EDITORIAL
Os museus à beira do abismo
É uma situação de falência que alguns museus nacionais
parecem viver quando não têm recursos para assegurar as suas funções básicas.
David Pontes
28 de Março de
2021, 5:30
https://www.publico.pt/2021/03/28/opiniao/editorial/museus-beira-abismo-1956230
Não é possível
ficar impassível perante o retrato que em dois dias o PÚBLICO apresentou sobre
o estado dos museus nacionais, instituições insubstituíveis na construção da
identidade de um povo, enquanto locais de preservação e discussão da memória,
de descoberta de cultura, de usufruto de um percurso comum onde se condensa o
melhor de nós.
A perda dos
melhores recursos humanos, os guardiões dos tesouros, e a degradação das
instalações que deveriam ser a garantia de preservação desse património são um
sério alerta para o estado a que conduziu o permanente subfinanciamento e
abandono destas instituições. Estamos em “estado de catástrofe anunciada”, escreve
a historiadora de arte Raquel Henriques da Silva, em carta aberta ao
primeiro-ministro, sublinhando que os museus nacionais “estão na iminência de
serem palco de desastres graves”.
Ninguém quer
chegar aí, a essa sensação de perda irreparável que é ver destruído por
desleixo e incúria o que não pode nunca ser substituído. As chamas do Museu
Nacional do Brasil estão ainda bem presentes, para nos lembrar o que é sofrer
isso. Mas, quando vemos o director do Museu Nacional de Arte Antiga afirmar que
o seu espólio está verdadeiramente em risco, sabemos que estamos na borda desse
abismo.
É urgente que o
Governo saia do seu torpor. Não somos um país rico, a pandemia piorou tudo, mas
não consta que o Estado esteja falido. Mas é uma situação de falência que alguns
museus nacionais parecem viver quando não têm recursos para assegurar as
funções básicas de preservação e segurança do património à sua guarda. Quando
um museu deixa de poder proteger a sua colecção, deixa de ser museu.
Mas já não chega
o Governo, nem nunca chegou. Continuaremos a repetir os ciclos de estagnação e
a perpetuar o nosso atraso enquanto não incrustarmos nas nossas ambições e
consequentes indignações colectivas que a cultura e o conhecimento são chaves
essenciais para deslindarmos este nó. Hoje, como país, devemos alegrar-nos por
ver os professores serem vacinados, mesmo que os atrasos impeçam muitos outros
de receberem essa segurança, porque sabemos que estamos a investir no sucesso
de um sector essencial para o nosso futuro. Amanhã deveríamos, pelas mesmas
razões, cuidar da saúde, em risco de colapso, dos nossos museus.
Sem comentários:
Enviar um comentário