UNIÃO EUROPEIA
Costa avisa Hungria e Polónia que braço-de-ferro é para
resolver na cimeira da próxima semana
António Costa foi a Bruxelas para preparar o Conselho
Europeu e a presidência rotativa da UE. Ao lado de Michel, deixou um aviso aos
dois países que ameaçam travar o plano de recuperação da crise: não pensem que
terão uma segunda oportunidade de negociar os acordos que já foram concluídos.
Rita Siza
Rita Siza ,
Bruxelas 1 de Dezembro de 2020, 21:20
“Não há um Plano
B” para salvar a União Europeia da crise provocada pela pandemia, só há uma
única hipótese que é concluir o mais rapidamente possível o processo de
aprovação definitiva do histórico acordo para a recuperação económica fechado
pelos 27 em Julho, vincaram o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, e
o primeiro-ministro português, António Costa — que esta terça-feira realizou
uma visita relâmpago a Bruxelas para contactos preparatórios da “difícil”
cimeira europeia de 10 e 11 de Dezembro, e também da presidência portuguesa da
União Europeia, que tanto pode ser auspiciosa, com o virar da página para uma
nova era pós-covid, como pode arrancar agourada pelo fracasso das negociações
entre os líderes na próxima semana.
“Não subestimamos
as dificuldades nem a gravidade da situação com que nos confrontamos, e estamos
a trabalhar para encontrar uma solução e ultrapassar este obstáculo, de forma a
poder finalmente implementar o acordo que alcançámos em Julho”, frisou Charles
Michel, referindo-se à ameaça de veto, repetida pela Hungria e a Polónia, à
aprovação do próximo orçamento comunitário para o período de 2021-27, e do
fundo de recuperação “Próxima Geração UE”.
Sem estes
instrumentos financeiros, a União Europeia não terá capacidade para “avançar
junta” a partir do próximo ano, dramatizou Charles Michel, insistindo que é o
pacote financeiro de 1,82 biliões de euros, negociado e aceite por todos os
líderes, que permite que os 27 Estados membros possam “investir juntos,
reformar juntos, modernizar juntos, e enfrentar e resolver juntos os desafios”.
A crise da covid-19, acrescentou, só veio mais uma vez “provar a importância da
nossa cooperação e integração”.
De momento, esse
ambicioso plano para o relançamento e a transformação da economia europeia, que
este ano registará a sua maior quebra desde o pós-guerra por causa da pandemia,
está comprometido pela oposição dos dois países que contestam a aplicação de um
novo regime de condicionalidade a ligar a distribuição dos fundos por Bruxelas
ao respeito pelas normas do Estado de direito nos Estados membros. Incapazes de
impedir a entrada em vigor do novo mecanismo de Estado de direito, os líderes
da Hungria e Polónia prometem travar o orçamento comunitário, que exige um voto
por unanimidade.
“Não é um
problema novo, sabíamos em Julho que o nosso acordo tinha pontos difíceis para
a sua implementação. Este mecanismo continua a ser difícil de aceitar para
alguns. Vamos tentar resolver esse problema para que a UE possa ficar
plenamente dotada da capacidade financeira e operacional para fazer a sua
transição climática e digital”, apelou o presidente do Conselho Europeu.
Talvez os líderes
tivessem confiado, no Verão, que chegado o fim do ano o húngaro, Viktor Orbán,
e o polaco, Mateusz Morawiecki, deixassem cair as suas ameaças. Só que os dois
mantém-se inflexíveis: preferem quebrar do que torcer. Esta terça-feira, Costa
aconselhou-os a não cometer o mesmo erro dos seus parceiros no Verão, e a
confiar que estes vão de alguma maneira mudar de posição na cimeira da próxima
semana. “Que ninguém possa pensar que terá uma segunda oportunidade para
reabrir aquilo que já está neste momento concluído”, avisou o
primeiro-ministro, que foi peremptório ao afirmar que o regulamento do
mecanismo do Estado de direito, negociado pelo Conselho da UE e o Parlamento
Europeu, é para manter sem mudar uma vírgula.
“Fizemos uma
negociação e obtivemos um acordo de grande importância com o Parlamento Europeu.
Não é altura de reabrir o resultado do trílogo, é altura de resolver os
problemas respeitando o que já está acordado”, afirmou Costa, que aproveitou o
embalo para um outro recado politico a Varsóvia e Budapeste. Portugal não só
defende o acordo para o mecanismo de Estado de direito, como considera que “os
valores da UE não são só condições de acesso aos fundos”. “São muito mais do
que isso: são condições de adesão e permanência na UE. E quem não respeita
estes valores, não pode fazer parte da União Europeia”, considerou.
O presidente do
Conselho Europeu não quis dizer se, no futuro (mais próximo ou mais longínquo),
o caminho daqueles que estão actualmente a ser investigados por violações das
regras do Estado de direito, e por causa disso não apoiam o plano para a
recuperação europeia da crise, pode ser separado. “Não quero dizer nada hoje
que possa de alguma forma prejudicar as negociações” que estão a ser lideradas
pela presidência rotativa da Alemanha, que merece todo o apoio e confiança de
Charles Michel e de António Costa. “Portugal já manifestou todo o seu apoio aos
esforços desenvolvidos pela chanceler Merkel para concluir com sucesso este e
outros dossiers muito difíceis”, que segundo o primeiro-ministro não podem
esperar pelo início da presidência rotativa de Portugal.
“É preciso que
todos aqueles que estão neste momento envolvidos num braço de ferro percebam
que não há espaço para um plano B e não há espaço para deixar esta matéria para
a próxima presidência”, declarou António Costa. “Esta matéria tem de ser
resolvida até às 24 horas do dia 31 de Dezembro de 2020, e não pode passar para
as zero horas do dia 1 de Janeiro de 2021”, porque nesse preciso minuto a UE já
estará numa situação de bloqueio orçamental.
Sem o quadro
financeiro plurianual para 2021-27 aprovado, não só não há dinheiro como deixa
de haver base jurídica para a Comissão executar os seus programas e políticas:
a actividade da União ficará paralisada. “As regras da UE, não sendo tão
dramáticas como o shutdown que existe nos Estados Unidos, verdadeiramente pouco
mais permitem à Comissão fazer do que pagar o que está previsto em matéria de
[apoios directos à produção] no primeiro pilar da Política Agrícola Comum e as
despesas de funcionamento das instituições”, assinalou Costa. “Mas por exemplo,
em relação à política de coesão, implicaria um corte radical das verbas que já
estão comprometidas para serem despendidas no próximo ano nos diferentes
Estados membros”, notou, sem precisar de recordar que as renitentes Polónia e a
Hungria são duas das principais beneficiárias destes fundos estruturais.
De resto, em
total sintonia, Michel e Costa referiram-se aos desenvolvimentos mais recentes
no combate à pandemia, e falaram num outro “momento histórico”, para a Europa e
a presidência portuguesa, que será o previsível avanço da vacinação contra o
novo coronavírus no início de 2021. “A grande prioridade da humanidade no
próximo ano, e da Europa no próximo semestre, é conseguir garantir que temos
disponível uma vacina que tenha uma eficácia efectiva para travar a covid-19”,
afirmou o primeiro-ministro. A presidência portuguesa vai certificar-se que a
vacina possa chegar, no mesmo dia, a todos os países da Europa, para que “a
partir daí se possa iniciar uma campanha de vacinação justa e que assegure uma
imunização global contra a covid-19”, prometeu.
tp.ocilbup@azis.atir
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