ELEIÇÕES BRASIL
2022
Sem reconhecer derrota, Bolsonaro dá aval à normalização
política
Presidente brasileiro não pôs em causa os resultados, mas
considerou “injusto” o processo eleitoral. Não pediu o fim dos protestos, mas
condenou bloqueios. É pouco, mas suficiente para uma transição.
João Ruela
Ribeiro
1 de Novembro de
2022, 19:39 actualizado a 1 de Novembro de 2022, 20:46
https://www.publico.pt/2022/11/01/mundo/noticia/directo-bolsonaro-fala-pais-2026087
Ao fim de quase
48 horas, o Presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, quebrou finalmente o
silêncio e comprometeu-se a respeitar a Constituição, embora reforçando as
críticas ao processo eleitoral. Numa declaração muito curta no Palácio da
Alvorada, em Brasília, o chefe de Estado não reconheceu abertamente a derrota
nem saudou o seu adversário, Lula da Silva.
Já se sabia que
Bolsonaro não iria contestar abertamente o resultado das eleições de domingo,
mas os moldes em que o faria eram desconhecidos até ao momento em que falou.
Pressionado pelas principais instituições democráticas, tribunais, partidos e
até alguns aliados a fazer uma declaração que apaziguasse os ânimos dos seus seguidores,
Bolsonaro não desejava desmotivar por completo os seus apoiantes.
Fê-la dando a
garantia de que vai cumprir a Constituição ao longo do período de transição,
mas não deixou de reconhecer e simpatizar com o “sentimento de injustiça” que
os seus apoiantes dizem sentir em relação à forma como decorreram as eleições.
A mão de
Bolsonaro foi forçada depois de, logo após a proclamação da vitória de Lula,
vários actores políticos relevantes, incluindo alguns dos mais próximos do
ainda Presidente, terem reconhecido o resultado e mostrado intenção de
prosseguir a vida política. Isolado, restava a Bolsonaro confiar num levante
popular que, de acordo com a imprensa brasileira, pouco teve de espontâneo,
para causar um nível de instabilidade que abrisse margem para algum tipo de
estado de excepção.
“Enquanto
Presidente da República e cidadão, continuarei cumprindo os mandamentos da
nossa Constituição”, declarou Bolsonaro, naquela que é a frase crucial de uma
declaração de cerca de dois minutos e sem direito a perguntas dos jornalistas.
Assim que terminou de falar, o ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, declarou
que será dado início ao processo de transição entre o governo cessante e o
sucessor, que toma posse a 1 de Janeiro de 2023. Há normalidade democrática no
horizonte do Brasil.
Entre a
confirmação da sua derrota e a declaração desta terça-feira, o Brasil assistiu
a cenas caóticas depois de centenas de estradas terem sido ocupadas por
apoiantes de Bolsonaro que se recusam a reconhecer os resultados eleitorais.
Bolsonaro definiu os protestos como “movimentos populares” que são “fruto da
indignação e sentimento de injustiça” com o processo eleitoral.
Apesar de indicar
algum apoio às “manifestações pacíficas”, o Presidente brasileiro condenou
certos métodos utilizados, incluindo a ocupação de estradas.
Durante o dia,
Bolsonaro terá pedido aos juízes do Supremo Tribunal Federal (STF) uma reunião,
de acordo com a imprensa brasileira, mas o convite foi recusado. Antes, o chefe
de Estado deveria pronunciar-se publicamente sobre o resultado das eleições,
responderam os juízes.
Estradas
paralisadas
Durante meses,
Bolsonaro alimentou a dúvida quanto à possibilidade de vir a rejeitar uma
eventual derrota contra Lula da Silva. O Presidente vinha a veicular teorias
sem qualquer confirmação sobre a vulnerabilidade do sistema de voto electrónico
a fraudes. A poucos dias das eleições, a campanha do Presidente apresentou uma
queixa de que a sua propaganda eleitoral não estaria a ter o mesmo espaço que a
do seu adversário em rádios no Nordeste. As autoridades eleitorais não deram
razão às alegações de Bolsonaro.
O prolongamento
inédito da ausência de uma reacção pública do candidato derrotado às eleições
presidenciais cimentou a ideia de que poderia haver uma rejeição dos
resultados. Movidos por essa percepção, milhares de camionistas apoiantes de
Bolsonaro começaram a bloquear auto-estradas em vários pontos do país logo no
domingo à noite. Ao início desta terça-feira, registavam-se centenas de
bloqueios em 23 estados e no Distrito Federal, com especial incidência nas
regiões do Sul e do Centro-Oeste, onde o bolsonarismo é mais forte.
Os bloqueios
rodoviários tiveram impacto no transporte de vários bens de primeira
necessidade, afectando a distribuição de combustível e o fornecimento de
supermercados e farmácias. No Aeroporto Internacional de São Paulo, em
Guarulhos, foram cancelados pelo menos 25 voos depois de algumas das vias que
ligam a cidade ao aeroporto terem ficado várias horas bloqueadas.
O recrudescimento
da situação levou o Supremo Tribunal Federal a dar ordens à Polícia Rodoviária
Federal (PRF) para que avançasse para a desobstrução de todas as estradas
ocupadas. Vários estados recorreram à Polícia Militar para repor o tráfego
regular e em São Paulo foi mobilizada a polícia de choque. Ao longo do dia, as
autoridades policiais conseguiram desmantelar centenas de bloqueios, mas muitos
ainda permaneciam ao início da noite.
Segundo a
imprensa brasileira, a paralisação rodoviária terá sido organizada através de
grupos de Whatsapp pró-Bolsonaro ao longo das últimas semanas como forma de
pressão sobre as instituições democráticas em caso de uma derrota do actual
Presidente.
tp.ocilbup@aleur.oaoj
BRAZIL ELECTIONS
2022
Without
recognizing defeat, Bolsonaro endorses political normalization
Brazilian president did not question the results, but
considered "unfair" the electoral process. He did not call for an end
to the protests, but condemned blockades. It's little, but enough for a
transition.
Joao Ruela
1 November 2022,
19:39 updated on 1 November 2022, 20:46
https://www.publico.pt/2022/11/01/mundo/noticia/directo-bolsonaro-fala-pais-2026087
After almost 48
hours, The Brazilian President, Jair Bolsonaro, finally broke his silence and
pledged to respect the Constitution, while reinforcing criticism of the
electoral process. In a very short statement at the Alvorada Palace in
Brasilia, the head of state did not openly acknowledge the defeat or salute his
opponent, Lula da Silva.
It was already
known that Bolsonaro would not openly contest the result of Sunday's elections,
but the molds in which he would do so were unknown until the moment he spoke.
Pressured by the main democratic institutions, courts, parties and even some
allies to make a statement that would calm the spirits of his followers,
Bolsonaro did not wish to completely discourage his supporters.
He did so by
ensuring that he will comply with the Constitution throughout the transition
period, but he did not fail to acknowledge and sympathize with the "sense
of injustice" that his supporters say he feels about the way the elections
took place.
Bolsonaro's hand
was forced after, shortly after lula's victory proclamation, several relevant
political actors, including some of the closest to the president, recognized
the result and showed an intention to pursue political life. Isolated, it was
left to Bolsonaro to rely on a popular uprising that, according to the
Brazilian press, had little spontaneous, to cause a level of instability that
would open scope for some kind of state of exception.
"As
President of the Republic and citizen, I will continue to comply with the
commandments of our Constitution," bolsonaro said, in what is the crucial
phrase of a statement of about two minutes and without the right to questions
from journalists. As soon as he has finished speaking, the Minister of the
Civil House, Ciro Nogueira, declared that the transition process between the
outgoing government and the successor, who takes office on January 1, 2023,
will begin. There is democratic normality on the horizon of Brazil.
Between the
confirmation of its defeat and Tuesday's statement, Brazil witnessed chaotic
scenes after hundreds of roads were occupied by Bolsonaro supporters who
refused to acknowledge the election results. Bolsonaro defined the protests as
"popular movements" that are "the fruit of indignation and a
sense of injustice" with the electoral process.
Despite
indicating some support for "peaceful demonstrations", the Brazilian
President condemned certain methods used, including the occupation of roads.
During the day,
Bolsonaro will have asked the judges of the Supreme Court (STF) a meeting,
according to the Brazilian press, but the invitation was refused. Rather, the
head of state should rule publicly on the outcome of the elections, the judges
said.
Roads paralyzed
For months,
Bolsonaro fueled doubts about the possibility of rejecting a possible defeat
against Lula da Silva. The President was running theories without any
confirmation of the vulnerability of the electronic voting system to fraud. A
few days before the elections, the President's campaign filed a complaint that
his election propaganda would not be having the same space as his opponent's on
radio in the Northeast. The electoral authorities did not give reason to
bolsonaro's allegations.
The unprecedented
prolongation of the absence of a public reaction from the defeated presidential
candidate cemented the idea that there could be a rejection of the results.
Driven by this perception, thousands of truckers supporters of Bolsonaro began
blocking highways in various parts of the country as early as Sunday night. At
the beginning of Tuesday, there were hundreds of blockades in 23 states and the
Federal District, with special focus on the Southern and Midwest regions, where
bolsonarism is stronger.
Road blocks had
an impact on the transport of various essential goods, affecting the
distribution of fuel and the supply of supermarkets and pharmacies. At
Guarulhos International Airport, at least 25 flights were cancelled after some
of the roads connecting the city to the airport were blocked for several hours.
The resurgence of
the situation led the Supreme Court to give orders to the Federal Highway
Police (PRF) to advance to the clearance of all occupied roads. Several states
have turned to the Military Police to resume regular traffic and in São Paulo
the riot police were mobilized. Throughout the day, law enforcement authorities
managed to dismantle hundreds of roadblocks, but many still remained in the
early evening.
According to the
Brazilian press, the road stoppage will have been organized through
pro-Bolsonaro Whatsapp groups over the past few weeks as a form of pressure on
democratic institutions in the event of a defeat of the current President.
tp.ocilbup@aleur.oaoj
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