A UE e a escalada contra os imigrantes
Editorial/Público
O pretexto imediato são os abusos. Mas o que está em curso
na Europa, com passos mais decididos no Reino Unido e agora na Alemanha, é uma
campanha contra a imigração. No momento em que caíam, a 1 de Janeiro de 2014,
as barreiras que impediam o acesso de trabalhadores romenos e búlgaros ao
mercado comunitário, ameaçam erguer-se barreiras de outra ordem: combate
cerrado aos ilegais e restrição do acesso a benefícios sociais nos países de
acolhimento. David Cameron e a União Social-Cristã da Baviera (CSU) coincidem
no sentido destas restrições, agitando o fantasma de uma nova vaga migratória
de leste. É preciso combater os abusos, argumenta a CSU. Muitos lhe darão
razão, até porque existem abusos naquilo a que chamam “turismo de subsídios”.
Mas essa intenção mascara uma escalada antiimigrantes que contraria não só o
espírito, mas também as necessidades da União Europeia. Uma escalada perigosa.
Conservadores da Baviera querem restringir acesso dos
novos imigrantes à Segurança Social
Proposta feita na véspera do
fim das barreiras que impediam o acesso de romenos e búlgaros ao mercado
comunitário
3 jan 2014 / Rita Siza / Público
A tensão entre os sociais-democratas e os
democratas-cristãos que há menos de um mês assinaram um acordo para a formação
de um novo Governo de coligação na Alemanha começou a manifestar-se após a
apresentação de uma proposta no sentido de restringir o acesso aos pagamentos
da Segurança Social germânica por parte de cidadãos de outros países
comunitários que acabem de se estabelecer no país.
A proposta, avançada pela União Social-Cristã (CSU), o
partido conservador da Baviera aliado da chanceler Angela Merkel, surgiu na
véspera do fim da moratória que ainda impedia a livre circulação dos naturais
da Roménia e Bulgária, dois países que acederam à União Europeia em 2007 mas
cujos trabalhadores continuavam impedidos de integrar plenamente o mercado
comunitário. No dia 1 de Janeiro, as barreiras que dificultavam o movimento
destes trabalhadores foram definitivamente levantadas, provocando uma reacção
em várias capitais europeias. Os conservadores alemães têm estado a falar de
uma nova vaga migratória dos países de Leste – a proposta, explicaram, tem como
objectivo dissuadir os “imigrantes pobres” de procurar a Alemanha, e travar o
“turismo de subsídios” e as fraudes na obtenção de prestações sociais.
Em comunicado, a CSU defende que os cidadãos comunitários
tenham o acesso à Segurança Social vedado por um período de três meses após a
instalação no país, bem como a deportação e proibição de entrada de todos os
imigrantes que tenham contas a ajustar com o sistema social alemão. “A Europa
não nos pode obstruir nem limitar as nossas possibilidades de aprovar
regulamentos nacionais para lidar com a imigração que é motivada pela pobreza”,
dizia o documento.
“O CSU não entende os factos concretos sobre esta questão, e
pior, não entende o que é a Europa e evidentemente não quer entender”, criticou
Michael Roth, o representante especial para os assuntos europeus do ministro
dos Negócios Estrangeiros, que é membro do Partido Social Democrata (SPD), de
centroesquerda. Questionado pelo jornal Süddeutsche Zeitung, de Munique, o
ministro Frank-Walter Steinmeier classificou a livre circulação entre os
diferentes países comunitários como “um aspecto fundamental da integração
europeia”, e lembrou que a Alemanha tem sido um dos países que mais
beneficiaram dessa política. “Estar a pô-la em dúvida prejudica a Alemanha e
prejudica a União Europeia”, lamentou.
Apesar das críticas, o líder da CSU e chefe do governo da
Baviera, Horst Seehofer, manteve-se firme na defesa da sua proposta. “Temos de
estabelecer as medidas necessárias para proteger o nosso sistema de segurança
social. A aceitação da liberdade de movimento europeia é posta em causa pela imigração
que abusa do sistema, não pelas justificadas medidas contra os abusos”, disse,
em resposta aos sociais-democratas.
Aliás, Seehorf estranhou a reacção dos homens do SPD, e
lembrou que no programa de Governo aceite pelos três partidos que asseguram o
executivo constava um compromisso para “promover medidas que limitem os
incentivos às pessoas que procuram aproveitar-se indevidamente do sistema de
segurança social”.
A liberdade de movimentos dos trabalhadores romenos e
búlgaros também está a gerar controvérsia no Reino Unido, com o Governo de
Londres a enviar para o Parlamento um projecto de revisão da lei de imigração
que contempla restrições semelhantes ao acesso a benefícios sociais por parte
de imigrantes, e prevê medidas duras contra os indocumentados ou imigrantes
ilegais.
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