CRIME
Funcionário da Segurança Social ganhou 800 mil euros com
imigrantes. Escondia mais de 57 mil euros no WC
Cinco funcionários da Segurança Social vão ser julgados
num processo de corrupção, relacionado com a atribuição, a troco de dinheiro,
do número da segurança social a cidadãos estrangeiros. Segundo o Ministério
Publico, só um destes arguidos facturou com o esquema mais de 800 mil euros.
Sónia Trigueirão
4 de Janeiro de
2021, 6:36
São 23 os
arguidos, incluindo cinco funcionários da Segurança Social, que vão a
julgamento, em Fevereiro de 2021, num processo de corrupção, relacionado com a
atribuição, a troco de dinheiro, do número da segurança social a cidadãos
oriundos sobretudo da Índia, Paquistão e Bangladesh.
Ao todo, e de
acordo com a acusação do Ministério Público (MP), os cinco funcionários da
Segurança Social obtiveram ganhos ilegais superiores a um milhão de euros, que
o MP defende que sejam declarados perdidos a favor do Estado.
Só um deles, que
trabalhava na Segurança Social do Areeiro, em Lisboa, terá lucrado com esta
actividade mais de 800 mil euros.
Nas buscas à casa
deste arguido, no dia 27 de Junho de 2017, a Policia Judiciária, encontrou
57.700 euros em dinheiro, escondidos (três maços de notas), no tecto da casa de
banho, cerca de 11.140 euros no carro e 1200 euros numa carteira.
Segundo o MP,
entre Janeiro de 2015 e Junho de 2017, só este arguido, criou 4969 números de
identificação da Segurança Social (NISS) para estrangeiros sem a devida
documentação e a troco de dinheiro, entre 100 a 200 euros por cada número.
Além de criar
NISS, este funcionário, que obteve o lucro mais elevado com o crime que os
restantes quatro, também fornecia informações a terceiros sobre os cidadãos
inscritos. Cobrava um euro por cada pesquisa. Por exemplo, entre 1 de Agosto e
12 de Agosto de 2016 fez pesquisas sobre 1040 contribuintes.
De acordo com a
acusação, pelo menos a partir de Janeiro de 2015 e até 27 de Junho de 2017, os
cinco funcionários da segurança social decidiram, por forma autónoma e ou em
conjunto com outros funcionários ou entre si, passar a criar ou alterar
inscrições de cidadãos estrangeiros na segurança social, ou seja, atribuir
NISS, a troco de quantias monetárias, a quem lhes solicitasse tais favores
mesmo sem os documentos necessários.
Para levarem a
cabo este objectivo, angariavam cidadãos estrangeiros ou portugueses, que
conheciam através do exercício da profissão, e que abordavam em circunstancias
oportunas para que, junto das comunidades estrangeiras em Portugal, instassem
cidadãos estrangeiros a criar NISS a troco de dinheiro. Estes intermediários
chegavam a ganhar entre 200 a mil euros.
O esquema era
simples e os arguidos aproveitavam-se dos cidadãos recém-chegados a Portugal,
que se deparavam com a necessidade de se legalizar.
Para se
legalizarem, estes cidadãos estrangeiros têm de apresentar um comprovativo de
inscrição na segurança social. Porém, também para se inscreverem na Segurança
Social, necessitam de apresentar um contrato de trabalho ou uma declaração
comprovativa para esse efeito e de possuir documentos de identificação. Os
cinco arguidos criavam os NISS sem os documentos necessários e estes cidadãos
nunca tinham um processo físico na Segurança Social.
A partir do
momento em que há uma inscrição válida na Segurança Social, os cidadãos
estrangeiros passam a ter acesso às prestações atribuídas, como por exemplo,
abonos de família, subsidio de funeral, subsídio de desemprego, pensão de
sobrevivência, subsídio de doença, entre outros.
O MP não tem
dúvidas que, os cinco funcionários,” para levarem a cabo uma actividade
paralela lucrativa, aproveitaram para isso os meios que tinham ao dispor na
Segurança Social, que atendendo à duração no tempo e nível de execução lhes
tomava muito do seu tempo útil do horário de trabalho”. Estes funcionários
desempenhavam funções de atendimento ao público, no Areeiro, em Marvila e no
Cacém. Não estava incluído nas suas actividades a inscrição de cidadãos,
através da criação de NISS.
“A actuação
demonstra indignidade no exercício do cargo por parte dos arguidos referidos,
bem assim, implica a perda da confiança para o exercício de funções públicas”,
sublinhou o MP na acusação, onde pediu a suspensão imediata de funções para os
cinco arguidos. Actualmente estão todos suspensos.
Como foram
apanhados?
O esquema de
“venda” de NISS apenas foi detectado porque, no dia 28 de Agosto de 2015, uma
cidadã estrangeira, inscrita na Segurança Social, reclamou por causa de um
pedido de subsídio de parentalidade. Quando os funcionários foram verificar, no
sistema, deparam-se com erros relativos aos dados da queixosa. Para verificarem
e corrigirem os dados precisaram de localizar o processo físico. Porém, não o
encontraram.
Tendo em conta
que não se localizou o respectivo processo físico de inscrição da queixosa, foi
solicitada auditoria para identificação do colaborador que tinha feito a
inscrição, bem como a alteração dos dados de identificação. Essa auditoria
permitiu identificar uma funcionária de Marvila, que agora é uma das arguidas
deste processo. Essa auditoria também revelou que houve mais inscrições na
Segurança Social sem processo físico.
Foi pedido um
esclarecimento, por correio electrónico, à funcionária, mas esta não respondeu
ao pedido. No dia 25 de Setembro voltaram a reenviar o pedido de
esclarecimento.
Dias depois, a 28
de Setembro de 2015, verificou-se que a referida funcionária se deslocou ao
serviço por volta da 8h31, tendo apenas permanecido no local de trabalho
durante 30 minutos. Depois meteu baixa médica e ficou ausente do trabalho até
28 de Março de 2016.
No âmbito desta
auditoria também verificaram que havia mais uma funcionária a fazer inscrições
irregulares, esta funcionária era tida como uma excelente profissional.
Recebeu, aliás, vários louvores entre 2012 e 2015 pela qualidade do seu
trabalho e pelo profissionalismo no atendimento às pessoas.
Outra questão que
levantou suspeitas foi que, segundo a auditoria, alguém utilizou os acessos de
funcionários que estavam de baixa médica ou de férias, para fazer inscrições
irregulares de cidadãos estrangeiros.
No dia 4 de Abril
de 2016 deu entrada na loja do cidadão de Marvila, em Lisboa, uma reclamação. O
expoente, que se identificou, declarou ter visto um dos funcionários da
Segurança Social no exterior das instalações a entregar documentos em mão a um
indivíduo. Na queixa, o expoente dizia mesmo que tido levava a crer que o
senhor que recebeu a documentação pagou ao funcionário para lhe tratar da
documentação. Este funcionário está entre os cinco acusados.
Perante a
auditoria e esta queixa, a 7 de Abril de 2016, foi feita uma participação à
Policia Judiciária.
A investigação
revelou um esquema, que envolvia cinco funcionários da Segurança Social e 18
intermediários, entre eles uma cabeleireira, um taxista, uma comercial de
telecomunicações, um professor de educação física, uma farmacêutica, um pedreiro,
um empresário e vários comerciantes, na sua maioria estrangeiros já legalizados
em Portugal e que angariavam outros cidadãos estrangeiros, nas respectivas
comunidades, dispostos a pagar para se inscreverem na Segurança Social.
O MP deduziu
acusação em Março de 2018, contra 23 arguidos, pelos crimes de corrupção
passiva agravada, corrupção activa, abuso de poder, acesso ilegítimo e
falsidade informática.
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