sábado, 27 de novembro de 2021

Rio ou Rangel? Uma mistura dos dois (que não existe)

 



OPINIÃO

Rio ou Rangel? Uma mistura dos dois (que não existe)

 

As directas deste sábado no PSD são imprevisíveis. Com alta probabilidade nenhum vencedor terá o perfil certo para oferecer ao país o rumo de que ele desesperadamente necessita.

 

João Miguel Tavares

27 de Novembro de 2021, 0:22

https://www.publico.pt/2021/11/27/opiniao/opiniao/rio-rangel-mistura-dois-nao-existe-1986589

 

A diferença essencial entre Rui Rio e Paulo Rangel é esta: as ideias de Rio não são grande coisa mas ele parece acreditar muito nelas; as ideias de Rangel são bastante melhores mas ele parece não acreditar assim tanto. Rio aparece aos militantes como um produto genuíno; Rangel não consegue largar o ar de produto fabricado. O candidato perfeito para o PSD seria um que tivesse as ideias de Paulo Rangel e a convicção de Rui Rio, só que esse candidato não existe. Isto significa que as eleições directas deste sábado são imprevisíveis, e que com alta probabilidade nenhum dos vencedores terá o perfil certo para oferecer ao país o rumo de que ele desesperadamente necessita.

 

 

 

Aquilo que estou a expressar com palavras é o que muitos militantes do PSD têm expressado com o seu silêncio. Rangel surgiu como uma grande esperança. Teve um primeiro discurso de apresentação impecável, e logo depois Rio foi sendo abandonado por gente destacada do PSD. Morais Sarmento foi à televisão partilhar com a pátria a sua decisão de não apoiar ninguém nestas directas, o que, tendo em conta que era um apoiante de relevo de Rui Rio, significava na prática um apoio a Paulo Rangel – só que não o disse. Manuela Ferreira Leite ou Francisco Pinto Balsemão, que apoiou duas vezes Rui Rio, também anunciaram a sua neutralidade nestas eleições, parecendo estar agora mais próximos de Paulo Rangel – só que não o disseram.

 

Passos Coelho apareceu a denunciar páginas falsas nas redes sociais que estão a usar o seu nome para apelar ao voto em Rui Rio, e num evento público afirmou “julgar” já ter escolhido o candidato – mas se o candidato era Rangel, o seu nome não foi pronunciado. Cavaco Silva, que escreveu um artigo violentíssimo em Outubro – Empobrecimento e silenciamento – acerca do Governo e do país, no qual, pelo caminho, também arrasava a oposição, foi questionado sobre o seu posicionamento na corrida à liderança do PSD. Respondeu: “Já escrevi sobre o assunto e não quero repetir.” Se era um apoio a Paulo Rangel, o seu nome foi silenciado.

 

Na quarta-feira, Carlos Moedas foi à Rádio Observador dizer que já sabia em quem ia votar nas eleições do PSD. O nome do eleito? Não disse. Logo de seguida, convidou Paulo Rangel para almoçar e fez-se fotografar à mesa do restaurante. Quando questionado acerca do significado daquele almoço, Moedas declarou: “Foi um momento de amizade, nada mais do que isso. Eu, como presidente da câmara, não estou a tomar nenhuma posição.” Os jornalistas foram fazer a mesma pergunta a Paulo Rangel. Foi uma declaração de apoio? Este respondeu: “O almoço não foi feito a meu pedido, como sabem. Deixo a interpretação para quem a quiser fazer. Os senhores tirarão as conclusões.”

 

Permitam-me, então, tirar as minhas conclusões. Paulo Rangel lançou-se na corrida à liderança do PSD dando uma entrevista corajosa a Daniel Oliveira. Depois, teve um óptimo discurso de apresentação e chamou pessoas competentes – Miguel Poiares Maduro, Fernando Alexandre – para coordenarem o programa eleitoral do PSD. Mas, durante a campanha interna, enquanto Rio se desdobrava em entrevistas claras e frontais, Rangel optava por um discurso tíbio, pelo estilo “há aqueles que dizem que”, e por esquemas ridículos como o almocinho com Moedas. Paulo Rangel ainda não deve ter percebido quão fartos os portugueses estão de politiquices e de espertalhões. Vai chegar para ganhar o PSD? Talvez. Vai chegar para ganhar o país? Definitivamente, não.

 

O autor é colunista do PÚBLICO

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