OPINIÃO
Se Marcelo tem razão, então os erros foram catastróficos
Dispenso mais entrevistas de Costa e de Temido. Dispenso
mais mentiras escabrosas e “narrativas” que não passam de aspirinas para a
incompetência. E dispensava que um Presidente da República recém-legitimado
embarcasse nisso.
João Miguel Tavares
30 de Janeiro de
2021, 0:00
https://www.publico.pt/2021/01/30/opiniao/opiniao/marcelo-razao-entao-erros-catastroficos-1948495
Já desejei
algumas vezes que Marcelo estivesse enganado, mas nunca tanto como nesta
quinta-feira. O seu comunicado ao país não foi apenas um susto – foi um filme
de terror, e não sei se toda a gente teve consciência disso. Quando o
Presidente da República colocou datas em cima do seu retrato trágico do estado
em que se encontra o país, há que rezar aos santinhos para que ele esteja a ser
pessimista (neste momento, parece que rezar aos santinhos é tudo o que nos
resta), ou a queda de Portugal num buraco muito fundo, tanto em termos sociais
como económicos, é absolutamente inevitável.
Reparem nesta
frase: “O que fizermos todos, poderes públicos solidários e portugueses, até
Março, até Março, inclusive, determinará o que vai ser a Primavera, o Verão e
quem sabe se o Outono.” De uma só penada, Marcelo avisou-nos de que a pandemia
pode não estar controlada até perto do final de 2021, e que toda a indústria
turística que sonhava com o início da normalização no próximo Verão pode
começar a virar as suas expectativas para o Verão de 2022; e avisou-nos ainda,
com a insistência no “Março inclusive”, duas vezes repetido, que o mais
provável é ficarmos todos enfiados em casa durante Janeiro, Fevereiro e Março,
com o consequente aumento das desigualdades, os simulacros de aulas online, as
famílias à beira de um ataque de nervos, a produtividade dos pais e do país a
cair a pique, as moratórias a subirem em flecha, os pequenos negócios a ficarem
de novo debaixo de água quando estavam a recuperar aos poucos a respiração, e o
Governo a rezar aos santinhos (neste momento, parece que rezar aos santinhos é
tudo o que lhe resta) para que os mercados internacionais continuem bêbados de
liquidez e a carburar a juros negativos.
Mas o que é mais
espantoso é que mesmo num tempo de condições financeiras únicas, com bazucas de
milhares de milhões e juros a mínimos históricos, nem assim Portugal deixa de
estar garroteado pela dívida, nem assim o peso das moratórias se afigura como
uma bomba ao retardador, nem assim o frágil sector bancário consegue apoiar o
tecido económico do país, e nem assim a dimensão desmesurada do Estado nos
serve de sustento, porque, com a ambição de estar em todo o lado, ele acaba por
não conseguir estar onde realmente é preciso.
Isto só pode
provocar um profundo arrepio na espinha de quem se preocupa com o país. Todas
estas limitações têm um reflexo muito concreto na acção de um Governo que
quanto mais incompetente é, mais entrevistas dá na televisão. Sou só eu que
começo a ter dificuldade em ver a cara de Marta Temido nos telejornais? É só a
mim que me apetece dizer-lhe: “Senhora ministra, em vez de estar aqui a perder
o seu tempo a fazer má propaganda, não seria melhor ir descansar, para amanhã
estar mais fresca e decidir melhor?”
Dispenso mais
entrevistas de Costa e de Temido. Dispenso mais mentiras escabrosas e ministros
a fingir que não disseram o que toda a gente ouviu que disseram. Dispenso mais
“narrativas”, que não passam de aspirinas para a incompetência. E dispensava
que um Presidente da República recém-legitimado embarcasse nisso. Marcelo, mais
uma vez, não resistiu a tentações desculpabilizadoras, e sugeriu que, “desta
vez, a vaga começou a Ocidente e Portugal é dos primeiros e não dos últimos a
sofrer a pandemia”. Tal tese está por provar. Já a tese dos erros, das mentiras
e da descoordenação do Governo está mais do que provada, para mal dos nossos
pecados.
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