BLOCO DE ESQUERDA
“Ainda não viram nada!” Mariana toma rédeas do BE contra
o “pântano” da maioria absoluta
Eleita com mais de 80% dos votos, no encerramento da
convenção definiu o futuro do partido: fazer oposição ao PS, impedir o
crescimento das direitas, recuperar eleitoralmente, mobilizar a esquerda.
Ana Bacelar
Begonha e Matilde Fieschi (fotografias) 28 de Maio de 2023, 19:09
Mariana Mortágua
foi eleita coordenadora do Bloco de Esquerda (BE) com a esmagadora maioria dos
votos — 439 face aos 78 conseguidos pela moção opositora. Depois de mais de uma
década com Catarina Martins ao leme, o partido entra agora num novo ciclo que
Mortágua promete ser de oposição e recuperação, embora mantendo a continuidade
face à anterior liderança.
A moção
encabeçada por Mortágua, que determina a estratégia dos próximos dois anos do
partido, conseguiu aumentar a sua representação nos órgãos nacionais face à
última convenção, tendo agora mais peso na mesa nacional (67 mandatos face a 13
dos opositores) e na comissão política (17 membros em comparação com quatro da
outra moção). Os rostos são praticamente os mesmos e Catarina Martins mantém-se
na direcção.
No primeiro
discurso como líder, em que arrancou das cadeiras os militantes que encheram o
Pavilhão do Casal Vistoso, foi sobretudo para fora que Mortágua falou, deixando
promessas de uma “esquerda frontal” aos adversários – inclusive àqueles que
estavam presentes na sala. Figuras do PS como o secretário-geral adjunto do PS,
João Torres, e do Governo, como o secretário de Estado adjunto do
primeiro-ministro, António Mendonça Mendes, foram convidados, mas isso não
inibiu Mortágua de disparar contra os socialistas.
A bloquista
garantiu que “ainda não viram nada”, porque este “é só o começo do Bloco de
Esquerda”, um partido que “não se cala perante o abuso”, nem “se encolhe
perante a intimidação”, e que vai impedir tanto “a rampa deslizante para a
direita e para a extrema-direita”, como que a maioria absoluta “continue este
caminho de degradação”.
Mais do que
contra a “política do ódio” do espectro oposto ao BE, foi contra a “política do
medo” e o “pântano” da maioria absoluta do PS que Mortágua se atirou, porque,
alertou, “o desgaste da vida democrática não é só provocado pelos arruaceiros
que gritam contra ela”. Para a nova líder do BE, são os socialistas os
“causadores da fragilização da democracia” com o seu “poder absoluto”, que
acusa de ser “um tormento de degradação e instabilidade” ou “uma causa de
embaraço nacional”.
As eleições e a
mobilização
Face a essa
escolha “entre o mau [o PS] e o pior [a direita]”, a bloquista defendeu o seu
lema pela “vida boa”, garantindo que não se trata de um “acesso romântico”, mas
de “todo um programa”. Pelos “serviços públicos”, “uma casa, salário decente,
cuidados”, “uma economia que caiba nos limites naturais do nosso planeta” ou os
mesmos direitos para os “imigrantes”, declarou.
Mortágua não
ignorou também a necessidade de o partido recuperar eleitoralmente, depois do
último ciclo de derrotas, a mais pesada das quais nas legislativas de 2022,
tendo definido como objectivos eleitorais voltar a ganhar representação na
Madeira e “ultrapassar o Chega e a IL” nas europeias.
Nem ignorou a
necessidade de o partido reforçar a sua mobilização. Prometeu “empenho” à “luta
popular”, “mais força” aos “movimentos sociais” e “unidade à esquerda”.
Tal como inúmeros
militantes, dos apoiantes aos opositores, a agora coordenadora reconheceu os 11
anos de liderança de Catarina Martins, mas também agradeceu à irmã, Joana
Mortágua, que a convenceu a entrar no partido, e ao pai, Camilo Mortágua, de
quem diz sentir “orgulho” pela luta antifascismo que travou.
Foi um discurso
de síntese das intervenções que, ao longo dos dois dias de convenção,
expressaram a quase uma só voz os desafios do BE: combater a maioria absoluta,
travar a direita, recuperar nas eleições e mobilizar, dentro e fora do partido.
Ao contrário de convenções passadas, como a de 2014 em que Catarina Martins e
Pedro Filipe Soares disputaram a liderança, foi a imagem de um Bloco coeso, com
uma oposição minoritária, que saiu do encontro.
Houve, ainda assim,
espaço para o debate se polarizar, sobretudo, no que toca à guerra da Ucrânia.
Várias vozes da moção E, como Mário Tomé, se insurgiram em relação à
participação da deputada Isabel Pires numa delegação da Assembleia da República
a Kiev e a um convite feito ao Presidente do Parlamento ucraniano, que acusam
de ser “neonazi”, para vir a Portugal. Criticaram a aproximação da posição do
BE sobre a guerra à do Governo e a suavização do discurso no que toca à NATO.
Os dirigentes,
como José Manuel Pureza, defenderam que a posição do BE é de “solidariedade com
os povos e a autodeterminação”, independentemente dos seus líderes, e de
“frontal oposição à NATO”, garantindo que rejeitam todos os imperialismos, sem
distinções entre o dos EUA ou da Rússia.
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