CORONAVÍRUS
Ajudas públicas à aviação dão força ao comboio
França e Áustria fazem depender os apoios estatais às
suas companhias de bandeira da redução de voos de curta distância, para dar
oportunidade ao modo ferroviário.
Carlos Cipriano 7
de Maio de 2020, 6:48
https://www.publico.pt/2020/05/07/economia/noticia/ajudas-publicas-aviacao-dao-forca-comboio-1915380
As companhias
aéreas vão precisar do dinheiro dos contribuintes para poderem voltar a voar,
mas há países que exigem ao transporte aéreo uma nova abordagem que tenha em
conta um maior respeito pelo meio ambiente. É o caso da França, que se prepara
para injectar sete mil milhões de euros na sua companhia de bandeira, mas à
qual o governo exige que reduza em 50% as emissões de CO2 nos voos domésticos
até 2024.
“Sempre que
houver uma alternativa ferroviária aos voos internos com uma duração inferior a
2h30, esses voos devem ser drasticamente reduzidos”, disse o ministro da
Economia e das Finanças, Bruno le Maire.
“O avião não pode
ser encarado como um modo de transporte para fazer em 1h00 ou 1h15 trajectos
que podem ser feito com menos CO2 por um comboio em 2h00 ou 2h30”, disse o
ministro, acrescentando que “isto é uma regra e nós vamos fazê-la respeitar”.
Do ponto de vista
prático, e de acordo com a BFM.TV, esta regra terá implicações nos voos desde
Paris para Rennes, Nantes, Bordéus e Lyon, os quais só deverão ser efectuados
para assegurar voos de ligação.
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A Áustria é outro
país que faz depender as ajudas à sua companhia de bandeira, a Austrian
Airlines, à garantia de “uma redução dos voos de curta distância, maior
cooperação com as empresas ferroviárias, maior utilização de combustíveis
ecológicos e maiores contribuições fiscais”, de acordo com o Euractiv.
Medidas que
agradam, naturalmente, aos ambientalistas, que entendem que deveriam ser
seguidas por mais países. Francisco Ferreira, da organização ambientalista
Zero, diz que “a França e a Áustria podem dar-se ao luxo de fazer esta
negociação com as suas companhias aéreas, mas em Portugal isso seria difícil
porque falha completamente a oferta de transporte ferroviário na sua ligação à
Europa e de ligação dentro do próprio país”.
Por isso, defende
que “uma das coisas indispensáveis para a retoma económica era deixar de se
continuar a adiar uma solução ferroviária Lisboa – Porto e Lisboa – Madrid”.
Para Francisco
Ferreira, estudar e executar estas ligações devem deixar de ser um tabu e
passarem a ser uma prioridade.
Manuel Tão,
doutorado em Transportes e investigador na Universidade do Algarve, recorda que
a França e o seu presidente actual, Emmanuel Macron, foram os patrocinadores do
acordo de Paris no que diz respeito à redução de emissões de gases com efeito
de estufa e que, por isso, esta medida sobre a Air France é absolutamente
coerente.
“Não faria
sentido estar a apoiar um modo de transporte com consequências ambientais
nocivas quando o TGV responde à mesma procura com menores custos para o
ambiente. Por isso, não deve haver concorrência entre a aviação e a alta
velocidade”.
O especialista
concorda que o Estado português “deve apoiar a TAP porque os custos de a deixar
cair seriam muito superiores”, mas lamenta que o Governo não ponha em causa a
ponte aérea Lisboa – Porto, que é um absurdo do ponto de vista ambiental, mas
também técnico, pois rouba capacidade aos aeroportos que poderia ser usada por
voos de longo curso”.
Esta não é a
opinião do comandante Luís Garção, membro da Associação Portuguesa de Pilotos
de Linha Aérea (APPLA), para quem “não há nenhum modo de transporte que possa
concorrer com o avião no percurso Lisboa – Porto” dado que o voo entre as duas
cidades demora 45 minutos e o Alfa Pendular demora 2 horas e 40 minutos (desde
o Oriente).
No entanto, não o
choca as medidas que estão a ser impostas às companhias aéreas pelos diversos
governos para as tornar ambientalmente mais sustentáveis. O grande problema é
se essas imposições não forem iguais para todas, porque isso desvirtua a
concorrência, recorda.
Por isso, Luís
Garção concorda com o ministro da tutela, Pedro Nuno Santos, quando diz que as
regras têm de ser iguais para todos na União Europeia. “Se por imposição legal
o limite máximo de passageiros para cada voo for de 50% para uns e de dois
terços para outros, então as condições de concorrência não são iguais para
todas as companhia aéreas”, diz este piloto, que espera um resposta conjunta e
uniforme por parte das autoridades aeronáuticas europeias.
Na equação entram
também as low cost, que se têm queixado de serem preteridas nas ajudas
estatais. Luís Garção entende que não têm razão pois estas “procuram
exclusivamente o lucro enquanto as chamadas companhias de bandeira têm uma
filosofia de gestão diferente e prestam também serviço público”.
É o caso da TAP,
exemplifica, que tem voos para destinos menos rentáveis e que realiza voos de
repatriamento, voos humanitários e, ultimamente, até de transporte de materiais
para combater a covid-19.
Seja, como for, e
independentemente das ajudas e imposições agora impostas às companhias aéreas,
este especialista entende que, no longo prazo, quando a situação normalizar,
será novamente o mercado e as leis da oferta e da procura a ditar as regras de
funcionamento do mercado aeronáutico e da mobilidade.
tp.ocilbup@onairpic.solrac
OPINIÃO
A definitiva viagem da TAP
Nacionalize-se a TAP, mas impondo ao Estado Português as
mesmas exigências ambientais na sua gestão na linha do Green Deal!
António Sérgio Rosa de Carvalho
5 de Maio de
2020, 16:45
Kate Raworth, a
autora da Economia Donut (Doughnut Economics, Creating a 21st century economy),
ou seja, uma Economia Circular em lugar de Linear, que mantém a ideia do
crescimento dentro dos limites do permitido ecologicamente e aceitável na nossa
coabitação com a Natureza, compara o conceito do crescimento ilimitado a um
avião, em cujos passageiros se encontram prisioneiros de uma linha ascendente
imparável. Avião esse que nunca poderá voltar a aterrar.
O corona
obrigou-nos repentinamente a uma ‘aterragem forçada’, interrompendo
abruptamente o transe orgiástico do festim consumista, libertando-nos, num
processo doloroso e dramático.
Assim, o
“Lockdown” roubando-nos a, tida como natural, liberdade de acção no fluxo da
vida, ofereceu-nos uma outra liberdade. A liberdade do “Slowdown”, uma pausa
para reflectir e assumir um novo curso e uma trajectória alternativa de Vida.
Uma Vida de maior diálogo com a Natureza e sintonia com o Planeta.
Ursula Von Der
Leyen já tinha avisado a 16 de Abril, no tumulto das decisões das ajudas
financeiras, que não iria abdicar do “Green Deal”. O pacote ‘Bazuka’ a ser
apresentado nos meados de Maio, irá associar as ajudas financeiras às
exigências ambientais.
Para ficarmos
dentro da metáfora da ‘viagem aérea’, a aviação tem conhecido um crescimento
selvagem e irresponsável na perspectiva ambiental. O sector não parou de
crescer, e hoje em dia conta com, pelo menos, mais de duas centenas entre
companhias privadas e públicas.
A pegada de
carbono também não parou de aumentar, e as companhias de aviação têm
demonstrado muito mais inclinação para especularem com o seu capital financeiro
em autovalorização, investindo milhares de milhões na compra das próprias
acções, as famosas “buy backs”, do que para investirem em verdadeiras e efectivas
medidas capazes de minimizarem os efeitos dessa pegada.
A atitude tem
sido a de uma gestão financeira absolutamente privada, dentro do lema “não se
metam nos nossos assuntos financeiros”.
Agora que o
pânico se instalou, pois tudo indica que vamos a caminho de uma selecção real e
natural de viabilidade comercial, o que implica a falência de várias dezenas de
Companhias, passou-se do princípio dos ‘Lucros são Privados’ para o princípio
de os ‘Riscos são Públicos’ e devem ser sustentados com o dinheiro do
contribuinte.
Ora a TAP, com o
pedido dos seus 600 ou 700 milhões de euros, não é um caso único.
Apenas para
utilizar um exemplo: a Air France vai receber 7 mil milhões de euros. 4 mil
milhões virão dos Bancos com garantias de 90% do Estado. Os outros 3 mil
milhões virão directamente do Estado.
Mas este
verdadeiro “tiro de Bazuka” não irá ser oferecido sem exigências. O que o
Ministro Bruno Le Maire exige é que a Air France se transforme na Companhia
mais Verde da Europa.
Como a França tem
de reduzir a sua pegada de carbono em 50% nos voos domésticos nos próximos
cinco anos, o Ministro propõe a substituição total das short trips por viagens
de comboio.
Isto, de resto,
vai ao encontro do pacote a apresentar este mês por Von der Leyen, que anuncia
grandes investimentos no transporte ferroviário e fortes exigências ambientais
para o tráfego aéreo.
Falar em Portugal
de transporte ferroviário é ridículo. O país ainda se encontra prisioneiro da
cega e irresponsável síndroma ‘Montijo”.
Só há uma medida
verdadeiramente efectiva na gestão ambiental do transporte aéreo: voar menos!
Deixe-se então a
selecção natural de viabilidade financeira e comercial real funcionar,
reduzindo as companhias ao número essencial de algumas dezenas. Nacionalizando
uma grande parte delas.
Nacionalize-se a
TAP, mas impondo ao Estado Português as mesmas exigências ambientais na sua
gestão na linha do Green Deal!
Historiador de Arquitectura
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