ANA SÁ LOPES
TAP, mentiras e SIS. Mente João Galamba ou mente o
assessor?
TAP, mentiras e SIS. A história estrambólica com várias
versões da exoneração do assessor que acusa Galamba de querer mentir à CPI
Ana Sá Lopes,
Marta Moitinho Oliveira e Leonete Botelho
28 de Abril de
2023, 22:59
O Ministério das
Infra-estruturas foi esta semana cenário de um dos mais bizarros episódios que
aconteceu a um Governo desde o 25 de Abril (não conta a vez em que o Governo
Pinheiro de Azevedo entrou em greve).
O adjunto
Frederico Pinheiro acusou o ministro de querer ocultar dados à Comissão de
Inquérito à TAP, foi proibido de entrar no ministério depois de ser exonerado
por telefone, entra para reaver o computador pessoal que não lhe querem dar,
parte um vidro com uma bicicleta, as assessoras fecharam-se na casa de banho
sob ameaças de agressões físicas, enquanto o ex-adjunto telefonava à polícia
para o retirarem do Ministério de onde não conseguia sair.
No fim, é o SIS
que vai buscar o computador portátil que Frederico Pinheiro leva para casa. O
Governo moveu-lhe uma queixa-crime por se apropriar de bens do Estado – o tal
computador pessoal.
João Galamba, o
ministro acusado pelo assessor de querer mentir à Comissão de Inquérito à TAP,
demorou duas horas a reagir ao comunicado do seu ex-adjunto. A decisão foi a de
não se demitir.
Em três
parágrafos, diz que “nega categoricamente qualquer acusação de que, por
qualquer forma, tenha procurado condicionar ou omitir informação prestada à CPI
da TAP” e enfatiza que “pelo contrário, toda a documentação solicitada pela CPI
foi integralmente facultada”.
O terceiro
parágrafo reza assim: “A propósito da exoneração de Frederico Pinheiro,
esclarece-se que a mesma decorre do facto de o então adjunto ter repetidamente
negado a existência de notas de reunião que eram solicitadas pela CPI, o que poderia
ter levado a uma resposta errada à CPI por parte do gabinete do Ministério das
Infra-estruturas”.
Um comunicado que
Eurico Brilhante Dias, líder parlamentar do PS, disse, em entrevista à SIC na
noite desta sexta-feira, não ser “ortodoxo”, manifestando, no entanto,
confiança total na versão e na posição do ministro e na decisão de exonerar
Frederico Pinheiro.
O adjunto
Frederico Pinheiro emitiu um comunicado onde faz a sua cronologia dos factos. À
SIC, contou como foi sequestrado no Ministério das Infra-estruturas, quando lá
foi depois de ter sido exonerado telefonicamente para buscar o computador
pessoal.
A questão que
dividiu ministro e assessor foram as “notas” tiradas durante uma reunião entre
o deputado do PS Carlos Pereira, a CEO da TAP e o assessor do ministro a 17 de
Janeiro que, segundo João Galamba contou a próximos, nunca mais lhe entregava
as notas. A versão do adjunto é que Galamba não queria divulgar as notas.
Segundo o
comunicado esta sexta-feira emitido por Frederico Pinheiro, o gabinete de
Galamba tinha a intenção de responder à Comissão Parlamentar de Inquérito à TAP
“de que não existiam notas da reunião”. “Nesse momento Frederico Pinheiro
indica à técnica que, como sabia, tal era falso e que (…) era provável que
fosse chamado à CPI e seria obrigado a contradizer a informação que estava
naquela proposta, com a qual discordava”.
Continua o
comunicado de Frederico Pinheiro: “No dia seguinte, 25 de Abril, o ministro das
Infraestruturas contacta Frederico Pinheiro por mensagem e por telefone e, em
ambas as ocasiões, Frederico Pinheiro deixa claro que a decisão que tomaram de
não revelar a existência das notas teria de ser revista. João Galamba teve uma
reacção irada”. Uma versão: o ministro terá ameaçado o assessor de lhe dar “um
murro” e exonera-o por telefone.
Segundo o
comunicado divulgado por Frederico Pinheiro, houve ainda uma reunião entre o
ministro e a CEO da TAP na véspera da tal 'reunião secreta', encontro que nunca
havia sido divulgado antes.
Depois de
exonerado, Frederico Pinheiro decidiu deslocar-se ao ministério para levar o
computador onde tinha os documentos referentes à reunião, com o objectivo de
fazer um “back-up”, até para se defender no quadro da comissão de inquérito. O
ministério chamou o SIS para reaver o computador do Estado que o adjunto usava
e instaurou um processo-crime ao ex-assessor.
Versões contraditórias
Segundo um relato
feito ao PÚBLICO por fonte próxima de Galamba, contudo, tudo terá começado a 5
de Abril, quando se fez o levantamento de toda a informação relativa à reunião
'secreta" entre um deputado do PS, a então CEO da TAP e adjuntos do
ministro das Infra-estruturas, realizada na véspera da audição de Christine
Ourmières-Widener na Comissão Parlamentar de Economia. Numa reunião do gabinete
de João Galamba para preparar a documentação a enviar à comissão de inquérito,
Frederico Pinheiro terá garantido - segundo alguns dos presentes - que não
tinha notas nem grande memória sobre a reunião de 17 de Janeiro.
A 24 de Abril,
último dia do prazo de resposta à solicitação da CPI, quando um dos elementos
do gabinete disse que ia responder às questões colocadas e referir a ausência
de notas, Frederico Pinheiro terá afirmado que, afinal, tinha notas pessoais
escritas mas que teria de as reescrever para serem perceptíveis e que as
enviaria mais tarde. Só que não as terá enviado e deixou de responder a
telefonemas e mensagens durante várias horas. Foi nessa altura que o Ministério
terá pedido à comissão de inquérito um prolongamento do prazo para entrega das
respostas até 26 de Abril.
Ao longo do dia
25 de Abril, a chefe de gabinete do ministro e o próprio João Galamba terão
tentado, por múltiplas vezes, insistir com Frederico Pinheiro para o envio das
notas, tendo este respondido que era impossível enviá-las porque estava sem o
seu computador. Só as terá enviado por e-mail cerca das 22h30 desse dia, ou
seja, mais de 24 horas depois de lhe ter sido solicitado que as enviasse.
Na quarta-feira
os documentos foram então enviados para a CPI, incluindo as notas do adjunto,
identificadas como pessoais porque não tinham sido confirmadas por nenhum dos
presentes na reunião. Nessa mesma noite, quando aterrou de uma viagem a
Singapura, João Galamba informa Frederico Pinheiro da sua exoneração devido a
esses antecedentes, considerando que tinha tido um comportamento não conforme
com as responsabilidades de um adjunto de um gabinete ministerial. E ter-lhe-á
comunicado também que ficava proibido de voltar ao Ministério das
Infra-estruturas.
Pouco depois,
porém, Frederico Pinheiro terá voltado ao edifício do Ministério para recolher
o computador portátil que usava em funções, altura em que terá sido
interceptado por outros membros do gabinete (todos mulheres) que tentaram
evitar que levasse o equipamento. Houve gritos, confrontos físicos e até há
relatos de socos nas pessoas que o rodeavam, e Frederico Pinheiro consegue
fugir pelas escadas do prédio, pelo que a polícia terá sido chamada ao local.
As saídas foram
fechadas e Frederico Pinheiro terá ficado retido no edifício e terá arremessado
a sua bicicleta contra os vidros da fachada. Mas quando foi interceptado pela
polícia, deixaram-no sair pois não havia ninguém para contrariar a sua versão
dos factos. Isto porque as cinco pessoas do gabinete que tinham estado
envolvidas nos confrontos ter-se-ão refugiado na casa de banho feminina, de
onde só saíram quando a polícia as foi buscar. Uma delas terá sido conduzida ao
hospital para realizar exames médicos.
PSD, Bloco de
Esquerda, Iniciativa Liberal e Chega afirmaram que João Galamba já não tem
condições para continuar como ministro. Marcelo Rebelo de Sousa ainda não se
pronunciou sobre o inaudito episódio.
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