a outros
políticos).
Foi pior a emenda
do que o soneto, não tanto para ele, mas principalmente para os que foram
afastados da comissão. É preciso um agudo exercício de memória para nos
recordarmos de um enxovalho tão gritante à dignidade institucional de um chefe
do Governo da República como este. Vejam bem: um presidente de um clube a
braços com várias suspeitas judiciais e embrulhado nos calotes ao BES recusou a
“honra” que o primeiro-ministro lhe concedera em apoiá-lo.
O episódio vale o
que vale na torrente de acontecimentos que vivemos, mas a sua carga simbólica
tem um efeito preocupante para a qualidade da vida pública e para a imagem que
os cidadãos têm sobre quem os governa. António Costa, já o escrevemos duas vezes
neste espaço, cometeu um erro crasso ao aceitar integrar a comissão de honra de
um candidato associado pela Justiça a casos graves como a Operação Lex.
Quem exerce
cargos públicos de alta responsabilidade não deve trilhar caminhos sinuosos
como os do futebol, sejam Rui Moreira ou Manuel Pizarro no FC Porto, sejam
Fernando Medina e António Costa no Benfica. Perante o natural clamor público
que esse gesto gerou, tinha apenas uma solução: sair pelo seu próprio pé. Não o
fez e deixou que o presidente do Benfica o queimasse com uma expulsão.
Quando em causa
está uma degradação de estatuto deste nível, sai mal o autor da malfeitoria e
sai mal a sua vítima – ao contrário de muitas suspeitas, parece inverosímil que
tenha sido o primeiro-ministro a pedir o afastamento, pois, se assim fosse,
teria anunciado esse pedido previamente. E, como essa vítima é o
primeiro-ministro de Portugal, a malfeitoria repercute-se em todos.
Goste-se ou não
de António Costa, ele é a pessoa que os cidadãos escolheram para governar. E é
exactamente nesta dimensão que se deve situar o problema. O episódio é
degradante para a democracia.
Depois da
justificação pífia de que na comissão de honra estava o cidadão e não o
primeiro-ministro, depois do óbvio desconforto do Presidente da República ou de
correligionários do partido, deixou de haver uma boa porta para sair. Ninguém
pensaria, no entanto, no impensável: António Costa ser retirado da comissão de
honra de Luís Filipe Vieira por Luís Filipe Vieira só parecia ser possível nas
páginas do Inimigo Público.
Vieira retira Costa e Medina da lista de honra
Presidente do Benfica diz ter retirado todos os titulares
de cargos públicos do apoio à sua recandidatura à presidência do clube.
Luciano Alvarez
Luciano Alvarez
17 de Setembro de 2020, 13:47 actualizado a 17 de Setembro de 2020, 14:06
https://www.publico.pt/2020/09/17/politica/noticia/vieira-retira-costa-medina-lista-honra-1931904
Luís Filipe
Vieira retirou da sua comissão de honra à recandidatura a presidente do Benfica
todos os titulares de cargos públicos, entre os quais estavam o
primeiro-ministro António Costa e Fernando Medina, presidente da Câmara de
Lisboa .
Horas antes de o
primeiro-ministro se deslocar a Belém para a reunião semanal com o Presidente
da República, e depois de Marcelo Rebelo de Sousa ter anunciado que queria
ouvi-lo sobre a polémica do apoio a Vieira, o presidente do clube “encarnado”
deu conta deste facto através de um comunicado.
“Depois de
assistir nos últimos dias a uma das campanhas mais hipócritas e demagógicas de
que tenho memória, entendo ter chegado o momento de reagir”, afirma Vieira logo
no início do comunicado.
Na nota tornada
pública, o presidente do Benfica diz que se vivem “tempos em que a justiça
passou a ser feita no Facebook, nas redes sociais e nos media”. Tempos,
acrescenta, “em que os juízes foram substituídos por jornalistas e
comentadores”. Profissionais que diz terem agido num “registo de excessos, sem
conhecimento dos factos, mas com a cumplicidade de quem os vai parcialmente
alimentando com o único objectivo de contaminar a percepção pública, vão
minando o espaço mediático”.
Tempos ainda,
refere, “em os jornais pré-anunciam condenações e em que líderes partidários e
políticos mais populistas, propositadamente, esquecem um dos princípios básicos
em que se assenta o nosso Estado de direito”.
“Tempos em que
falta seriedade e rigor. Tempos em que, quando a justiça finalmente chega, já
não há justiça. Tempos em que o bom-nome e a reputação das pessoas se perdem na
avalancha mediática que atropela qualquer presunção de inocência”, acrescenta.
O presidente do
Benfica diz também que “nos últimos quatro dias, António Costa, Fernando Medina
e muitos outros foram atacados de forma incompreensível e torpe. “Entenderam
dar-me [o apoio], como já o tinham feito em 2012 e 2016 sem que se tenha
assistido a qualquer tipo de alarido”, lembra, criticando a "percepção
pública que, de forma concertada, os media foram ‘construindo’, deturpando e
usando como catalisador de uma campanha populista de difamação”.
O presidente do
clube da Luz diz estar de “consciência tranquila” e garante: “Se for condenado,
no futuro, em algum dos processos de que nestes dias tanto se fala, serei o
primeiro a tomar a iniciativa, saindo pelo meu pé da presidência do Sport
Lisboa e Benfica”.
Acusa ainda “os
líderes partidários, e alguns dos políticos que mais se indignaram nestes dias”
de “estarem mais preocupados em combater a tendência de transformar em sentença
transitada a notícia de uma suspeita ou de uma acusação judicial”.
Vieira diz ser
seu dever “agradecer a todos os benfiquistas” que lhe manifestaram apoio, mas
acrescenta que não pode permitir “que instrumentalizem” o Benfica”. “Não posso
tolerar que este clima difamatório se prolongue, nem que seja aproveitado para
atacar de forma indevida o carácter e a seriedade de quem se limitou a
expressar-me, enquanto sócio, o seu apoio.”
Por fim, agradece
a todos a disponibilidade manifestada e conclui: “É triste que, 46 anos depois
do 25 de Abril, se tenha de censurar quem livremente decidiu manifestar-me o
seu apoio, mas o populismo e a demagogia dos dias de hoje obrigam-me a fazê-lo
de forma a terminar com uma polémica injustificada e profundamente hipócrita.”
Questionado sobre
a retirada do nome do líder do executivo socialista, o Governo não quis
comentar o assunto. No final do Conselho de Ministros desta quinta-feira, a
ministra de Estado e da Presidência, Mariana Vieira da Silva, respondeu aos
jornalistas que não tinha “qualquer comentário a fazer”.
tp.ocilbup@zeravla.onaicul



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