terça-feira, 1 de dezembro de 2020

Costa avisa Hungria e Polónia que braço-de-ferro é para resolver na cimeira da próxima semana

 



UNIÃO EUROPEIA

Costa avisa Hungria e Polónia que braço-de-ferro é para resolver na cimeira da próxima semana

 

António Costa foi a Bruxelas para preparar o Conselho Europeu e a presidência rotativa da UE. Ao lado de Michel, deixou um aviso aos dois países que ameaçam travar o plano de recuperação da crise: não pensem que terão uma segunda oportunidade de negociar os acordos que já foram concluídos.

 

Rita Siza

Rita Siza , Bruxelas 1 de Dezembro de 2020, 21:20

https://www.publico.pt/2020/12/01/mundo/noticia/costa-avisa-hungria-polonia-braco-ferro-resolver-cimeira-proxima-semana-1941393

 

“Não há um Plano B” para salvar a União Europeia da crise provocada pela pandemia, só há uma única hipótese que é concluir o mais rapidamente possível o processo de aprovação definitiva do histórico acordo para a recuperação económica fechado pelos 27 em Julho, vincaram o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, e o primeiro-ministro português, António Costa — que esta terça-feira realizou uma visita relâmpago a Bruxelas para contactos preparatórios da “difícil” cimeira europeia de 10 e 11 de Dezembro, e também da presidência portuguesa da União Europeia, que tanto pode ser auspiciosa, com o virar da página para uma nova era pós-covid, como pode arrancar agourada pelo fracasso das negociações entre os líderes na próxima semana.

 

“Não subestimamos as dificuldades nem a gravidade da situação com que nos confrontamos, e estamos a trabalhar para encontrar uma solução e ultrapassar este obstáculo, de forma a poder finalmente implementar o acordo que alcançámos em Julho”, frisou Charles Michel, referindo-se à ameaça de veto, repetida pela Hungria e a Polónia, à aprovação do próximo orçamento comunitário para o período de 2021-27, e do fundo de recuperação “Próxima Geração UE”.

 

Sem estes instrumentos financeiros, a União Europeia não terá capacidade para “avançar junta” a partir do próximo ano, dramatizou Charles Michel, insistindo que é o pacote financeiro de 1,82 biliões de euros, negociado e aceite por todos os líderes, que permite que os 27 Estados membros possam “investir juntos, reformar juntos, modernizar juntos, e enfrentar e resolver juntos os desafios”. A crise da covid-19, acrescentou, só veio mais uma vez “provar a importância da nossa cooperação e integração”.

 

De momento, esse ambicioso plano para o relançamento e a transformação da economia europeia, que este ano registará a sua maior quebra desde o pós-guerra por causa da pandemia, está comprometido pela oposição dos dois países que contestam a aplicação de um novo regime de condicionalidade a ligar a distribuição dos fundos por Bruxelas ao respeito pelas normas do Estado de direito nos Estados membros. Incapazes de impedir a entrada em vigor do novo mecanismo de Estado de direito, os líderes da Hungria e Polónia prometem travar o orçamento comunitário, que exige um voto por unanimidade.

 

“Não é um problema novo, sabíamos em Julho que o nosso acordo tinha pontos difíceis para a sua implementação. Este mecanismo continua a ser difícil de aceitar para alguns. Vamos tentar resolver esse problema para que a UE possa ficar plenamente dotada da capacidade financeira e operacional para fazer a sua transição climática e digital”, apelou o presidente do Conselho Europeu.

 

Talvez os líderes tivessem confiado, no Verão, que chegado o fim do ano o húngaro, Viktor Orbán, e o polaco, Mateusz Morawiecki, deixassem cair as suas ameaças. Só que os dois mantém-se inflexíveis: preferem quebrar do que torcer. Esta terça-feira, Costa aconselhou-os a não cometer o mesmo erro dos seus parceiros no Verão, e a confiar que estes vão de alguma maneira mudar de posição na cimeira da próxima semana. “Que ninguém possa pensar que terá uma segunda oportunidade para reabrir aquilo que já está neste momento concluído”, avisou o primeiro-ministro, que foi peremptório ao afirmar que o regulamento do mecanismo do Estado de direito, negociado pelo Conselho da UE e o Parlamento Europeu, é para manter sem mudar uma vírgula.

 

“Fizemos uma negociação e obtivemos um acordo de grande importância com o Parlamento Europeu. Não é altura de reabrir o resultado do trílogo, é altura de resolver os problemas respeitando o que já está acordado”, afirmou Costa, que aproveitou o embalo para um outro recado politico a Varsóvia e Budapeste. Portugal não só defende o acordo para o mecanismo de Estado de direito, como considera que “os valores da UE não são só condições de acesso aos fundos”. “São muito mais do que isso: são condições de adesão e permanência na UE. E quem não respeita estes valores, não pode fazer parte da União Europeia”, considerou.

 

O presidente do Conselho Europeu não quis dizer se, no futuro (mais próximo ou mais longínquo), o caminho daqueles que estão actualmente a ser investigados por violações das regras do Estado de direito, e por causa disso não apoiam o plano para a recuperação europeia da crise, pode ser separado. “Não quero dizer nada hoje que possa de alguma forma prejudicar as negociações” que estão a ser lideradas pela presidência rotativa da Alemanha, que merece todo o apoio e confiança de Charles Michel e de António Costa. “Portugal já manifestou todo o seu apoio aos esforços desenvolvidos pela chanceler Merkel para concluir com sucesso este e outros dossiers muito difíceis”, que segundo o primeiro-ministro não podem esperar pelo início da presidência rotativa de Portugal.

 

“É preciso que todos aqueles que estão neste momento envolvidos num braço de ferro percebam que não há espaço para um plano B e não há espaço para deixar esta matéria para a próxima presidência”, declarou António Costa. “Esta matéria tem de ser resolvida até às 24 horas do dia 31 de Dezembro de 2020, e não pode passar para as zero horas do dia 1 de Janeiro de 2021”, porque nesse preciso minuto a UE já estará numa situação de bloqueio orçamental.

 

Sem o quadro financeiro plurianual para 2021-27 aprovado, não só não há dinheiro como deixa de haver base jurídica para a Comissão executar os seus programas e políticas: a actividade da União ficará paralisada. “As regras da UE, não sendo tão dramáticas como o shutdown que existe nos Estados Unidos, verdadeiramente pouco mais permitem à Comissão fazer do que pagar o que está previsto em matéria de [apoios directos à produção] no primeiro pilar da Política Agrícola Comum e as despesas de funcionamento das instituições”, assinalou Costa. “Mas por exemplo, em relação à política de coesão, implicaria um corte radical das verbas que já estão comprometidas para serem despendidas no próximo ano nos diferentes Estados membros”, notou, sem precisar de recordar que as renitentes Polónia e a Hungria são duas das principais beneficiárias destes fundos estruturais.

 

De resto, em total sintonia, Michel e Costa referiram-se aos desenvolvimentos mais recentes no combate à pandemia, e falaram num outro “momento histórico”, para a Europa e a presidência portuguesa, que será o previsível avanço da vacinação contra o novo coronavírus no início de 2021. “A grande prioridade da humanidade no próximo ano, e da Europa no próximo semestre, é conseguir garantir que temos disponível uma vacina que tenha uma eficácia efectiva para travar a covid-19”, afirmou o primeiro-ministro. A presidência portuguesa vai certificar-se que a vacina possa chegar, no mesmo dia, a todos os países da Europa, para que “a partir daí se possa iniciar uma campanha de vacinação justa e que assegure uma imunização global contra a covid-19”, prometeu.

 

tp.ocilbup@azis.atir

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