Juiz recusa perigo de fuga e
deixa Sócrates regressar a casa
MP considera que diminuiu o
perigo de perturbação do inquérito, mas invocava o perigo de fuga. José
Sócrates saiu ontem da cadeia de Évora e ficará a viver numa casa da ex-mulher
em Lisboa
Pedro Sales Dias,
Mariana Oliveira/ 5-9-2015 / PÚBLICO
O
ex-primeiro-ministro, José Sócrates, foi libertado ao início da noite de ontem.
O juiz Carlos Alexandre decidiu alterar a medida de coacção de prisão
preventiva para prisão domiciliária considerando que, nesta altura, o perigo de
Sócrates vir a perturbar o inquérito, nomeadamente a recolha de provas,
diminuiu.
Foi o procurador
Rosário Teixeira quem propôs ontem o regresso de Sócrates a casa, a cinco dias
do prazo máximo da reavaliação da medida de coacção preventiva. O juiz de
instrução criminal tinha de decidir até quarta-feira se mantinha ou não a
prisão preventiva aplicada a Sócrates a 24 de Novembro e que foi sucessivamente
renovada. O Ministério Público invocou também o perigo de fuga, mas Carlos
Alexandre não concordou e apenas considerou estar em causa o perigo de
perturbação de inquérito, de acordo com um comunicado da comarca de Lisboa.
No comunicado,
assinado pela presidente do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, Amélia
Almeida, fica ainda claro que Rosário Teixeira não apresentou “factos novos,
face à reapreciação [da medida de coacção a que estava sujeito Sócrates]
efectuada em 9 de Junho de 2015, pelo que foi julgado desnecessário ouvir o
arguido”. A Procuradoria-Geral da República salientou, porém, numa nota à
comunicação social que “neste período foram ouvidas cerca de dez pessoas e
realizadas mais de 30 diligências de buscas”. Aliás, acrescentou ainda que “o
Ministério Público promoveu a alteração da medida de coacção por considerar
que, face à prova reunida desde a última reapreciação, se mostra reforçada a
consolidação dos indícios”.
Facto é que a
magistrada da comarca de Lisboa sublinha ainda que Carlos Alexandre, enquanto
juiz, não poderia legalmente decidir manter Sócrates na cadeia, ou seja,
aplicar uma medida mais gravosa do que aquela promovida pelo MP a não ser que
considerasse estar em causa o perigo de fuga ou a continuação da actividade
criminosa.
O ex-governante,
que estava preso há mais de nove meses, saiu da cadeia de Évora quando faltavam
cerca de 20 minutos para as 20h, numa carrinha dos serviços prisionais a
caminho da capital e chegou às 20h57 a Lisboa. Ficará numa casa da sua
ex-mulher Sofia Fava, na Rua Abade Faria, próximo da Alameda D. Afonso
Henriques, em Lisboa, onde ontem à noite já estavam dois agentes da PSP. O
advogado João Araújo, que chegara poucos minutos antes, já o aguardava e
cumprimentou-o. Entraram depois, ambos sorridentes, para o prédio com o número
33, numa rua em obras.
Um dos advogados
de Sócrates, Pedro de Delille, reagiu de forma sucinta à decisão do juiz Carlos
Alexandre. “Foi um primeiro passo do juiz na direcção certa”, afirmou Delille
ao PÚBLICO. O defensor do ex-primeiroministro remeteu alguns esclarecimentos
para este sábado “depois de ler a decisão de cento e tal páginas notificada via
fax” e explicou que es-
ta noite vai
jantar com o cliente, na casa deste. Já o advogado João Araújo adiantou que
pretende recorrer desta decisão que considera excessiva. “Isto é apenas para
enganar”, lançou o representante do ex-primeiroministro, dizendo que Sócrates
está “óptimo” e remetendo para este sábado mais esclarecimentos.
O MP já tinha
proposto em Junho o regresso de Sócrates a casa, mas nessa altura defendia que
a prisão domiciliária deveria ser vigiada através de uma pulseira electrónica,
o que Sócrates não aceitou. A lei determina que a aplicação da vigilância
electrónica “depende do consentimento do arguido” que é “prestado pessoalmente
perante o juiz, na presença do defensor, e reduzido a auto”.
Perante essa
recusa, Carlos Alexandre manteve o ex-governante na cadeia. Três meses depois,
prazo em que as medidas de coacção são obrigatoriamente reavaliadas, o
procurador já “não promoveu a fiscalização da medida por meios electrónicos”,
adiantou a comarca de Lisboa. Sócrates será por isso vigiado por agentes da
PSP.
“O Tribunal
Central de Instrução Criminal comunicou a imposição da medida e a modalidade da
sua execução às autoridades policiais competentes e solicitou a vigilância do
seu cumprimento”, adianta no comunicado a presidente do Tribunal Judicial da
Comarca de Lisboa. Sócrates fica ainda proibido de contactar de forma directa
ou indirecta com diversas pessoas, nomeadamente arguidos do processo.
Sócrates que faz
58 anos amanhã estava preso preventivamente há mais de nove meses. Entrou na
cadeia de Évora a 24 de Novembro, depois de vários interrogatórios que se
seguiram à sua detenção no Aeroporto de Lisboa, vindo de Paris. O
ex-governante, indiciado por crimes de fraude fiscal qualificada, branqueamento
de capitais e corrupção, era até a tarde de ontem o único arguido que
continuava na cadeia.
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